Cristina Fontenele – Adital
Pescadores e pescadoras de 16 estados do Brasil realizaram um “Abraço pela Vida do Rio Doce”, em denúncia aos impactos do desastre ambiental provocado pelo rompimento de duas barragens da mineradora Samarco – empresa das transnacionais Vale e BHP Billiton –, em Mariana [Estado de Minas Gerais], no último dia 05 de novembro. Cerca de 1.500 pessoas se concentraram recentemente na Praça 22 de Agosto, em Linhares (Estado do Espírito Santo) e seguiram para a Ponte Joaquim Calmon, fechando os dois sentidos de passagem pela BR-101. Os pescadores reclamam do descaso das autoridades e da empresa Samarco com os danos gerados à atividade pesqueira na região. A lama – possivelmente tóxica – levada pelo rio Doce já chegou ao litoral do Espírito Santo, prejudicando a subsistência dos pescadores da região.
“Reivindicamos não só o trabalho, o socioeconômico, estamos preocupados também com o meio ambiente, e solidários com as vítimas perdidas na tragédia. Não podemos nos calar, precisamos mostrar o que aconteceu”, afirma em entrevista à Adital o presidente da Associação dos Pescadores do Espírito Santo, Manoel Bueno, conhecido como “Nego da Pesca”.
O líder, que também é coordenador nacional do Movimento dos Pescadores e Pescadoras do Brasil (MPP), denuncia que a situação está crítica e a tendência é ficar ainda pior, pois a tragédia aconteceu exatamente na época da reprodução de peixes, que vão ao rio [Doce] para desovar, a exemplo do robalo e da tainha. Nego da Pesca destaca que os pescadores foram fortemente prejudicados pela tragédia, não entendida como um desastre natural, mas um “crime premeditado”. “Já tinha sido alertado e a empresa não fez nada para evitar que acontecesse, nem fizeram nada para conter”.
Ele cobra do governo informações e a rápida divulgação da análise técnica das águas. “Já faz um mês e três dias, é impossível não ter essa análise!”. Relata que além dos peixes mortes, cujos últimos números estimam 11 toneladas, agora estão aparecendo também pássaros mortos, que provavelmente comeram os peixes contaminados. Existe ainda a preocupação com os danos futuros pelo consumo da água infectada. “Daqui a uns anos as pessoas podem morrer, mulheres grávidas darem à luz nenéns deformados e não sabermos o porquê.”.
Sem poder pescar, nem no rio e nem no mar, os pescadores reivindicam o apoio do governo. Pedem uma ajuda de custo de um salário mínino, mais 20% para cada dependente, além de uma cesta básica, no valor de R$ 385,00.
Nego da Pesca denuncia também uma suposta ação de “maquiagem” da mineradora, que estaria coagindo um grupo de pescadores da região. Segundo ele, em Regência, onde o rio deságua no mar, a empresa teria contratado cerca de 60 pescadores, ao valor de R$ 150,00 por dia, para colocarem boias de contenção no local. Esses pescadores seriam orientados a negarem a morte de peixes e proibidos de participarem da audiência pública com as autoridades, caso contrário seriam demitidos.
Entre as ações de mobilização, Nego da Pesca informa que estava prevista para esta quinta-feira, 10 de dezembro, uma audiência com o Ministério do Trabalho, em Colatina (Espírito Santo), com a participação da Federação das Associações dos Pescadores do Estado e algumas colônias de pescadores. Também no sábado, 12, haverá outro ato simbólico, coordenado pela Prefeitura de Baixo Guandu, município que fica na divisa do Espírito Santo com Minas Gerais.
Laudo técnico
De acordo com informações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a onda de rejeitos da Samarco já atingiu 663 quilômetros do rio Doce e seus afluentes, com a destruição de 1.469 hectares de terras. Incluindo Áreas de Preservação Permanente (APP). No Distrito de Bento Rodrigues, 207 das 251 edificações (82%) ficaram soterradas pela lama.
A onda de lama chegou ao oceano no último dia 21 de novembro, no Município de Linhares, Espírito Santo. A destruição de APPs ocorreu no trecho de 77 quilômetros de cursos d’água da barragem de Fundão até o rio do Carmo, em São Sebastião do Soberbo (Minas Gerais).
Segundo o laudo técnico preliminar do Ibama, apresentado no último dia 1º de dezembro, “são indiscutíveis” as consequências ambientais e sociais “graves e onerosas”, em escala regional, devido ao desastre. Além dos impactos ao estuário do rio Doce e à sua região costeira. De acordo com o documento, os impactos no ambiente marinho ainda estão em curso.
O laudo teve como objetivo subsidiar a proposição de Ação Civil Pública (ACP) de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente contra a empresa Samarco Mineração.
–
Foto: “Abraço pela Vida do Rio Doce” denuncia o descaso com os pescadores afetados pela tragédia ambiental da mineradora Samarco