Os moradores das comunidades tradicionais de São Manoel do Pari e de Aguassu Monjolo, localizadas em Nossa Senhora do Livramento (32 km de Cuiabá) compostas principalmente por mulheres, crianças e idosos, vivem uma situação de tensão e preocupação desde o dia 16/09 quando souberam que a que a decisão de reintegração de posse emitida pela juíza da Vara Agrária, Adriana Sant’Anna Coningham, seria executada em qualquer momento
Por Andrés Pasquis – Gias / CPT
O pedido foi pelo advogado Bibiano Pereira Leite Neto em nome de Leônidas Querubim Avelino, que seria, supostamente, o proprietário da área, em agosto de 2007, um ano depois que as famílias começaram os procedimentos para demarcação de suas terras.
Os 1.410 hectares, cerca de 6 mil Km², da área em questão, denominada Sesmaria Pary ou Sesmaria Aguassu, está em nome de Joaquim Mariano do Nascimento. Segundo documentos entregues pelas famílias que moram na área, Joaquim teria comprado essa propriedade em 1925. Em 1950, ele cedeu 100 hectares para cada um dos quatro filhos. Com o passar do tempo, cerca de 15 famílias se formaram e se instalaram, muitas delas, descendentes de Joaquim. Em 1985, Leônidas Querubim Avelino comprou cerca de 400 hectares ao norte da Sesmaria e passou a conviver, tranquilamente, com os moradores descendentes do titular das terras.
Em 2005, a então presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nossa Senhora do Livramento – STR e moradora de São Manoel do Pari, Miguelina de Oliveira Campos, se organizou com os outros habitantes da Sesmaria para regularizar as terras, sem incluir, obviamente, a área pertencente ao professor Leônidas. Por meio de uma solicitação efetuada em 2006 com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Mato Grosso – Fetagri e o Instituto de Terras do Mato Grosso – Intermat, a regularização fundiária das comunidades começou. O processo iniciou dentro do contexto do Projeto Varredura, projeto voltado para atender pequenos produtores rurais através da identificação, demarcação e cadastramento dos imóveis rurais, promovendo a regularização de terras no estado de Mato Grosso.
No entanto, em 2007, o processo de medição foi bloqueado e vários moradores da Sesmaria recebem um mandado de citação para reintegração de posse a pedido do advogado Bibiano Pereira Leite Neto. Ele alega que cerca de 419 hectares das terras que estavam sendo regularizadas são de propriedade do senhor Leônidas Querubim Avelino, que teria 819 hectares, no total.
Antônio Fermino Morães, um dos moradores citados pelo mandado diz não entender a situação, pois afirma que sempre foi de conhecimento de todos que 400 hectares de terra pertenciam a Leônidas. “Ninguém está querendo tirar as terras do Leônidas, essas terras são dele desde os anos 80. Mas as terras que o advogado está reclamando, esses 419 hectares a mais, nunca foram dele. São terras nas quais moramos e cultivamos há mais de três gerações e das quais dependemos há anos, pois lá está nosso roçado e o córrego”, explicou Antônio.
O então juiz titular da Vara Agrária, Pedro Sakamoto, pediu para os órgãos competentes fazerem uma vistoria da área. Em 2012, Adriana Sant’Anna Coningham assumiu a Vara Agrária e, em 2015, emitiu uma ordem de reintegração de posse para os 419 hectares requeridos pelo advogado.
A área em questão, além de ser o lar de várias famílias instaladas há mais de três gerações, abriga 45 hectares de roçado e o rio Monjolo, dos quais depende a sobrevivência dos moradores da Sesmaria.
Palmiro Leo de Campos, outro citado no mandado de reintegração, explica que a produção agroecológica das 12 famílias é o fruto de um trabalho árduo de geração em geração. “Para você viver nestas terras, tem que ter jeitinho. Nós trabalhamos, vivemos e cultivamos respeitando o meio-ambiente, o córrego, a mata, pois sabemos que dependemos deles para produzir nossos alimentos, como banana, mandioca, feijão, maxixe, quiabo, e outros. E agora vamos perder tudo isso? Depois de tantos anos e sem razão?”, indagou Palmiro.
Miguelina de Oliveira Campos, como coordenadora da Associação São Manoel do Pari, está em contato com o STR do município e espera encontrar logo uma solução para essa situação com os órgãos competentes, como o Intermat. “Faz mais de 40 anos que moramos aqui, as outras famílias faz quase um século. Agora, porque em algum momento decidimos regularizar nossas terras para poder acessar o Pronaf, Políticas Públicas, créditos e outros, nos encontramos nesta situação. Estamos muito preocupados e esperamos que o Intermat e a juíza estudem bem os fatos e tomem a decisão justa”, disse a coordenadora.
José Robles Vargas, assessor jurídico da Fetagri que acompanhou o processo e representa as famílias ameaçadas, explica que é imprescindível citar o Intermat para que o Instituto dê continuidade à identificação, demarcação e cadastramento das terras, antes de tomar qualquer decisão. Ele espera conseguir estabelecer um diálogo com a juíza Adriana Sant’Anna Coningham nesta segunda (28) para encontrar uma solução justa ao problema.