“Eu vos digo, se eles se calarem, as pedras falarão” (Lc 19,40b).
Regional Norte 3 da CNBB, no Cimi
Nós, Bispos do Regional Norte 3, da CNBB, do Estado do Tocantins, em meio a raros momentos de alegria, encontro, celebração e confraternização, decorrentes dos Primeiros Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, em Palmas – TO, recebemos com surpresa, tristeza e indignação a notícia da aprovação, na Comissão Especial da PEC 215 da Demarcação de Terras Indígenas, que retira do poder Executivo etransfere ao poder Legislativo a exclusividade de demarcar terras indígenas. Lamentamos dizer que esta decisão não faz outro que lançar mais lenha na fogueira, acirrar os ânimos, criar melindres e insegurança jurídica e agravar ainda mais os conflitos entre as comunidades indígenas e os produtores rurais.
Somos conscientes que Jogos Indígenas talvez não sejam a única e nem a mais urgente pauta para os povos indígenas. Mas também somos sabedores que festa, cultura, diversão, divertimento e confraternização fazem bem a qualquer povo, especialmente aos povos indígenas. Estes Jogos são para os povos indígenas o que a copa do mundo de futebol e as olimpíadas são para os outros povos.
Em meio a uma crise generalizada – política, econômica, social, moral e de credibilidade – pela qual passa o Brasil, os nossos Deputados, ao invés de aprovarem leis que ajudem o país a reencontrar o caminho do desenvolvimento, ocupam preciosos tempos para tirar direitos adquiridos, com muita luta, de quem pouco tem seus direitos respeitados.
A aprovação desta PEC 215 se constitui uma grave ameaça contra os povos indígenas, seus direitos, suas terras, suas culturas e suas vidas. Trata-se de “um decreto de morte”, como já denunciavam bispos e missionários no documento “Y Juca Pirama, em 1973”.
Lamentamos que ainda hoje, em pleno século vinte e um, sejam defendidas ações de genocídio e de extermínio de comunidades indígenas por serem considerados empecilhos à implantação de projetos faraônicos, tais como hidrelétricas, agronegócios e tantos outros que como o MATOPIBA que, com certeza trarão graves consequências para o meio-ambiente e para a vida de centenas de comunidades, diretamente atingidas.
Temos aqui em nossa Região a situação de grave ameaça à sobrevivência do povo Avá-Canoeiro, reduzido a 24 pessoas, que sobrevive sem seu território demarcado, como estrangeiro na sua própria terra. E em nível Nacional, a situação do povo Guarani Kaiowá, no Estado do Mato Grosso do Sul. São apenas dois exemplos de situações de extrema violência e de sistemática violação dos direitos humanos fundamentais contra os povos nativos, tradicionais, originários do Brasil.
Como pastores de nossas Igrejas Particulares, nos sentimos comprometidos com o meio-ambiente e a vida dos povos indígenas ameaçados. E como o papa Francisco, diante dos trabalhadores precários e da economia informal, dos migrantes, dos indígenas, dos sem-terra e das pessoas que perderam a sua habitação, “digamos juntos e de coração: nenhuma família sem casa, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhuma pessoa sem a dignidade que o trabalho dá”.
E, por fim, nos propondo ser amplificadores das vozes silenciadas, do sofrimento reprimido e da vida digna destes povos negada. Como profetas da esperança, proclamamos com Jesus: “eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10b).
Em nome da nossa fé e da nossa missão, não podemos ficar calados diante de um dos piores sinais de ofensiva do Estado brasileiro, do poder econômico e político contra os povos indígenas. Não à PEC 215.
Em nome dos 5 bispos do regional da CNBB – Norte 3; Dom Pedro Brito Guimarães- Arcebispo de Palmas; Dom Romualdo Matias Kujawski- Bispo de Porto Nacional; Dom Giovane Pereira de Melo- Bispo de Tocantinópolis; Dom Rodolfo Luís Weber- Bispo da Prelazia de Cristalândia.
Dom Philip Dickmans,
Bispo de Miracema do Tocantins e Presidente do Regional Norte 3 da CNBB.
Palmas, 31 de outubro, mês missionário, de 2015.
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Foto: Reuters