Brasília, 27 de novembro de 2015
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 fere sensivelmente os direitos fundamentais das comunidades remanescentes de quilombos previstos na Constituição Federal de 1988. Sua aprovação é o estabelecimento de um retrocesso às conquistas duramente alcançadas em décadas de história no que se refere ao reconhecimento da participação dos povos tradicionais na construção da identidade nacional. Com a aprovação da PEC, mais de 130 mil famílias quilombolas, bem como as inúmeras etnias indígenas do nosso país, estarão ainda mais vulneráveis. A Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) entende que a PEC 215 é o anúncio declarado do genocídio aos povos tradicionais do Brasil.
Os territórios que nós quilombolas tradicionalmente ocupamos correspondem a menos de 1% do território nacional. A falta de vontade política para a demarcação dessas áreas é justificada pelo capitalismo em suas mais diversas vertentes: a especulação imobiliária, a exploração abusiva de minérios e recursos naturais dos quais precisamos para sobreviver, a substituição dos biomas e a destruição das faunas que protegemos por monoculturas de transgênicos. O agronegócio vem crescendo sobre os nossos territórios desrespeitando nosso direito maior que é o de existir.
A PEC 215, assim como a Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga as atuações da Fundação Nacional do Índio e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (CPI Funai e Incra), vêm tão somente para beneficiar aos ruralistas de modo que a vida humana e as reservas naturais das quais todos dependemos estão sendo ignoradas. A CPI Funai e Incra vem como armadilha para reforçar a possibilidade de aprovação da PEC 215.
Nesse sentido, registramos nosso repúdio aos ataques que vimos sofrendo e cobramos do Estado uma reflexão aprofundada sobre quais consequências essas atuações garantirão ao futuro de toda a sociedade. As comunidades membros da Conaq, entendemos que se não houver um maior envolvimento da população brasileira para com as causas dos povos tradicionais, é imensurável a perspectiva de conflitos, violências e mortes no campo e nas áreas de biomas (Amazônia, Cerrado, Pantanal, etc) para os próximos anos.
Com a aprovação desta medida o que todos perdemos, pessoas dos meios rurais e urbanos, são o nosso direito à diversidade, à nossa cultura, os nossos valores morais e éticos e também os recursos naturais. Pensemos em que Brasil desejamos para os nossos filhos e netos. Uma nação sem água? sem alimentos orgânicos? sem natureza? Um país sem referências? Vegetativo, sobrevivente a base de soja?
A proposta da PEC 215 também prevê indenização em dinheiro aos proprietários não-quilombolas e não-indígenas das áreas demarcadas, de forma retroativa. Lembramos que não somos invasores e sim pessoas de direito dessas áreas tradicionalmente ocupadas. Estamos em meio a uma luta desleal onde o capitalismo parece eleger as pessoas de direito. Reforçamos, porém, que, o que nós povos tradicionais queremos são os nossos direitos fundamentais – à vida, à terra tradicionalmente ocupada, ao acesso de demais direitos como saúde, educação e desenvolvimento) – tudo o que nos foi negado em séculos de resistência.
A Conaq conta com você para essa reflexão!
Estamos em luta!
Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq)
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por Daiane Souza.