Processo contra o presidente da Câmara no Conselho de Ética depende de como votarem os deputados Sérgio Brito (PSD-BA), Cacá Leão (PP-BA), Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), Ricardo Barros (PP-PR) e Paulo Azi (DEM-BA)
Por Étore Medeiros, na Pública
A continuidade das investigações contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no Conselho de Ética depende do voto de cinco parlamentares, que até agora não revelaram a sua posição. Os deputados Sérgio Brito (PSD-BA), Cacá Leão (PP-BA), Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), Ricardo Barros (PP-PR) e Paulo Azi (DEM-BA) mantêm mistério sobre como vão se comportar – e podem inclusive se ausentar, abrindo caminho para que suplentes salvem Cunha ou votem contra ele. O modo como esses políticos vão atuar pode já ficar claro na sessão do colegiado marcada para esta terça-feira (8). Será mais uma tentativa de avaliar o parecer do relator Fausto Pinato (PRB-SP), que acha que há elementos suficientes para que o presidente da Câmara seja investigado. A representação do PSOL e da Rede pede a cassação de Cunha, por ter mentido à CPI da Petrobras quando afirmou não possuir contas no exterior.
Ainda não se sabe se o Conselho de Ética chegará a uma decisão sobre o caso hoje, porque o presidente da Câmara agendou para o mesmo horário a sessão plenária que elegerá a comissão especial destinada a avaliar a continuidade do processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff. Foi mais uma manobra do deputado, apontada por adversários para tentar adiar novamente o processo. O colegiado manteve a reunião, mas terá que deliberar antes que comece a sessão do Congresso – a partir desse momento, o regimento impede que comissões ou o Conselho de Ética façam votações ou decidam sobre algum tema.
Depois de muitas manobras e polêmicas, o placar da votação do parecer permanece incerto. Pelo menos nove dos 20 deputados devem votar a favor do parecer de Pinato. Aliados do presidente afirmam também ter nove votos, mas apenas seis estão garantidos. Assim, o futuro do presidente recai sobre cinco parlamentares.
A lista dos deputados cujos votos são incógnitas começa com Sérgio Brito (PSD-BA). Embora tenha atuado no adiamento da análise do processo contra Cunha, com um pedido de vistas, ainda em novembro, ele estaria sendo pressionado pela direção do partido na Bahia. Especula-se que ele possa simplesmente se ausentar nesta terça, se não da reunião, durante o momento de votação – caso haja tempo para a deliberação –, cedendo assim lugar para um suplente do bloco. Integrado há pouco ao Conselho, João Carlos Bacelar (PR-BA) seria um possível votante neste caso. Também aliado de Cunha, este seria um voto certamente a favor do presidente. O risco da manobra é que o suplente a votar poderia ser até mesmo um petista, dada a composição do bloco do PSD – que inclui PT, PR, PROS e PCdoB.
O posicionamento de Cacá Leão (PP-BA) também é de difícil leitura. Aliado de Cunha, o parlamentar não se manifestou em nenhuma das reuniões do conselho nas quais o caso foi analisado – mas pediu vista sobre o parecer que pede o arquivamento da representação contra Chico Alencar (PSOL-RJ), na semana passada, o que pode ter repercussão na reunião desta terça. Apesar disso, Leão é filho do vice-governador da Bahia, João Leão (PP), que também é secretário do Planejamento no governo Rui Costa (PT), sucessor de Jaques Wagner, homem forte do PT, no comando estadual. Um integrante do Conselho de Ética diz que muitas coisas podem acontecer no “submundo da política”, e que o governo federal pode fazer ofertas diretamente a governos estaduais em busca de votos no colegiado e também no processo de impeachment. O baiano poderia engrossar a turma dos ausentes, evitando um constrangimento pessoal e abrindo espaço para um suplente aliado de Cunha. O PP faz parte do bloco do PMDB, que inclui outros 12 partidos e tem entre os nove “reservas” quase que uma unanimidade a favor do presidente da Casa.
Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) é outra incógnita. Embora seja conhecido aliado de Cunha, o petebista estaria enfrentando desentendimentos com o presidente da Casa e teria até mesmo pedido para ser substituído no Conselho de Ética. Também do bloco do PMDB, Faria de Sá aumentaria as chances de suplentes contrários ao parecer de Pinato assumirem a sua vaga, mas deixaria ainda mais claras as suspeitas sobre a sua lealdade a Cunha.
Outro que pode votar a favor de Cunha ou pode não comparecer é Ricardo Barros (PP-PR). O relator do orçamento poderia não querer entrar na bola dividida – embora tenha ido e marcado presença nas reuniões, ele costuma se retirar logo em seguida e não participa dos debates – mas não restam dúvidas do seu alinhamento ao mandatário da Casa. “Então, presidente Eduardo Cunha, a nossa solidariedade a Vossa Excelência e a todos os demais parlamentares que estão nessa mesma condição, com a sua reputação colocada em xeque por indícios que são absolutamente superficiais, alguns, inclusive, apontados por delatores que se contradizem uns aos outros”, comentou Barros, quando Cunha foi ouvido pela CPI da Petrobras – justamente onde teria mentido sobre as contas na Suíça, o que levou ao pedido de cassação. Caso não vote, poderia abrir espaço para um suplente favorável ao presidente, já que o PP também integra o bloco do PMDB.
As dúvidas continuam, acreditam alguns parlamentares, com o voto de Paulo Azi (DEM-BA) e mesmo de tucanos, que poderiam demonstrar gratidão a Cunha pela abertura do processo de impeachment. As suspeitas que recaem sobre Azi também se devem à disputa política na Bahia, tradicional reduto do DEM, que amarga derrotas consecutivas no governo estadual para o PT desde a primeira eleição de Wagner, em 2006. Preservar Cunha, aumentando as chances de garantir a continuidade dos trâmites para o impedimento de Dilma, poderia ser visto pelos correligionários locais como uma vitória, já que derrubaria por tabela Wagner, hoje ministro da Casa Civil. O desgaste do apoio a Cunha, entretanto, para os dois partidos da oposição – que pedem de forma mais obsessiva o impeachment e que conclamam o povo às ruas contra Dilma – torna a hipótese de difícil concretização.
A corrida dos suplentes
A primeira disputa que deve ser travada no plenário 11 é justamente pelo registro de presença. Na semana passada, aliados de Cunha conseguiram atrasar os trabalhos em duas horas acusando Ônyx Lorenzoni (DEM-RS) de ter furado a fila que os suplentes faziam na entrada do local, à espera da abertura do painel. Como a fila não é regimental se espera que, desde muito cedo, os parlamentares ocupem as cadeiras do plenário e fiquem a postos para registrarem a presença. O imprevisível também pode ditar o resultado de quais suplentes votarão, uma vez que não é incomum a queixa sobre a sensibilidade da tela sensível ao toque dos computadores.
A preocupação com a ordem de chegada é justificada. Na ausência de um dos titulares, tem direito a voto o primeiro suplente da bloco cujo comparecimento tenha sido computado. Prontos para entrar em ação, pelo menos três deputados suplentes são abertamente favoráveis a Cunha: Manoel Júnior (PMDB-PB), Carlos Marun (PMDB-MS) e Sérgio Moraes (PTB-RS). Este, aliás, chegou a bater boca com Lorenzoni pela suposta furada de fila. Marun, por sua vez, ansioso para votar, chegou a dizer na semana passada que “poucas coisas na vida são tão pusilânimes em relação à ética do que furar uma fila”.
Manoel Júnior disse acreditar que não terá a oportunidade de votar. “Estarei lá no horário marcado, é a minha obrigação como suplente, mas acredito que os titulares também deverão comparecer”. Ele disse não ter sido procurado para tratar da votação no conselho, e que só conversou sobre o assunto com colegas peemedebistas. Autor de diversas questões de ordem ao presidente do colegiado, o paraibano refuta ter protelado a apreciação do parecer. “Aquilo que eu fiz foi justamente para disciplinar o andamento deste e de outros processos que poderão vir. Se o processo não cumpre o Regimento Interno, ele está fora da lei, o que eu não permitirei. Se tem uma coisa que é importante no Conselho de Ética é não cometer injustiças. Ele não pode ser um tribunal de inquisição.”
Um último recurso que pode ser utilizado pelos apoiadores de Cunha para não saírem derrotados, mesmo se perderem a votação da admissibilidade, é o de defender as investigações. “Se virem que vão perder, podem inclusive falar que são a favor de passar tudo a limpo e acabarem votando pela admissibilidade”, acredita um deputado favorável ao parecer. A partir daí, eles continuariam a apresentar recursos para atrasar o resultado do julgamento – que pode acabar inclusive depois do processo de impeachment, caso seja dada continuidade a este.
Posição tomada
Assim, entre os votos que são dados como certos a favor do parecer estão os dos três deputados petistas – Zé Geraldo (PA), Leo de Brito (AC) e Valmir Prascidelli (SP) –, o do vice-presidente do conselho, Sandro Alex (PPS-PR), e o voto do próprio Pinato, que além de relator é segundo vice-presidente do colegiado. Se somam à lista os tucanos Nelson Marchezan Junior (PSDB-RS) e Betinho Gomes (PSDB-PE), além de Júlio Delgado (PSB-MG), que perdeu a disputa pela Presidência da Câmara para Cunha no início do ano. Embora aliado de Cunha, o deputado Marcos Rogério (PDT-RO), conhecido pelo perfil mais técnico, adiantou na semana passada que defende a continuidade das investigações.
Estes nove votos são dados como imutáveis. Com mais um a favor do texto de Pinato – caso um dos deputados de posicionamento incerto se manifestarem a favor do parecer, ou assuma um suplente como Ônyx Lorenzoni, declaradamente a favor da continuidade das investigações – a votação poderia empatar por 10 a 10. Assim, a decisão recairia sobre o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PSB-BA), que tem o voto de minerva. O baiano já anunciou que defende a continuidade das investigações.
Alguns parlamentares chegaram a opinar em margens maiores contra Cunha, chegando a 12 a 8 ou a 14 a 6. Titular do colegiado, Nelson Marchezan Junior (PSDB-RS) diz que o ambiente político está muito tensionado e instável, e não arrisca um resultado para a votação. “São negociações muito particulares, o que torna as decisões bem menos técnicas, éticas e previsíveis. Algo que mudaria em seis meses, em um ano, pode começar o dia com um encaminhamento e terminar com o contrário”. Para o tucano, as possibilidades de aliança entre o peemedebista e o Planalto acabaram de vez com a abertura do processo de impeachment. “É provável que o PT esteja se movimentando, e muito, para manter o Cunha sob judice”, diz. Ainda assim, ele não deixa de alfinetar o partido. “O PT tenta ajudar o governo, mas também melhorar um pouco a sua imagem. Já governo, como vem fazendo durante todo o ano, trabalha a cada dia para manter o mandato no dia seguinte. No jogo do PT e do governo, vale tudo”, afirma.
Assim como Marchezan, Zé Geraldo (PT-PA) também não duvida que o jogo possa mudar de última hora – mas acredita que os vira-casacas estão do outro lado. “O presidente joga pesado e vai lutar com unhas e dentes contra esse processo, já que a admissibilidade é muito ruim pra ele. Não sei os movimentos que o Cunha está fazendo para arrumar os votos, só garanto que ele não terá os nossos”, diz o petista. “Pode ser que ele esteja trabalhando com a oposição para consegui-los – o que vai ser difícil pra oposição, votar com ele, mas tudo pode acontecer”, acredita. Líder do PT, Sibá Machado (AC) nega interferência no colegiado. “Nossa bancada já fechou posição, e esse Fla-Flu só interessa aos tucanos. Não nos metemos no Conselho de Ética, o que acontece não é problema nosso. A dúvida é se a oposição vai misturar o Conselho de Ética com o impeachment.”
Base de Cunha
Além do aliado de primeira hora Paulinho da Força (SD-SP) – que assumiu uma vaga no conselho em novembro justamente para defender Cunha –, também são dados como certos os votos a favor de Cunha dos peemedebistas Mauro Lopes (MG), Washington Reis (RJ) e Wellington Roberto (PR-PB). Outro que deve votar contra Pinato é Vinícius Gurgel (PR-AP), que fez campanha para Cunha chegar à Presidência da Câmara, indo contra a orientação do partido à época, e cuja esposa, a deputada estadual Luciana Gurgel (PHS-AP), entregou pessoalmente o título de cidadão amapaense a Eduardo Cunha, em maio.
Erivélton Santana (PSC-BA) chegou ao Conselho de Ética com o apoio de Cunha –desde o início da legislatura se sabe que muitos deputados envolvidos nos fatos revelados pela Operação Lava-Jato poderão ter o futuro decidido no colegiado. A conta pela cadeira pode começar a ser paga agora. Além disso, o PSC é um dos partidos mais ligados ao presidente da Casa, o que reforça o indicativo que Santana deve se manifestar pelo arquivamento do pedido do PSOL e da Rede.