A estação de metrô da Faria Lima mergulhou no caos na última terça-feira. Tudo começou quando por volta das 23h, parte do grupo que havia participado da manifestação contra o aumento da tarifa, que terminara no Largo da Batata sem nenhuma ocorrência de tumulto, foi em direção à entrada do metrô para fazer um “catracaço”: pular as catracas e entrar sem pagar. Foi aí que a polícia, na tentativa de impedir o ato ilegal, atirou bombas de efeito moral dentro da estação
Marina Rossi – El País / IHU On-Line
Na estação Faria Lima, além dos manifestantes, estavam trabalhadores que voltavam para casa, crianças. Tudo ficou tomado por gás e fumaça. O pânico se instaurou. Intoxicados pelo gás das bombas e assustados por não saber o que acontecia, os passageiros entraram em choque, muitos choraram, gritaram, achando que o local estava pegando fogo. Alguns, que nunca haviam sofridos os efeitos de uma bomba dessas, achavam que seus corpos estavam queimando, por causa da reação similar provocada pela aspiração do gás.
A cena, de acordo com especialistas, reflete o despreparo da polícia de São Paulo para lidar com manifestações populares, mesmo um ano e meio depois de conviver com elas de maneira mais ou menos frequente após os protestos de junho de 2013.
“A polícia não segue um procedimento operacional padrão e tem normas que parece que não estão sendo usadas nessas manifestações. É inadmissível, por exemplo, jogar bombas no metrô”, diz Marcos Fuchs, diretor adjunto da ONG Conectas, de Direitos Humanos. “A sensação que se tem é que o manifestante está indo para um combate.”
Para Bernardo Wahl, professor especialista em segurança interna e militarização da FAAP, a atitude da Polícia Militar de São Paulo é um reflexo das ordens políticas enviadas pelo Governo do Estado, comandado por Geraldo Alckmin (PSDB). “O modo como a policia é empregada reflete uma política. É o Governo que toma a decisão da maneira como a polícia vai ser empregada”, diz. “Nessa discussão, o nível político é tão ou mais importante.”
Para Fuchs, o erro da polícia está em não conseguir isolar os que utilizam a tática black bloc, por exemplo, e os demais manifestantes. “Quando você tem 12 que estão tentando tumultuar, que isole essas pessoas.”
Em agosto do ano passado, Alckmin sancionou uma lei que proíbe o uso de máscaras em manifestações. A ação era uma tentativa de coibir anônimos nas marchas. A não identificação clara, no entanto, segue sendo, de acordo com os analistas, uma estratégia da polícia: quando o tumulto começa, muitos policiais tiram suas identificações da farda e no uniforme da tropa de choque, os nomes são bordados da mesma cor que a roupa, cinza, e é quase impossível de ler.
As chances de ir a uma manifestação e voltar machucado pelo confronto são tão grandes que em 2013 surgiu um grupo voluntário de pessoas que cuidam dos ferimentos e dão suporte aos manifestantes feridos. O Grupo de Apoio ao Protesto Popular (GAPP) fica na linha de frente das manifestações e presta socorro a quem se intoxica pelas bombas de gás ou se fere com as balas de borracha.
A polícia define sua atuação no metrô, na terça, como “uso moderado dos meios necessários para a manutenção da ordem pública e segurança coletiva”. “A Polícia Militar esclarece que na data de 27/01, ao final do 5º ato contra a tarifa, promovido pelo MPL, ocorreu a quebra da ordem pública na Estação Faria Lima – Linha Amarela – em frente às suas catracas. Manifestantes mascarados, além de impedirem o embarque dos passageiros, dispararam rojões, tacaram (sic) pedras e barras de aço contra o efetivo policial-militar e seguranças do metrô, obrigando o uso moderado dos meios necessários para a manutenção da ordem pública e segurança coletiva”, diz o texto da nota, em resposta aos questionamentos sobre sua forma de agir.
Para Wahl, da FAAP, a repressão policial que ele considera desproporcional pode ser uma estratégia estabelecida pelo Estado para desestimular as manifestações. “Eu acredito que há uma certa desproporcionalidade, mas ao mesmo tempo, o Estado quer evitar que as manifestações deste ano tomem as mesmas proporções que tomaram em 2013”, diz. “Acredito que o cenário está criado e há possibilidades dessas manifestações crescerem”, afirma o professor, referindo-se à falta d’água, apagão elétrico e a economia estagnada.
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Foto: Policial passa a catraca sob fumaça da bomba de gás lacrimogêneo – Foto: J. F. Diorio/Estadão Conteúdo