Cynara Menezes – Socialista Morena
De vestido branco rendado e sorriso maroto no rosto, Mãe Carmem de Oxaguiã, a sucessora da célebre Mãe Menininha do terreiro do Gantois, na capital baiana, analisa o poder feminino na religião afro-brasileira: “As mulheres dão conta do candomblé. A mulher sabe mandar… Com carinho, ela manda”. E vai desfiando os nomes das matriarcas antes dela, antes de sua mãe, e antes ainda… Guardiãs dos segredos dos orixás.
Lançado em 2013, o livro Mulheres de Axé reuniu perfis de mais de 200 ialorixás (mãe-de-santo) de Salvador, região metropolitana e Recôncavo. E foi transformado em um documentário que o Socialista Morena reproduz com exclusividade. No tom calmo de falar, no jeito doce, a sabedoria das mulheres do candomblé contrasta com a perseguição e a intolerância que até hoje sofrem no Brasil os seguidores das religiões de matriz africana.
Embora desde 1939 tenha sido garantida a liberdade de culto no País, não é mais a polícia quem pretende destruir os terreiros de candomblé e umbanda –mesmo com o decreto de Getúlio Vargas, até 1976 havia uma lei na Bahia que obrigava os terreiros de candomblé a se registrarem na delegacia. Atualmente, quem persegue os seguidores das religiões afro-brasileiras é gente dita “cristã”: fundamentalistas evangélicos que disseminam o preconceito e o ódio aos fiéis do candomblé e também da umbanda.
No ano passado, o Disque 100, número disponibilizado pelo governo para denunciar agressões aos direitos humanos, registrou 149 casos de intolerância religiosa, quase todos relacionados às religiões de matriz africana. Em 2007, foi instituído o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa (21 de janeiro), em homenagem à mãe-de-santo Gildásia dos Santos, a Mãe Gilda, do Ilê Axé Abassá de Ogum, no bairro de Itapuã.
Em outubro de 1999, Mãe Gilda teve sua imagem estampada na primeira página da Folha Universal, da Igreja Universal do Reino de Deus, sob os dizeres: “Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes”. No dia seguinte, seu terreiro foi invadido e depredado. Mãe Gilda acabaria morrendo dois meses depois, vítima de um infarto. A família da mãe-de-santo acabou obtendo indenização na Justiça contra a Universal, condenada a pagar 145 mil reais por danos morais.
Agora que temos um fundamentalista evangélico no poder na Câmara dos Deputados, é preciso ficar alerta. Que bom seria se todo mundo pensasse como a Mãe Jaciara de Oxum, herdeira de Mãe Gilda: “Não existe uma religião melhor do que a outra. Seja Deus, Olorum, Javé ou Buda”. Assistam ao documentário de Marcos Rezende, é muito bacana.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.