Cristina Fontenele – Adital
Há mais de um ano (janeiro 2014), a investigação sobre as esterilizações forçadas no Peru está arquivada parcialmente, excluindo assim a responsabilidade penal do ex-presidente Alberto Fujimori e seus ministros de Saúde. Vítimas e organizações de direitos humanos continuam reclamando pelo não arquivamento do processo.
Para o advogado do caso, Julio Arbizu, “temos sérias dúvidas sobre a imparcialidade dos operadores de justiça, não só nos últimos tempos como também ao largo dos 18 anos que tem este caso e que até hoje não passou, com a contundência que deveria, da etapa preliminar da investigação preparatória. Ou seja, o caso não foi julgado, além de uma vaga imputação por delitos menores.”
Sobre as mudanças de promotor do caso (Luis Antonio Landa será o novo responsável pelo processo, substituindo Carmen Ibáñez), Arbizu espera que seja uma decisão definitiva e não provisória. “Não queremos mais coisas provisórias, que tenham de ser submetidos ao vai e vem ou a pressões de grupos, como os de Fujimori. Sabemos que eles estão pressionando e o denunciamos em voz alta”.
Segundo Liz Meléndez, diretora do Comitê da América Latina e Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem) no Peru e membro do Centro da Mulher Peruana Flora Tristán, “A justiça é uma utopia para as mulheres.”
O Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (Cedaw) expressou sua preocupação pelos casos investigados e cujas vítimas não receberam nenhum tipo de compensação. O Comitê recomenda ao Estado que identifique todas as mulheres vítimas dessa violência, investigue, processe e puna os culpados, assim como faça as devidas reparações às vítimas.
As primeiras denúncias sobre as esterilizações ocorreram entre 1988 e 2001, quando foram arquivadas em 2009 e reabertas em 2012 a partir de um acordo entre o Estado peruano e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, no qual o Estado se comprometeu a buscar uma solução amistosa para alguns casos abertos.
Uma das histórias mais significativas do país foi o da Sra. María Mamérita Mestanza, do distrito de La Encañada, Cajamarca (norte do país), falecida por infecção generalizada em abril de 1988, dias após uma intervenção forçada de esterilização. Este processo é o único no qual o Estado foi reconhecido com responsabilidade penal, indenizando a família da vítima em cerca de US$ 80 mil.
Entenda o caso
O ex-presidente peruano Alberto Fujimori comandou uma política de esterilizações forçadas durante seu governo (entre 1990 e 2000), atingindo quase 300 mil mulheres e 22 mil homens peruanos, sob o nome oficial de Programa de Saúde Reprodutiva e Planejamento Familiar. As vítimas eram submetidas a procedimentos sem seu consentimento, ou sob coação, suborno e ainda sendo enganadas.
As cirurgias eram realizadas nos departamentos e províncias mais pobres do país, especialmente nas zonas rurais. A maioria dos casos se tratava da população indígena Quechua e Aimara. Mulheres grávidas também foram obrigadas por agentes de saúde a passarem pelo procedimento, que possuía cotas a cumprir.
Confira o vídeo produzido por Cladem Peru em colaboração com o Estudo para a Defesa e os Direitos da Mulher (Demus) sobre os casos de esterilização no Peru.