“Aldo nunca fora um relator honesto e equilibrado. Desde o início, tanto no trabalho legislativo quanto na vocalização, convertera-se na passionária dos ruralistas”
Alfredo Sirkis*
O inacreditável: depois de quase 16 horas de discussão, num misto de psicodrama e comédia bufa, a votação do Código Florestal, que parecia assunto liquidado para o ruralistas, acabou adiada. Isso se deveu fundamentalmente à mobilização dos verdes, das ONGs, do PSOL e de grande parte do PT mas também e paradoxalmente à impressionante sucessão de tiros no pé do relator comuno-ruralista Aldo Rebelo. Toda a discussão da matéria se dera sem que estivesse sequer disponível o seu relatório-substitutivo sobre o qual deveríamos votar. Quando esse finalmente apareceu, foi em duas versões: a divulgada como “consenso de Aldo com o governo” e a que finalmente veio a plenário na hora de votar, contendo, novamente, pegadinhas aldianas. Por exemplo, num dispositivo onde antes se lia “recuperar”, passou a figurar “regularizar”. E por aí vai…
A intervenção inicial do relator em plenário já foi de uma total arrogância. Aldo nunca fora um relator honesto e equilibrado. Desde o início, tanto no trabalho legislativo quanto na vocalização, convertera-se na passionária dos ruralistas criando um discurso político de desqualificação dos ambientalistas como inimigos dos agricultores e agentes de forças estrangeiras, discurso idêntico ao da extrema-direita, lembrando muito aquele do “Brasil-ame-ou-deixe-o” na ditadura militar. Ontem, a poucos passos da vitória, quando lhe caberia ser elegante e conciliador, redobrou sua arrogância, prepotência e truculência. Entre outras sandices, acusou-nos de estar a serviço da agricultura francesa! Os créditos de carbono, grande conquista da diplomacia brasileira na Conferência de Kioto, em 1997, viraram instrumentos de interesses estrangeiros!
Ao ser flagrado pelo próprio líder do PT, Paulo Teixeira, na pegadinha, Aldo ficou totalmente descontrolado e passou a atacar a ex-senadora Marina Silva que, naquele momento, visitava nosso plenário. Primeiro, mentiu ao dizer que ela o acusara no twitter de “fraudar o processo”. Ela simplesmente registrou a observação do líder do PT como prova de mais uma de suas pegadinhas. Depois, num completo descontrole, passou a atacar o marido de Marina, Fábio Vaz, do PT, assessor do governador petista do Acre (com numerosos amigos no PCdoB!), com uma calúnia baixa que já havia circulado durante a campanha presidencial nos esquemas de propaganda negativa na internet, mas que jamais nenhum órgão de imprensa minimamente sério reproduzira. Foram, evidentemente, investigadas de forma ávida pela grande mídia, que concluiu pela sua completa falta de fundamento. E eis que Aldo, num ato de descontrole, deselegância e desatino, a serviço de seus novos aliados ruralistas, resolve retomá-la para hostilizar Marina.
Mais: sua tropa de choque comandada por um deputado comunista gaúcho tentou agredir fisicamente a mim e ao ex-deputado Edson Duarte no plenário quando chamei Aldo de mentiroso. Que é exatamente como ele se mostrou naquela e em várias ocasiões anteriores, quando extrapolou a discussão do Código Florestal para, à boa maneira stalinista, difamar aqueles que têm um pensamento diferente do seu, prática comum a alguns de seus aliados ruralistas, como Moreira Mendes, que nos acusou de “contrariar os interesses do Brasil”. Respondi-lhe que apenas contrariávamos seus interesses de fazendeiro, segundo a imprensa, autuado por agressão ambiental, em Rondônia, e cuja participação naquela votação, portanto, poderia considerar-se, eventualmente, causa própria, por tornar-se beneficiário daquela anistia a desmatadores contida no primeiro relatório de Aldo. Isso, regimentalmente, deveria impedi-lo a ele, e a mais 14 deputados e três senadores, de votar.
Como vai ficar o Código Florestal? Na hora da verdade ficou claro: quando o governo decidiu mudar seu voto no pedido de adiamento do PSOL, a poderosa bancada ruralista mostrou-se, afinal, um tigre de papel. Não conseguiram quorum para derrubar a nossa obstrução. Saíram frustrados. Haverá outros rounds. Mas uma coisa é certa: o deputado Aldo Rebelo perdeu qualquer condição moral para continuar relatando a nova lei do Código Florestal. O governo precisa trazer para si a condução do processo e colocar um relator de plenário isento e equilibrado.
PS: Em relação ao conteúdo, o ponto central dos ambientalistas agora é a preservação de um mecanismo expedito de suspensão do crédito oficial a quem cometa desmatamento ilegal. Isso foi o mecanismo mais importante para os avanços contra o desmatamento nos últimos anos. O disposto no novo relatório, na prática, inviabiliza esse mecanismo criando vários mecanismos de drible.
*Deputado federal pelo Partido Verde (RJ), do qual é um dos fundadores, tem 60 anos, e foi secretário de Urbanismo e de Meio Ambiente da cidade do Rio de Janeiro e vereador. Jornalista e escritor, é autor de oito livros, dentre os quais Os carbonários (Premio Jabuti de 1981) e o recente Ecologia urbana de poder local. Foi um dos líderes do movimento estudantil secundarista, em 1968, e viveu no exílio durante oito anos.
http://congressoemfoco.uol.com.br. Enviada por José Carlos.