Da Página Travesti Reflexiva
Algumas coisas me atingem em cheio; ver o aspecto que a Veronica apresentava, após ter sido espancada por policiais, foi uma delas.
“O que foi que ela fez?” não é a pergunta que precede qualquer possibilidade de comoção? Repetem, com esse questionamento, a conhecida ideia de que toda travesti, ou transexual, inserida em algum conflito é, de certa forma, responsável pelo mesmo. A violência que ela sofreu sendo, novamente, relativizada pela busca da justificativa para a agressão experimentada. Uma demanda por empatia é inexistente quando nos deparamos com uma experiência trans, mas nenhum hematoma é passível de argumentação.
Eu queria ver vocês chorando pelas travestis e transexuais; o luto legitima a nossa humanidade, o choro torna humano o corpo considerado abjeto. Eu pergunto: por que vocês não choram por nós? Não somos inteligíveis; sequer existe, por parte de vocês, reconhecimento de vida do lado de cá. Ela estava jogada no pátio da delegacia, enquanto os outros sujeitos apreendidos pela polícia encontravam-se levantados. Eu estou comparando-a com indivíduos que escutam “bandido bom é bandido morto” diariamente, tais esses que não possuem o menor valor existencial para o meio. Ela, naquele contexto, jogada no chão e observando os outros presos que estavam em pé, ainda conseguiu ser colocada dentro de uma categoria pior que a deles.
Um bicho não seria tão humilhado.
Desfigurada e completamente inchada, com o cabelo raspado e sem blusa, Veronica estava exposta na frente de uma viatura vestindo apenas uma calça rasgada. Fotografada por agentes defensores que achavam graça da cena: a crueldade institucionalizada, ela havia sido despejada junto aos homens. Ajoelhada, assistiu os representantes do Estado registrando aquele momento e rindo da cara dela.
Travestis e transexuais não obedecem ao conceito equivocado de coerência, propagado pela cultura, entre anatomia e gênero. Dessa forma, não somos lidas, vistas e encaradas como “gente”. A humanização escapa, é arrancada do nosso alcance a partir do contato com o outro, aquele que não nos reconhece. Somos um projeto de ser humano colocado para apuração, não demos certo.
Não sei o que ocorreu, eu não estava lá. Somente compreendi que, em algum instante da abordagem, ela e um – provavelmente muito mais de um – policial acabaram brigando e o saldo desse enfrentamento resultou nela arrancando, com a boca, uma parte da orelha dele. Eu pergunto-me até que ponto ela não foi marginalizada por eles para recorrer a esse tipo de ferramenta? Não somos tão inocentes assim, sabemos a policia que temos.
Sabem, eu costumo viver uma eterna alternância entre duas extremidades: ou estou ignorando, de maneira completamente inerte, a forma que sou tratada pela sociedade, ou estou combatendo esse feedback danoso que recebo. E é exatamente nesse segundo momento que nós somos vistas, quando fazem-nos atingir o nosso limite, no minuto que o estigma torna-se insuportável, na vez que o fardo fica pesado.
Você deve estar pensando que não é culpado por nada disso, mas é sim e não se assuste. Eu também sou, nós somos por fazermos parte dessa lógica. É preciso que a gente reconheça o nosso lugar enquanto pessoas que administram essa sociedade, tudo isso é construção. Sendo desenvolvido por nós, fica mais fácil entendermos que podemos mudar.
Reinventem o corpo, esse é o pedido de uma travesti cansada.
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Enviado para Combate Racismo Ambiental por Mirt’s Sants, via Lunna Barreto Gomes.
Leia também: “Eu abri a porta e ela disse que ia me matar”, diz idosa agredida por travesti em São Paulo
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#eunãosouVeronica
Primeiro é ridiculo debater um assunto sem saber da história!
Se informe primeiro antes de apresentar qualquer opinião!
Opção sexual não pod ser justificativa para violência e nem disfarce pra dissipação da criminalidade!!!!!!!
“E nós sabemos a polícia que temos?????”
Larga de ser ridículo! Não inverta os papéis sociais!
Se fosse alguem da sua família eu queria ver sua opinião!
“Eu abri a porta e ela disse que ia me matar”, diz idosa agredida por travesti em São Paulo
http://racismoambiental.net.br/?p=178719
Uma “pessoa” que bate em uma idosa de 73 anos não merece nenhum respeito por parte da sociedade.
Eu não sou verônica. http://noticias.r7.com/sao-paulo/eu-abri-a-porta-e-ela-disse-que-ia-me-matar-diz-idosa-agredida-por-travesti-em-sao-paulo-19042015
Deixa eu explicar uma coisa pra você. Em primeiro lugar, animais não podem ter esperança de serem tratados com qualquer dignidade. E antes que você distorça minhas palavras, estou me referindo a qualquer pessoa que haja como um animal, seja homem, mulher, hemafrodita, travesti… qualquer um deles.
Dito isso, só pra deixar bem claro, quero mais que criminosos agressores de velhinhas se fodam. Eu não consigo imaginar a minha fúria, caso se tratasse de um familiar meu. Qualquer um que tenha capacidade de agredir uma senhora indefesa da forma que aconteceu, qualquer um, não merece UM PINGO de dignidade, merece sim ser tratado como o animal que é.
E como você trata um criminoso tão vil, capaz de cometer um crime como esse? Como você trata um estuprador, um assassino de crianças, um espancador de senhoras? Humilhando. Não há nenhuma chance de um ser humano olhar para um criminoso desse tipo e ter compaixão sincera. Antes da empatia com o criminoso, vêm a empatia com a vítima… e essa anula qualquer chance de querermos entender o criminoso, se colocar no lugar dele. Esse pensamento não é sequer comportado por alguém que tenha em primeiro lugar empatia o suficiente para se colocar no lugar da vítima. É como uma pessoa normal diante de um sociopata, não há meios para que o primeiro entenda o segundo.
E assim a única forma que resta de se averiguar se aquele corpo tem algo que lembre uma alma é humilhando, só para ver se ela reage diante do absurdo DESSA VEZ.