Cristina Fontenele, Adital
Movimentos de Defesa dos Direitos Humanos apresentaram nessa quinta-feira, 26 de fevereiro, em Recife, Estado de Pernambuco, um dossiê com 715 páginas contendo denúncias sobre o Complexo Prisional do Curado (antigo Aníbal Bruno), um dos maiores do Brasil, situado na zona leste da cidade. Intitulado Arquivo Aníbal, o documento é a consolidação de informações já apresentadas ao Governo de Pernambuco e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), revelando anos de abusos, violência e omissão das autoridades federais pernambucanas.
A coalizão formada pela Pastoral Carcerária, o Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões (Sempri), a organização Justiça Globale a Clínica Internacional de Direitos Humanos da Universidade de Harvard, pretende pressionar o governo por medidas efetivas.
Em janeiro deste ano, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (Partido Socialista Brasileiro – PSB), decretou estado de emergência no sistema penitenciário e determinou a intervenção do Centro Integrado de Ressocialização de Itaquitinga, que está com as obras paradas há cerca de um ano e meio. Em nota, o governo declarou que “tais medidas se dão em face da atual situação de tensão vivenciada no sistema prisional”.
Em entrevista à Adital, o colaborador da organização Justiça Global, Eduardo Baker, comenta que declarar estado de emergência não vai solucionar o problema carcerário. “O Estado por si só não é capaz de resolver a questão. Ele é um ponto de apoio na estratégia. É necessária uma política de sustentabilidade, que consiste em garantir um número adequado de agentes penitenciários, defensores públicos atuantes, condições mínimas de detenção e número adequados de médicos”.
Baker denuncia as condições precárias do presídio. “Visitamos ontem (25 de fevereiro) o local e há presos dormindo no chão, ao relento. Os agentes trabalham em número reduzido, com os coletes à prova de balas vencidos. Tudo isso gera um clima de tensão”.
No Dossiê constam denúncias de 268 casos de violência no presídio (assassinatos, torturas e outros). Dentre estas 87 foram mortes violentas, 175 casos de negação de acesso à saúde, 74 mortes não violentas ou por causas desconhecidas e 267 pedidos de assistência jurídica. Acompanhado de fotos, vídeos, documentos e outras provas, o informe relata o precário e violento sistema prisional pernambucano.
São denúncias de torturas, maus tratos e agressões, variando entre espancamentos, esfaqueamentos, estupros, estupros coletivos, tentativas de homicídio, choques elétricos e feridas por disparos de armas de fogo, dentre outras formas. A violência generalizada envolve presos, chaveiros e agentes, tanto como agressores e vítimas. Dentre a multiplicidade de fatores que contribuem para o clima de violência na unidade, o tráfico de facas e outras armas se destaca.
O relatório explica: “ao invés de aumentar o número de agentes penitenciários para o Complexo Prisional do Curado (antigo Aníbal Bruno), as autoridades delegam a um número reduzido de presos, chamados de chaveiros, representantes ou porteiros, diversas funções de segurança, como a abertura e fechamento das celas e divisões internas das unidades. Os chaveiros e seus auxiliares detêm o controle dos pavilhões através do uso da violência e foram observados portando abertamente facas.” Relatos revelam que os chaveiros controlam o acesso a serviços essenciais e extorquem os demais presos cobrando taxas para a satisfação de necessidades básicas, como dormir em uma cama, ver um médico e comparecer a uma audiência judicial.
Números Carcerários
De acordo com os dados do Novo Diagnóstico de Pessoas Presas no Brasil 2014, do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), a população carcerária brasileira toaliza 567.655 pessoas, apresentando um déficit de 210.436 vagas. Em Pernambuco, são 30.149 presos para 8.956 vagas, o que representa um déficit de 21.368 vagas.
Em perspectiva mundial, o Brasil é o quarto país com maior população prisional. Se incluídos os que estão em prisão domiciliar, o país sobe para terceiro lugar no ranking, atrás apenas dos Estados Unidos e da China.