Sem surpresas. É assim que posso definir o 1º Ato #ContraTarifa, organizado pelo Movimento Passe Livre (MPL) e que tomou as ruas do centro de São Paulo no fim da tarde desta sexta-feira (9). Digo isso por ter feito a cobertura das Jornadas de Junho de 2013. Já naquela época vi as mesmas coisas que vi nesta primeira manifestação desde o aumento da tarifa do transporte público – que subiu de R$ 3,00 para R$ 3,50
Thiago de Araújo – Brasil Post
Para não dizer que não teve mesmo nenhuma, em 2015 as bandeiras de militantes de partidos de esquerda, como PSOL e PSTU, não foram alvo de hostilidades.
A Polícia Militar estimou ao longo do ato um número entre 2,5 mil e 5 mil pessoas presentes. Já o MPL estimou entre 15 mil e 30 mil pessoas. O fato é que, baseado no anúncio do aumento feito (propositadamente) em uma época de férias, o protesto reuniu mais gente do que se esperava.
Ao final, mais de 50 pessoas foram presas, levadas para três Distritos Policiais diferentes da capital paulista, segundo a PM. Para você que não foi e gostaria de sentir como estava o clima, alguns vídeos podem matar a sua curiosidade.
Sim, havia black blocs, em meio a anarcopunks e outros que se recusavam a andar atrás da faixa do MPL. Atrás dela, o clima era bastante pacífico. À frente, havia quem estivesse mais exaltado. Era uma minoria, que tentou ser demovida de criar confusão ainda na Avenida Ipiranda, seguindo o trajeto entre o Theatro Municipal e a Praça do Ciclista, na Avenida Paulista, acordado entre lideranças do MPL e o comando da PM.
Na Rua da Consolação, próximo ao cemitério de mesmo nome, o pequeno grupo mascarado que ia a frente colocou fogo em alguns sacos de lixo e vandalizou algumas lixeiras. Ali foram lançadas as primeiras bombas pela PM, já próximo da Paulista. Esse grupo estava longe da grande maioria pacífica, que segurou a caminhada por alguns minutos. Era uma ação simples da PM: conter aquele grupo e permitir a sequência do ato.
Eu iria escrever ‘infelizmente’, mas acho que a palavra ‘naturalmente’ faz mais sentido para o que veio a seguir. Naturalmente, mostrando a rotineira truculência – bem conhecida na periferia dos grandes centros deste Brasil -, a PM “decidiu” acabar com a manifestação. Lançou bombas de gás lacrimogêneo para cima de quem estivesse na rua, sem discernimento algum.
Considerando a própria tática de ‘envelopamento’ que a corporação adota, uma quebra dos direitos garantidos pela Constituição Federal de acordo com movimentos sociais, a agressividade da PM só exaltou os ânimos, ocasionando diversos atos de vandalismo. Repito: era um grupo pequeno a ser contido. A repressão desproporcional dividiu essa minoria, que então praticou vandalismo nas ruas adjacentes da Consolação e da Paulista.
Só dá para concluir que a PM não aprendeu nada com as Jornadas de Junho, mais precisamente com o dia 13 de junho de 2013, quando pessoas foram ‘averiguadas’ sem acusação – prática dos tempos de ditadura militar -, o coronel responsável disse que “era possível fazer bomba com vinagre” – me foi dito e publicado aqui – e jornalistas foram alvo de balas de borrachas indiscriminadas.
Aliás, muitos colegas de imprensa foram agredidos, seja fisicamente ou verbalmente. Tentativas de registro, mesmo quando nos identificávamos, eram reprimidas com palavras de ordem e empurrões. Eu mesmo quase fui agredido por um PM vestido ao estilo ‘Robocop’. Lamentavelmente, o uso da identificação alfanumérica dificulta a sua identificação.
Em sua defesa, como de praxe, a PM diz que só reagiu a um processo de violência desenfreada. Reclamou ainda que o MPL não enviou representantes a uma reunião na véspera do ato. Para uma corporação que ignorou um encontro mais relevante, uma audiência pública em novembro com coletivos e o Ministério Público, diálogo é algo que só se busca quando lhe convém.
Para não perder a oportunidade, talvez o único aprendizado da PM paulista tenha sido o ‘curioso’ uso do seu Twitter oficial para respostas pitorescas e retweets para elogios.
Em 2013, os atos demoraram a angariar um número tão grande de pessoas nos seus primeiros chamamentos às ruas. Ao contrário do que prega o prefeito Fernando Haddad, a indignação com o aumento não foi apenas parte de um contexto maior. O despreparo da PM só configura um incentivo ainda maior contra as injustiças sociais – como trouxe o jornal O Estado de S. Paulo, mais da metade da população foi sim afetada pelo aumento, e nem para todos migrar para as outras modalidades do Bilhete Único é a resposta.
O próximo ato #ContraTarifa acontece nesta sexta-feira (16), às 17h, com concentração na Praça do Ciclista.
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Foto: Policiais agridem manifestantes do Movimento Passe Livre (MPL) contra o aumento do transporte público em São Paulo (SP), que passou de R$ 3,00 para R$ 3,50 – Leonardo Benassatto, do Futura Press