Perdemos hoje a companhia física do companheiro Eduardo Galeano. Uruguaio de nascimento, caribenho e latino-americano por opção de vida e militância política.
A perseguição política que sofreu dos governos ditatoriais, que assolou o continente latino americano, sob o patrocínio dos governos estadunidenses, forçou-o a viver doze anos no exílio (1973-1985), numa frustrada tentativa de isolá-lo do seu povo e enfraquecer seu amor por seu país. Seus algozes desconheciam o sangue, latino-americano, que corria em suas veias.
O exílio e as ditaduras latino-americanas forjaram sua têmpera revolucionária. E a radicalidade de sua atuação política foi sempre alimentada por um intransigente humanismo e solidariedade em defesa de todas as vítimas do sistema opressor. Sabia que uma nova realidade seria protagonizada pelo povo oprimido. Escreveu: “o corpo não é uma máquina como nos diz a ciência. Nem uma culpa como nos faz crer a religião. O corpo é uma festa”. Uma festa que um dia, sob o legado que esse companheiro nos deixou, irá se realizar nesse continente, onde não haverá exploradores e explorados.
Detentor de um texto primoroso, sem abrir mão de suas convicções políticas e da identidade cultural do seu povo, sabia, como sábio que era, que o aprendizado verdadeiro é o que jorra do povo. Por isso não hesitou em dizer que “a solidariedade é horizontal: respeita a outra pessoa e aprende com o outro. A maioria de nós tem muito o que aprender com as outras pessoas”.
Sempre do lado dos mais pobres, reverenciado no mundo todo por causa de suas obras literárias, era um instigável companheiros dos ninguéns.
Os ninguéns: os filhos de ninguém, os donos de nada.
Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida, fodidos e mal pagos:
Que não são embora sejam.
Que não falam idiomas, falam dialetos.
Que não praticam religiões, praticam superstições.
Que não fazem arte, fazem artesanato.
Que não são seres humanos, são recursos humanos.
Que não tem cultura, têm folclore.
Que não têm cara, têm braços.
Que não têm nome, têm número.
Que não aparecem na história universal, aparecem nas páginas policiais da imprensa local.
Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata.
A impossibilidade de escrever sobre Galeano sem recorrer o que ele mesmo nos legou é a prova mais contundente que ele continua entre nós. A ele sempre iremos recorrer para nos abastecer da utopia, inalcançável, mas que nos faz caminhar em seu alcance.
Este é um pouco do Galeano que nos deixou. Já nos faz falta sua convivência e presença física, sempre presente nas primeiras fileiras nas lutas contra a opressão e as injustiças e em defesa de uma sociedade socialista. Continuará, entre nós, pelos ensinamentos e exemplo de vida que deixou à posteridade. Deles seremos herdeiros e compromissados a seguir seus ideais de uma sociedade socialmente justa, igualitária e democrática.
Galeano vive, entre nós, porque seu legado é eterno.
Viva a América Latina e Caribe!
Viva o Socialismo!
Viva Eduardo Galeano!
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
São Paulo, 13 de abril de 2015