Pesquisa Datafolha, divulgada nesta quarta (15), aponta que 87% da população é a favor da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Ao todo, 11% são contrários à alteração, 1% foi indiferente e outro 1% não soube responder.
A maior rejeição à proposta está entre os que têm ensino superior (23%) e os mais ricos (25%). E 74% da população apoia a redução para qualquer tipo de crime e não apenas os hediondos.
A análise que já fiz, neste blog, permanece atual. Não fiquei surpreso com o índice de 87% – ainda mais com redes sociais, listas de WhatsApp e determinados programas “jornalísticos” na TV batendo bumbo, dia e noite, a favor da proposta.
O que me surpreende, de verdade, é ainda termos 11% de pessoas que não se deixaram levar por soluções fáceis, que vão atacar consequências e não as causas.
Primeiro, vale a pena sempre lembrar: uma democracia verdadeira passa pelo respeito à vontade da maioria, desde que garantindo a dignidade das minorias.
Até porque, como sabemos, a maioria pode ser avassaladoramente violenta. Se não forem garantidos os direitos fundamentais das minorias (e quando digo “minoria”, não estou falando de uma questão numérica mas, sim, do nível de direitos efetivados, o que faz das mulheres uma minoria no país), estaremos apenas criando mais uma ditadura.
Não se governa por plebiscito. Porque ao jogar para a massa, a dignidade de um grupo pode ir para o chinelo. Porque não são minorias as responsáveis por fazerem as perguntas levadas à consulta, mas, pelo contrário, quem está no poder.
O direito ao aborto e à eutanásia, a redução da maioridade penal e a descriminalização da maconha, se levadas a plebiscito, hoje, perderiam. Mas, olhe que interessante: a taxação de grandes fortunas, a auditoria na dívida brasileira ou mesmo a rejeição ao projeto que amplia a terceirização (4330/2004) certamente ganhariam.
Agora me digam: qual estaria mais perto de ir a uma consulta? Por quê?
Fico minimamente aliviado que decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a interpretação da Constituição Federal visando à garantia desses direitos não têm sido tomadas necessariamente com base em pesquisas de opinião ou para onde sopra a opinião pública em determinado momento depois de um crime bárbaro.
Pois, quando isso acontece, a população, feito uma horda desgovernada, pede um misto de Justiça e de vingança com as histórias de violência. Olho por olho, dente por dente, para a felicidade de Hamurabi. Afinal de contas, aquele bando de assassinos da Fundação Casa deveria é ser transferido para a prisão e apodrecer por lá, não é mesmo? Não importa que menos de 1% dos jovens internados na antiga Febem estão envolvidos com latrocínios. Se a gente diz que a culpa é deles, é porque alguma coisa fizeram de errado.
A Fundação Casa, do jeito que está, não reintegra, apenas destrói. A prisão, então, nem se fala. Mandar um jovem para lá e desistir dele, para quê? Para que, daqui a 30 anos, ele volte e desconte tudo? Reduzir a maioridade penal para 16 anos só fará com que pessoas aprendam mais cedo a se profissionalizar no crime. E se jovens de 14 começarem a roubar e matar, podemos mudar a lei no futuro também. E daí se ousarem começar antes ainda, 12. E por que não dez, se fazem parte de quadrilhas? Aos oito já sabem empunhar uma arma. E, com seis, já se vestem sozinhos.
Um dos maiores acertos de nosso sistema legal é que, pelo menos em teoria, protegemos os mais jovens – que ainda não completaram um ciclo de desenvolvimento mínimo, seja físico ou intelectual, a fim de poderem compreender as consequências de seus atos.
Completar 18 anos não é uma coisa mágica, não significa que as pessoas já estão formadas e prontas para tudo ao apagarem as 18 velinhas. Mas é uma convenção baseada em alguns fundamentos biológicos e sociais. E, o importante, é que as pessoas se preparam para essa convenção e a sociedade se organiza para essa convenção.
Podemos mudar a convenção, mas isso não garante que a sociedade mude junto e se adapte a essa nova realidade. Pois o problema não é a idade, mas qual destino possibilitamos a esses jovens.
Ninguém está defendendo o crime, muito menos bandidos. Até porque, adolescentes que cometeram infrações são internados por até três anos e eles efetivamente são. O que está em jogo aqui é que tipo de sociedade estamos nos tornando ao defendermos a redução da maioridade penal.
Decretamos a falência do Estado e a inviabilidade do futuro e assumimos o “cada um por si e o sobrenatural por todos”? Do que estamos abrindo mão ao pregar que as falhas na formação da juventude sejam corrigidas de uma forma que, como já ficou provado, não funciona, é apenas vingança?
Concordo integralmente. Pena que estejamos em minoria. A conclusão é que essa maioria pouco se incomoda com as condições em que vivem os jovens pobres, desde que não perturbem seu bem-estar. Os pobres devem conformar-se e conviver pacificamente com a miséria que lhes coube. Se criarem problemas, repressão violenta, para aprenderem. Enquanto isso, os mais abençoados, grandes responsáveis por esse quadro que aquela maioria julga natural, viajam, gastam vários salários mínimos num único jantar, compram ilhas, iates, jatinhos, carros caros para toda a família, casas suntuosas aqui e no exterior, onde aliás estudam seus filhos. Como a lei parece estar a serviço de seus interesses, ai dos que protestarem.