Parágrafo final da matéria da Deutsche Welle, abaixo: “E se os incidentes ambientais tivessem acontecido numa unidade na Alemanha? ‘Talvez já teriam abafado o alto-forno e interrompido o funcionamento da siderúrgica há muito tempo’, supõe o promotor, lembrando a consciência ambiental dos alemães(…)”. TP.
Deutsche Welle
O investimento de quase 6 bilhões de euros no complexo siderúrgico no Brasil ainda não tem licença definitiva. Depois de ter registrado incidentes ambientais, a empresa muda o tom e aceita auditoria.
O maior investimento da história da ThyssenKrupp pode também ser a maior fonte de problemas do grupo alemão na atualidade. A siderúrgica construída na baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro, já rendeu à empresa uma multa de 2,8 milhões de reais por crimes ambientais, além de outros milhões terem sido gastos em projetos de compensação e nos processos de indenização movidos por pescadores locais.
E a lista ainda inclui outros itens: a companhia, denunciada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, passa por uma auditoria ambiental e ainda aguarda a emissão da licença definitiva para operar com capacidade total.
Com uma nova diretoria, a empresa tenta minimizar a polêmica gerada em terra estrangeira. Em seu balanço na reunião anual de acionistas, ao fim de seu mandato na presidência, Ekkehard Schulz salientou a importância do projeto brasileiro: “É a base da nossa estratégia de crescimento transatlântico no setor do aço”. Caberá ao novo presidente, Heinrich Hiesinger, realizar a ambiciosa meta da maneira menos problemática possível.
Investimento e falhas
O complexo siderúrgico da ThyssenKrupp CSA, no bairro de Santa Cruz, município do Rio de Janeiro, tem custos estimados em 6 bilhões de euros. As obras começaram em 2005, chegaram a ser embargadas em 2007 e, em junho de 2010, a unidade foi inaugurada “juntamente com o presidente Lula” – como ressaltou Schulz em seu discurso frente aos acionistas na última sexta-feira (21/01) em Bochum.
A planta já registrou duas operações de alto-forno, em julho e dezembro do ano passado e, nas duas ocasiões, houve falhas operacionais, afirma o Ministério Público do Rio de Janeiro. A última, no dia de Natal, obrigou a empresa a verter o ferro-gusa em poços de emergência e ocasionou a emissão de grafite no ar – a liberação das partículas também havia acontecido na primeira operação.
“A partir disso, houve uma grande mudança de postura da empresa, que não admitia nenhuma falha de seu processo tecnológico e no sistema de gestão ambiental. Mas, em decorrência desse evento, a empresa se submeteu às exigências formuladas pelo Inea (Instituto Estadual do Ambiente)”, esclareceu o promotor Marcus Pereira Cavalcante Leal à Deutsche Welle.
O fato levou a uma auditoria ambiental para verificar a eficiência do processo tecnológico. O laudo deve ficar pronto em 60 dias e deve criar condicionantes para que a unidade obtenha a licença definitiva. “E ela não será emitida enquanto não se tiver a certeza absoluta de que os processos de segurança ambiental são efetivos”, complementou Leal.
No banco dos réus
Segundo a denúncia do Ministério Público, a empresa cometeu quatro crimes ambientais: causar poluição em níveis que resultem em danos à saúde humana; instalar obras ou serviços potencialmente poluidores sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes; deixar de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental e apresentar, no licenciamento, laudo ambiental falso ou enganoso.
A ThyssenKrupp também é investigada por empregar milícias para fazer a segurança privada da planta. O caso está sendo investigado pela Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais no Rio de Janeiro.
Se a companhia for condenada, as penas podem ultrapassar 19 anos de reclusão para o diretor de projetos, Friedrich-Wilhelm Schaefer, e o gerente ambiental, Álvaro Francisco Barata. Além do pagamento de multas, a empresa poderia ter as atividades suspensas.
Na defensiva
Questionado pela Deutsche Welle, o grupo alemão respondeu que a emissão do grafite não provoca danos à saúde e que não emprega grupos de milícias. “A ThyssenKrupp CSA usará a oportunidade apropriada para refutar todas as acusações”, diz a nota enviada à Deutsche Welle. O Ministério Público alega, no entanto, que ainda não há um laudo conclusivo sobre a composição do que foi lançado ao ar.
A empresa afirma cumprir todas as normas ambientais vigentes e que as autoridades brasileiras teriam reconhecido que “a CSA usa tecnologia ambiental de primeira classe”. Pela poluição lançada no ar a empresa “se desculpa com seus vizinhos” e diz que, voluntariamente, se comprometeu a contribuir 6,3 milhões de euros em projetos para melhorar o sistema de saúde e a infraestrutura locais.
E ainda: “ThyssenKrupp CSA paga os melhores salários no Brasil. Essa é uma das razões que levou mais de 42 mil pessoas a se candidatarem aos empregos oferecidos”.
Perfil e atuação
Sob capacidade total, a unidade pode produzir 5 milhões de placas de aço por ano “em excelente qualidade e a baixo custo”. A licença prévia de operação que a empresa detém atualmente permite que a usina opere com 70% da capacidade, informou o Inea.
As placas produzidas no Brasil serão processadas na nova unidade da empresa no Alabama, Estados Unidos, e também em Duisburg, oeste da Alemanha. Para o promotor Marcus Pereira Cavalcante Leal, é visível a importância do complexo brasileiro para o futuro do grupo ThyssenKrupp. “Acredito que essa mudança de comportamento também tenha acontecido por pressão do conselho administrativo do grupo, porque a imagem da empresa, provavelmente, pode ter sido arranhada com as notícias que vieram do Brasil.”
E se os incidentes ambientais tivessem acontecido numa unidade na Alemanha? “Talvez já teriam abafado o alto-forno e interrompido o funcionamento da siderúrgica há muito tempo”, supõe o promotor, lembrando a consciência ambiental dos alemães, que é reconhecida no mundo inteiro.
Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer
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