Essa é a quinta parte de uma série de cinco matérias que documenta a história e a sequência das Unidades de Polícia Pacificadora. Clique para Parte 1, Parte 2, Parte 3 e Parte 4.
Patrick Ashcroft – Rio On Watch
Em 2014, com as prioridades focadas na Copa do Mundo da FIFA e com todo o programa dasUnidades de Polícia Pacificadora (UPP) enfrentando, de certa maneira, uma crise, a implementação de novas UPPs foi reduzida drasticamente. Mangueirinha tornou-se a primeira comunidade pacificada na região da Baixada Fluminense algo que era há muito esperado, considerando os níveis extremos de violência letal na região. Em seguida, Vila Kennedy se tornou a terceira favela a receber uma UPP na Zona Oeste. Daí, apenas alguns meses antes do início da Copa do Mundo, o Complexo da Maré, na Zona Norte foi ocupado pelo exército, em um movimento que simbolicamente marcava a comunidade como “território inimigo”. Apesar do enorme investimento em soldados, recursos e dinheiro, a área ainda tem quadrilhas de traficantes fortemente armados conduzindo as vendas de forma aberta, e o exército não conseguiu fazer com que os moradores se sentissem mais seguros.
37. Mangueirinha – Duque de Caxias, Baixada Fluminense
Data: 7 de fevereiro de 2014
Uma região já assolada pela violência letal, a Baixada Fluminense na Região Metropolitana do Rio de Janeiro viu um aumento de 25% no número de assassinatos entre 2012 e 2013, subindo de 1381 para 1782, aumento possivelmente causado por uma migração de atividades criminosas das áreas do Rio onde ocorreram pacificações. Apesar da necessidade desesperadora por atenção especial em termos de segurança por ser a região mais violenta do Estado do Rio de Janeiro, a Baixada somente recebeu sua primeira UPP em fevereiro de 2014.
Quando a UPP foi implementada na Mangueirinha, um complexo de favelas, o comandante da unidade, Bruno Leite, expressou a esperança de que a transição seria suave, destacando que a força policial anterior tinha tido uma forte reputação. Um projeto musical coordenado pela polícia envolvendo crianças do bairro parece atestar relações positivas. No entanto, um pesquisador que participou de uma reunião aberta em março de 2015, entre a UPP e a comunidade, notou a ausência de um representante da comunidade no painel, e vagas promessas feitas por representantes do Estado. Como tem sido atestado com frequência, aparticipação ativa prometida pela UPP tende a ser substituída por reuniões simbólicas em que o Estado escuta as reclamações dos moradores, promete resolvê-las, mas, em seguida, faz pouco. A esperança reside agora no CEMAPP: uma comissão recentemente criada reunindo diversos órgãos públicos destinados a monitorar e avaliar o processo de pacificação, com a ênfase especial na participação comunitária.
Perspectivas de moradores
“Os prefeitos e secretários sempre falaram que não conseguiriam chegar aqui, por causa dos tiroteios. Agora que conseguiram, têm que trazer os serviços. Isso aqui estava abandonado, mas isso vai mudar… hoje a comunidade se sente em paz.”- Ivan Alvarenga, presidente da Associação de Moradores da Favela do Sapo, Mangueirinha
38. Vila Kennedy – Zona Oerste
Data: 23 de maio de 2014
A instalação da UPP da Vila Kennedy estava prevista para o segundo semestre de 2014, mas foiimplementada no início do ano devido a intensos conflitos entre facções rivais do tráfico. Tal como acontece com muitas outras comunidades pacificadas, uma das principais queixas na Vila Kennedy é que os serviços básicos que foram prometidos para acompanhar a pacificação ainda não foram fornecidos pelo Estado. Este filme, mostra uma área para a qual uma clínica médica foi prometida em 2012, permanecendo, dois anos depois, como um terreno baldio usado como depósito de lixo. Alguns relatórios alegaram que quadrilhas de traficantes tinham roubado o equipamento que era para ser usado para construir a clínica, enquanto o Estado defendeu a falta da construção argumentando que a área ainda não era segura o suficiente. Mais de um ano após a instalação da UPP, o progresso ainda tem sido pouco. Seja qual for a razão, a pacificação significa pouco sem a implementação desses tipos de serviços.
Dois oficiais da UPP Vila Kennedy foram mortos em novembro e dezembro de 2014. Um ataque na base da UPP por supostos traficantes em junho deste ano é prova que a polícia ainda não adquiriu o controle total da favela.
Uma observação positiva: após as operações iniciais das forças de pacificação, uma escola de futebol patrocinada pelo Leo Moura (um ex-profissional que cresceu na comunidade) foi lançada em 2014 e irá oferecer treinamento para mais de 700 crianças.
Perspectivas de moradores
“A Comlurb recolhe quando quer, mas a gente não tem como evitar juntar lixo. Vou guardar lixo em casa? Pior: as moscas e baratas entram e a gente não sabe o que fazer”. – Estela Maria de Jesus, moradora
“Eu moro na pior rua daqui, tem época que fica muito complicado. Mas com a chegada da UPP os moradores com certeza vão ficar muito satisfeitos. Vai dar mais sossego para a gente”. – Luciana Quercia, moradora
Ocupação do Complexo da Maré – Zona Norte
Data da ocupação: 30 de março de 2014 [data para instalação da UPP a ser determinada]
Apenas alguns meses antes da Copa do Mundo de 2014, a Maré foi ocupada pelo exército como um precursor para a implementação de unidades da UPP. Com um custo reportado de mais de R$1 milhão, por dia, soldados de diferentes estados do Brasil trabalharam por dois meses num momento em que o local era um dos complexos de favelas mais instáveis na cidade, onde três facções diferentes disputavam o controle do território. No ano seguindo o início da ocupação, houveram numerosas violações de direitos humanos, o que não é surpreendente quando uma força teoricamente concebida para proteger o país de invasores externos é enviada para ‘policiar’ uma comunidade local. Um protesto contra a violência policial em fevereiro de 2015 resultou em violência entre policiais e manifestantes–a polícia alega que foi um conflito com supostos traficantes de drogas–o conflito deixou dois mortos e três feridos. Ver soldados patrulhando a própria comunidade é uma imagem particularmente visceral, especialmente para crianças pequenas. Uma polêmica se iniciou quando o exército distribuiu gibis para crianças em idade escolar, que incluíam um recorte do caveirão muito usado em operações na comunidade. O diretor da ONG local Redes da Maré, Edson Diniz, lamentou a “falta total de tato e conhecimento” pelas forças de ocupação. O Estado tem apontado para uma forte redução nas estatísticas de violência letal, mostrando que a taxa de homicídio da região caiu de quase 22 para 5,33 em pouco mais de um ano, mas a percepção de muitos moradores é que a comunidade não está mais segura. As organizações da sociedade civil da Maré têm desempenhado um papel fundamental facilitando discussões sobre políticas de segurança pública e os impactos na comunidade, trabalhando para melhorar a comunicação entre os moradores e autoridades.
Em abril de 2015, o processo de pacificação começou gradualmente, com a Polícia Militar assumindo o lugar do exército em seis das 16 comunidades da Maré. A Maré eventualmente receberá quatro unidades da UPP. Os sinais iniciais não foram positivos: este vídeo mostra um policial conversando animadamente sobre os tiros que deu em criminosos na área. Além disso, a Polícia Militar tem expressado a sua preocupação com a logística e a viabilidade de 200 policiais substituírem um grupo muito maior de soldados do exército.
Perspectivas de moradores
“Vejo que a ação do exército desencadeou várias reações, mas a relação que os soldados construíram não foi nenhuma coisa de proximidade com o morador [estipulado no programa]. Eles não se preocuparam com isso. Pelo contrário, acho que é uma postura intimidadora.” – Ratão Diniz, fotógrafo local
“Ainda há traficantes armados no interior da favela.” – Morador