Anotações de Luiz Zarref, do MST/Via Campesina, sobre a última proposta apresentada por Aldo Rebelo

O Deputado Aldo Rebelo foi obrigado a recuar em quase todos os pontos que propôs inicialmente. Mantém apenas o discurso ideológico, para sustentar que os ruralistas obterão uma vitória. Mas na realidade o governo o colocou em uma situação bastante delicada, pois os ruralistas estão muito insatisfeitos com o texto que será levado para votação.

O governo demorou muito a entrar no tema, o que impediu um debate amplo com a sociedade. Só tem alguns avanços no texto defendido no governo porque os movimentos sociais anteciparam as negociações, já que o tema aparece na pautas de lutas desde início de 2009. Mas muitas coisas ficarão de fora, como a criação de um programa consistente de recuperação ambiental, pagamento de serviços ambientais e de fomento à produção sustentável agroflorestal.

Nesse último período apareceu o lobby das papeleiras, que conseguiram colocar algumas coisas no texto defendido pelo governo;

Os principais pontos agora são:

–    Retirada da Reserva Legal nas propriedades até 04 módulos fiscais, o que vai prejudicar os camponeses a longo prazo, pois terão suas propriedades comprometidas pela erosão, escassez de água, perda da fertilidade etc, mas beneficia chacareiros que não usam as áreas para produção;

–    Todas as áreas médias e grandes terão como “bônus” quatro módulos fiscais sem necessidade de Reserva Legal. A área para cálculo da RL será contada apenas após o quarto módulo;

–    Liberação para plantio de espécies lenhosas (como eucalipto e pinus) nas encostas, topos de morros e bordas de chapadas;

–    As reservas legais poderão ter até 50% de suas áreas com espécies exóticas, ou seja, aqui mais uma vez aparece a pauta das papeleiras e das empresas de biodiesel vindo da palma africana;

–    Uma série de benefícios foram criados para os latifundiários desmatadores. Para os que simplesmente fizerem o cadastro ambiental, o que não quer dizer que a recuperação seja realizada. Poderão receber crédito mais facilitado, com juros menores, terão prioridade em programas governamentais e poderão deduzir do imposto de renda os investimentos em recuperação. Juntando todas as maldades, eles poderão plantar eucalipto, receber crédito subsidiado, receber pagamentos por serviços ambientais e ainda deduzir do imposto de renda!

–    Por último, a RL poderá ser recomposta em qualquer parte do bioma. Juntando aos elementos anteriores, é possível se imaginar a engenharia que está por trás disso! Além dos impactos já previstos, como expulsão de agricultores, que venderão suas terras baratas para RLs de latifúndios, e os latifúndios improdutivos, que poderão ser considerados RLs em recomposição.

–    É bem provável que o Aldo tenha articulado os ruralistas para fazerem emendas no texto, em plenário. Por isso a mobilização é fundamental nessa reta final, bem como a posição e articulação do governo.
RESUMO:

1.    AGRICULTURA FAMILIAR

AVANÇO:  A inclusão do conceito de agricultura familiar é um avanço

PROBLEMA:  a manutenção do conceito de pequena propriedade é um atraso.

Do jeito que está na nova redação, não há diferença de quem produz sob um modelo familiar daquele que só usa sua propriedade para lazer de fim-de-semana, ou mesmo de um latifúndio divido em várias matrículas, isentando-se de restrições da lei.

2.    ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APPS)

AVANÇO: é um avanço que mantenhamos os mesmos moldes estabelecidos no atual código

PROBLEMA: ainda precisamos alterar as benesses que a proposta dá ao agronegócio, como a possibilidade de recompor somente metade das APPs em beira de rios com até 10 metros de largura  e o cultivo de lenhosas, como eucalipto nas APPs de topografia.
3.    RESERVA LEGAL (Reserva Ambiental)

PROBLEMA 1 :  Não podemos liberar a recomposição para culturas lenhosas exóticas. Isso é o mesmo que qualificar o plantio comercial de eucalipto como reserva ambiental.

As conseqüências da monocultura de eucalipto, como já sabemos, são danosas ao meio ambiente: secam os rios, empobrece o solo, além de ser responsável, muitas vezes, pela remoção de comunidades indígenas, quilombolas e de trabalhadores rurais.

PROBLEMA 2: A possibilidade de recomposição de Reserva Legal em qualquer parte do bioma é outro absurdo que precisamos combater veementemente.

Ora, com esta redação, se um proprietário rural tem propriedade devastada em São Paulo, na Mata Atlântica, poderá comprar terras do Rio Grande do Sul até o Ceará para recompor Reserva Legal.

Isso pode promover uma escalada de compras das terras dos camponeses para servirem de reserva legal de fazendas.

Sem falar dos latifúndios abandonados que deveriam ser destinados à Reforma Agrária,  e que, com este texto, podem se transformar em reserva legal!

A recomposição de Reserva Legal tem que ser na mesma microbacia hidrográfica.

4.    SUBSÍDIOS E FINANCIAMENTO

PROBLEMA: Não podemos compensar a grande agricultura com financiamento a juros subsidiados, desconto em imposto de renda, dentre outros benefícios.

Isso é o mesmo que lucrar duas vezes: ganha com desmatamento e ganha para cumprir a lei.

Os incentivos econômicos devem ser voltados para o estímulo da pequena agricultura familiar e camponesa, ou seja, para quem produz alimentos e precisa do meio ambiente preservado não só para o seu sustento, mas para a sua vivência.

Comments (3)

  1. como todos vocês são tão desinformados, inclusive o autor do artigo,vocês têm noção das terras virgens e devolutas do território nacional?

    vocês estão a serviço das ongs………..

  2. É absolutamente irreal o que os parlamentares ligados ao agronegócio tóxico estão pleiteando. O texto de Aldo Rebelo, deputado que se diz “comunista” e deveria estar defendendo a reforma agrária – é muito ruim. Mas uma parte significativa da sociedade reagiu a este disparate dos ruralistas e está pressionando fortemente e positivamente. Parabéns aos Movimentos Sociais por esta grande luta, estamos juntos nesta! A UFPR, primeira Universidade Pública do Brasil se posicionou no dia 28/04 contrária as mudanças propostas dor Aldo e precisamos divulgar isto para que outros instituições também se posicionem. Ademais, é bom não esquecer que a Política Nacional por Pagamentos por Serviços Ambientais já foi aprovada pela comissão de meio ambiente do congresso e precisamos ficar de olho nos trãmites internos. Esta sim deverá atender aos agricultores familiares e aos movimentos sociais ligados a terra! Fiquemos atentos. Um grande abraço Liliani.

  3. Nossa mas isso esta fora do que é ensinado na escolas, tem muita coisa absurda nesse texto que me pôs em duvida se isso realmente esta acontecendo, a onde vai parar nosso sistema ambiental, nao preservamos mais somente destruiremos porque o importante é dinheiro. muito complicado isso, a cada dia que passa acredito menos na causa ambiental brasileira, e desmotiva terminar a graduação e lutar por preservação. Muito Obrigado, eu queria muito ter participado dos debates.

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