Havia ameaça, mas não choveu.
O que era um tantinho de mulher negra virou um tantão e comoveu.
Lembrava um rio onde flutuavam milhares de flores coloridas.
As dezenas de faixas traziam mensagens; traduziam anseios de vidas doloridas.
As falas emocionadas alternavam com as melodias cheias de ginga e exalavam alegria.
Nem os fascista pró-ditadura empanaram ou reduziram nossa energia.
No todo, um Estado um tanto indiferente, embora um governo reticente.
Os meios de comunicação não comunicaram, omitiram, silenciaram – mídia de brancos para brancos e brancas -, mas com o silêncio, não nos calaram.
Sim, mulheres negras se importam com outras e repudiam o extermínio de seus rebentos, fêmeas e machos, pela mão do Estado que é o primeiro a violar a Lei das Leis.
Nunca poderemos sair deste ´buraco` puxando-nos por nossos próprios cabelos. Algo tem de acontecer além de nossos apelos.
Capitalismo só é bom para capitalistas.
Sim, quem lá esteve sabe que o tudo que fizerem ainda será pouco, neste país encharcado de racismo e machismo; ´desnaturalizá-los` é apenas um item das listas.
A maioria das que atenderam à ´convocação` pôde fazer uma catarse racial e aliviará o coração.
Pode ter sido só cócegas no poder, mas, é sabido que quando o piso se move, a estrutura da pirâmide trinca.
E… com mulheres negras não se brinca.
Rimas pobres na língua do colonizador; não dá para roçar minha língua na língua de minha afro-etnia desconhecida por força da dor.
Crianças, adolescentes, jovens, adultas, idosas; cadeirantes, lésbicas, não-alfabetizadas, doutoras, empregadas domésticas, professoras e todas que lá estiveram, fizeram desse 18 de novembro de 2015 um dos dias mais significativos para a luta de nossa gente negra, contra a opressão, subalternização secular.
A AMNB–Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras e as demais organizações do Comitê Impulsor da Marcha de Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver podem reivindicar a autoria desse ‘atentado’ em favor da democracia racial, de gênero e amplamente participativa.
30 de novembro de 2015.
–
Nilma Bentes é uma das fundadoras do CEDENPA-Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará; uma das atuais coordenadoras da AMNB e propositora da MMNegras 2015.
Foto de Marcello Casal Jr /Agência Brasil.