Respostas do governo às propostas do Simpósio sobre Mudanças Climáticas não atendem às demandas da população

Mais uma vez o discurso ficou na promessa e não em encaminhamentos práticos que amenizem ou tragam soluções para os problemas urgentes e pontuais enfrentados pelo país

Por Cleymenne Cerqueira, Assessoria de Comunicação – Cimi

Após três dias de intensas discussões chegou ao fim o 2º Simpósio Nacional de Mudanças Climáticas e Justiça Social. O encerramento do encontro aconteceu ontem (16), com a realização de um ato público no Centro Cultural de Brasília (CCB). Nesse debate final estiveram presentes ministros do Estado e representantes do governo, entre eles Gilberto Carvalho, ministro da secretaria geral da Presidência da República, Maria do Rosário Nunes, ministra-chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Eduardo Delgado Assad, secretário de Mudanças Climáticas e qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, e dom Pedro Luiz Stringhini, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Caridade, Justiça e Paz, da CNBB.

“A ideia de convidar os representantes do Estado para participar das discussões apresentadas pelo Simpósio teve por objetivo trazê-los para o debate sobre a perspectiva da construção de políticas públicas sobre mudanças climáticas. Além disso, os participantes também participaram da aprovação de uma carta-compromisso, por meio de suas colocações, afirmações e sugestões, em que se estabelecem metas a serem cumpridas e ações concretas para combater o aquecimento global em território nacional”, destacou o sociólogo Ivo Poletto, coordenador do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social (FMCJS), promotor do evento.

O debate foi coordenado pela irmã Delci Franzen, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que ao compor a mesa falou sobre a importância da presença dos representantes do governo em eventos desse porte, que discutem com preocupação os atuais desastres socioambientais que afetam a vida das populações brasileira e mundial. Ela ressalta ainda a participação expressiva de representantes de movimentos sociais e populares, ONG’s, pastorais sociais e organismos de cooperação, entre outros. “Viemos das várias regiões do Brasil, e isso nos deu informações ricas do que acontece nos diferentes biomas. Nos reunimos especialmente porque desejamos agir para enfrentar o que está provocando as mudanças climáticas presentes em todas as regiões”.

Proposições

Preocupados em entender melhor o que se passa com o planeta Terra e com os cada vez maiores desastres socioambientais que afetam a vida e provocam mortes de tantas pessoas, os participantes do Simpósio produziram propostas de alternativas de políticas públicas, que são um esforço de diálogo e de contribuição para a atuação do governo. São elas: fim dos projetos de usinas nucleares no Brasil e revisão das condições de segurança das usinas Angra 1 e 2, bem como as condições de vida em Caitité, Bahia, ameaçadas por contaminação de urânio; mudanças na prioridade política em favor das fontes hidroelétrica e térmica para a produção de energia elétrica, substituindo-a pelo sol e ventos; mudanças na prioridade política em relação á agricultura, incentivando a agricultura familiar em detrimento do agronegócio; criação de setor na Secretaria Especial dos Direitos Humanos que se dedique ao estudo, acompanhamento e encaminhamentos relacionados à situação das populações atingidas por eventos extremos; que o governo assuma a responsabilidade de apresentar uma proposta alternativa à revisão do Código Florestal.

Os representantes do governo tiveram, um a um, a oportunidade de responder às propostas apresentadas, bem como de afirmar a posição do Estado em relação aos problemas decorrentes dos eventos extremos provocados pelas mudanças climáticas. Têm sido recorrentes a ocorrência de enchentes de verão nas mais diversas regiões do país, como a que atinge atualmente os estados do Espírito Santo, Santa Catarina, região serrana do Rio de Janeiro e Paraná, entre outros. Qual o encaminhamento concreto para prevenir esse problema e, de forma emergencial, como atender às necessidades das milhares de famílias atingidas? Secas prolongadas têm atingido a Amazônia e o Rio Grande do Sul, bem como outras regiões do país, podendo transformar essas áreas com rica variedade de espécies em áreas de cerrado. O que fazer para diminuir esse processo acelerado cada vez mais pelo crescente desmatamento na região? Atualmente, o Brasil, que não é o maior produtor por área, é um dos maiores consumidores de agrotóxicos, responsáveis pela contaminação e empobrecimento do solo. Qual a solução para a produção de uma agricultura extensiva voltada para a vida, para o fortalecimento das atividades do pequeno agricultor?

Contraditoriamente á realidade, Eduardo Delgado Saad afirma que as propostas apresentadas estão de acordo com as preocupações e ações do governo. Ele afirma que o atual modelo de produção agrícola é totalmente errado e que a solução talvez fosse a agroecologia, alternativa amplamente discutida e apontada pelos movimentos sociais, mas não implementadas nas bases por meio de incentivos á produção dos pequenos produtores pelo governo. Ele alega ainda, em relação às enchentes de verão, que estas são causadas também pelo mau uso do solo e não somente pelas mudanças climáticas. Verdade seja dita, a política de ocupação, urbanização, saneamento básico, sistema de drenagem e mesmo o modelo de desenvolvimento do Brasil também contribuem intensamente para a ocorrência desses problemas.

Gilberto Carvalho, de uma forma realista, afirma qual o posicionamento do governo diante de toda essa situação. De acordo com ele, é sim necessário viver um novo modelo econômico e de desenvolvimento, que seja ético e sustentável, que acabe com as desigualdades impostas pelo mercado e reconheça o homem como um ser de direitos. No entanto, ele afirma também que não é possível uma mudança radical e urgente. “Seria uma falácia, por exemplo, dizer que acabaremos nesses quatro anos com o latifúndio, porque isso não vai acontecer, pois quebraria a balança comercial do país”, disse. Ele apregoa que não é possível negar direitos e o acesso das populações a bens e serviços, como energia elétrica e produtos eletrônicos, por isso, o governo continuará priorizando a geração de energia, e assim, as demandas não humanas das grandes multinacionais e do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.

Todos os representantes afirmaram que o governo reconhece a necessidade de uma mudança no modo de produção do país, reforçando a agricultura familiar. Para Maria do Rosário Nunes, da SEDH, o grande desafio é pensar como unificar um projeto de economia e desenvolvimento sustentável baseado na utilização de fontes de energia renováveis, a diminuição do desmatamento e dos problemas fundiários. Apontamentos em relação à necessidade de se discutir a Reforma Política e a Reforma Agrária foram feitos, no entanto, nenhuma ação concreta foi encaminhada. Em meio a tantas falas e respostas evasivas, os presentes tiveram momentos de esperança ao ouvir Carvalho afirmar que o governo está totalmente contra a relatoria do deputado federal Aldo Rebelo ao projeto de revisão do Código Florestal Brasileiro. “Nós não vamos permitir que o Código seja aprovado desse jeito”, garantiu.

Geração de energia

Tema polêmico em todo o simpósio e em discussões sobre as principais causas das mudanças climáticas, a geração de energia permeou todas as indagações dirigidas aos representantes do governo. De acordo com Eduardo Delgado Saad, o governo tem incentivado a produção de energia solar e eólica, além da biomassa e da gerada por meio da força das marés. No entanto, o que as populações do país têm observado é a priorização da geração por meio das hidrelétricas e Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), como também da nuclear. Exemplos claros dessa escolha são as usinas de Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira, em Rondônia; hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, Pará; e as duas usinas nucleares previstas para serem construídas no nordeste.

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