Malathion havia sido trocado por outros inseticidas, mas produto voltou a ser usado
Claudia Mayara – ABCD Maior
O funcionário veste roupa especial e a cada casa ou quintal em que entra usa o equipamento que leva nas costas para pulverizar o malathion, um agrotóxico potente, usado há quatro anos no Brasil para matar o Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue. No ABCD, a cena se repete desde 2013, toda vez que as prefeituras registram algum caso autóctone (quando a doença é contraída dentro do município) e a nebulização é feita nas imediações da residência da vítima. Neste ano, até agosto, foram mais de 6,9 mil casos autóctones na Região.
O Ministério da Saúde é o responsável por adquirir o malathion, que chega ao ABCD via Sucen (Superintendência de Controle das Endemias), da Secretaria de Estado da Saúde. Em nota, o Ministério da Saúde explicou que o insumo é utilizado no Brasil no controle de epidemias de dengue desde a década de 1980 e chegou a ser substituído por outros inseticidas, mas, como o mosquito criou resistência, o malathion voltou a ser usado em 2011. “É o único produto do mercado ao qual o Aedes aegypti não é resistente”, reforçou em nota a Prefeitura de São Caetano.
Somente em 2015, as cidades do ABCD usaram mais de 532 litros de malathion no combate ao mosquito da dengue. No Estado foram 113,6 mil litros e no País, 328 mil litros. A substância usada na saúde pública está desde 2008 na lista de revisão da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para ser abolida do País e foi classificada como provável cancerígeno pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer, vinculada à Organização Mundial da Saúde. Na Região, apenas Ribeirão Pires negou o uso do agrotóxico.
Ainda conforme o Ministério da Saúde, o malathion compõe a lista da Organização Mundial da Saúde de inseticidas indicados para ações de saúde pública. E garantiu que a utilização do produto na nebulização (fumacê) deve obedecer às orientações sobre armazenamento, transporte e utilização dos insumos, observando as boas práticas de segurança da atividade previstas no Manual de Procedimentos de Segurança em Controle de Vetores, do governo federal.
“O malathion não tem seletividade alguma, pois atinge qualquer ser vivo. Mata o que vir pela frente”, criticou o engenheiro agrônomo Marco Antônio de Moraes. Na avaliação do especialista, todo agrotóxico é um produto de risco que varia conforme a quantidade e forma que é usado. “A eficácia é discutível, pois não atinge os criadouros, apenas os mosquitos em voo”, destacou o defensor público de Santo André, Marcelo Novaes.
INTOXICAÇÃO
O clínico geral do Hospital e Maternidade Dr. Christóvão da Gama, Richard Rosenblat, já atendeu pessoas intoxicadas por malathion quando trabalhava no CCI de São Paulo (Centro de Controle de Intoxicação). A maioria dos doentes vinha das lavouras, onde o produto também é comumente usado. “É uma das intoxicações mais graves que já vi”, destacou o médico.
“A intoxicação por agrotóxico é muito difícil de ser provada. E muitos médicos nem cogitam essa hipótese nas fichas dos pacientes”, argumentou o engenheiro agrônomo Gabriel Sollero.
MINISTÉRIO DA SAÚDE RECOMENDA USO RACIONAL
O Ministério da Saúde ainda ressaltou que o uso do malathion deve ser racional e usado apenas como medida complementar às ações de prevenção e controle da dengue. “O controle do mosquito, sobretudo na fase larvária, é a medida mais eficaz para a prevenção”, afirmou em nota.
Além do agrotóxico, as prefeituras do ABCD garantiram usar larvicidas (pastilhas usadas para combater a larva do mosquito) e realizar campanhas de conscientização da população para eliminar os recipientes de água parada. “O ideal é apostar em técnicas de superação do uso do agrotóxico”, destacou o engenheiro agrônomo Marco Antônio de Moraes.
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Para nebulização com malathion, agente de saúde precisa usar roupa especial; agrotóxico é o único efetivo contra o mosquito. Foto: Carlos Bassan/Fotos Públicos