Em Porto Velho (RO), 564 casas que estavam abandonadas no reassentamento Nova Mutum Paraná foram ocupadas, desde o dia 16 de abril, por mais de dois mil atingidos pelas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, além dos atingidos pela última grande cheia no Rio Madeira, ocorrida em 2014.
As casas foram construídas pela Energia Sustentável do Brasil, consórcio responsável pela Usina Hidrelétrica Jirau, para abrigar os trabalhadores das obras. Entretanto, após o fim do período de construção, as casas foram desocupadas.
Isso gerou, nos últimos meses, uma série de denúncias envolvendo tráfico e consumo de drogas ilícitas e casos de estupro no local das moradias abandonadas.
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) reivindica que as casas sejam destinadas à moradia popular para os atingidos da região, inclusive parte deles afetados diretamente pela própria hidrelétrica de Jirau.
Entretanto, o advogado Henrique Oliveira Junqueira, em nome da empresa Camargo Correa, entrou com pedido de reintegração de posse da área no dia 22 de abril. O pedido foi concedido em liminar pelo Juiz Danilo Augusto Kanthac do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, fixando multa diária de R$ 700,00 por pessoa que descumprir a decisão. O inusitado é que o processo contém grave vício de ilegalidade, uma vez que o requerente, a Camargo Correa, não é proprietário, mas o concessionário da UHE Jirau, ESBR (Energia Sustentável do Brasil).
O Governo do Estado se manifestou publicamente favorável à manutenção das famílias nas residências e tentou interceder, por meio do vice-governador, Daniel Pereira, mas a empresa por enquanto está se negando a dialogar sobre o assunto. O ocorrido pode resolver muitos problemas para o Estado e município de Porto Velho, uma vez que além do enorme passivo socioambiental gerado pelas usinas, ainda se comprometeram e reafirmaram em diversas oportunidades o compromisso com a reconstrução e reassentamento das comunidades afetadas pela cheia de 2014.
Neste momento, os atingidos exigem a mediação imediata do Governo Federal, que se comprometeu por meio da Secretaria Geral da Presidência da República a convocar audiência pública, junto ao Ministério Público Federal em Porto Velho, ainda no final de 2013, mas que até hoje não foi realizada.
O MAB espera que a situação se resolva antes que as tropas do Comando de Operações Especiais da Polícia Militar reprimam novamente as famílias que estão à procura de um direito básico: a moradia. Os atingidos prometem manter a ocupação e resistir contra a ofensiva da empresa e do poder público.
Jaci Paraná
Grande parte das famílias que ocupam as casas desocupadas de Nova Mutum Paraná vive na região de Jacy Paraná, área coberta pelo reservatório das usinas hidrelétricas e afetada pelo intenso fluxo migratório (a população saltou de 3 mil para quase 20 mil habitantes) por estar próxima dos canteiros de obras.
Segundo o Ministério Público Estadual e Federal de Rondônia, “o aumento vertiginoso da população não foi acompanhado por melhorias nos serviços públicos – que já eram precários desde antes”. A população sofre problemas de saúde, educação, alimentação, moradia, água contaminada, entre outros.
Em Relatório de Vistoria em Jacy Paraná, de 20 de março de 2015, O IBAMA apresenta que “o principal problema observado é a condição da água que está sendo consumida pelos moradores, uma vez que apresenta, a olho nu, alto grau de turbidez e uma consistência espumosa, além de exalar mau cheiro”.
Além do fato da empresa alegar que as casas que seriam destinadas a compensação social estarem agora dispostas à venda, ainda pretendem vender para as próprias famílias atingidas por barragens, como as que foram desapropriadas em Mutum Paraná por Jirau, parte até hoje sem qualquer forma de reparação (indenização, carta de crédito ou reassentamento).
Em Parecer Técnico Final (n°124/2012 COHID/DiLic/IBAMA) que aprecia a situação de condicionantes para emissão da Licença de Operação de Jirau, o IBAMA declara sobre as casas de Nova Mutum Paraná:
“Durante o processo de licenciamento ficou acordado que as casas, assim que desmobilizados os trabalhadores que as ocupam, serão doadas para a Prefeitura Municipal de Porto Velho. (…) Caso a Prefeitura Municipal de Porto Velho manifeste sua impossibilidade de receber as casas que serão desocupadas pela ESBR, previstas para serem doadas à prefeitura, a empresa deverá tomar providências para outra destinação socialmente viável dos imóveis e/ou desmobilização das estruturas, aliado as atividades de recuperação de áreas degradadas constantes no PRAD do empreendimento.”
—
Imagens reproduzidas do site do MAB.