Sofia Branco – BUALA
Ponto prévio: não há bom e mau racismo, nem sequer mau e pior. Hoje em dia, muitas pessoas, demasiadas, são discriminadas, perseguidas e violentadas com base no facto de, basicamente, não serem brancas. Isto acontece independentemente de outras características, como idade, origem, classe e gênero. Mas tal não significa que, quando associadas, estas categorias, onde, infelizmente, tendemos a encaixar as pessoas humanas, não agravem o quadro de discriminação já existente.
Se a discriminação de gênero é transversal, num mundo que penaliza as mulheres pela única razão de o serem, é natural que haja um gênero também no racismo.
Ser mulher tem servido como um fator agravante de discriminação. Assim acontece também quando o racismo entra na equação. As mulheres continuam a ser discriminadas em razão de serem mulheres e é frequente que o sejam ainda mais se a essa característica se somarem outras, como raça ou origem étnica, orientação sexual, idade, maternidade, etc.
Existem paralelos entre a discriminação racial e a discriminação de gênero – ambas são construções sociais, ancoradas em estereótipos estruturais e em hierarquias de domínio e poder e, por isso, ambas são difíceis de eliminar.
Se, para uma mulher ocidental, continua a não ser fácil convencer a polícia a atuar quando apresenta queixa por violência doméstica, os obstáculos que uma mulher imigrante encontra são ainda maiores, sobretudo se não tiver os documentos de autorização para estar no país, o que não deveria ser um impedimento para que fosse atendida como vítima de discriminação machista.
As mulheres migrantes enfrentam mais perigos do que os homens na mesma condição, estando comprovado que são mais vítimas de abusos e violência e estão mais vulneráveis ao tráfico e à exploração sexuais.
Tendemos a analisar o tráfico de mulheres (menores ou adultas) como uma violação de direitos humanos baseada no gênero, mas, se repararmos bem, é mais do que isso. As vítimas provêm de determinados locais – África, América Latina, Europa de Leste, Ásia –, marcados por situações de conflito e/ou pobreza, devendo o fenômeno ser encarado como uma combinação de gênero, raça e classe.
Atualmente, a União Europeia vê morrer nas suas águas milhares de migrantes, entre os quais muitas mulheres e crianças, em busca de um futuro melhor. Na forma como lida com essa catástrofe humana, que é uma questão de direitos humanos, a União Europeia devia adotar uma perspetiva de gênero, no sentido de proteger quem é mais desprotegido.
Ao contrário, e as próprias instituições europeias já os reconheceram, há relatos de abuso, coerção e violência contra mulheres em centros de detenção de imigrantes.
A falta de documentos não elimina o direito das mulheres migrantes a receberem assistência jurídica, humanitária e social.