Cristina Fontenele – Adital
As atuais políticas públicas não estão respondendo, adequadamente, à realidade do fluxo de migrantes, de acordo com organizações de direitos humanos. Diante da atual crise de refugiados, líderes da União Europeia (UE) se reuniram, em Bruxelas [Bélgica], nesta terça-feira, 22 de setembro, para tentarem um acordo sobre a distribuição dos refugiados entre os Estados-membros. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) faz um apelo aos governantes europeus, destacando que é preciso que se unam em torno de propostas emergenciais para superar as divisões entre os países e criar um compromisso político, que vá além de uma abordagem fragmentada.
“A Europa já não pode se dar o luxo de continuar com essa abordagem fragmentada, que mina os esforços para reconstruir a responsabilidade, solidariedade e confiança entre os Estados, e está criando caos e desespero entre milhares de mulheres, homens e crianças refugiadas”, declarou em comunicado António Guterres, alto comissário do Acnur.
Apesar da UE não ter aceitado, inicialmente, a proposta do Acnur de estabelecer cotas de refugiados por países, os ministros dos 28 Estados-membros do bloco aprovaram, na reunião de Bruxelas, a distribuição de 120 mil refugiados entre os países europeus. Hungria, República Checa, Romênia e Eslováquia se opuseram. Já a Finlândia e a Polônia abstiveram-se. Num primeiro momento, serão distribuídos 66 mil refugiados atualmente alocados na Grécia e na Itália. Os demais 54 mil refugiados terão de aguardar mais algum tempo na Hungria.
O Acnur propõe uma série de medidas para a crise humanitária de refugiados, como a criação imediata de instalações na Grécia, expandindo também as já existentes na Itália, para receber, assistir e identificar os refugiados que chegam pelo mar; a aplicação de um pacote de emergência da UE para que a Sérvia possa assistir, adequadamente, aos refugiados em outros países; o reforço de mecanismos para o retorno humanizado de pessoas que não necessitam de proteção internacional, com o apoio da Frontex [Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas] e da Organização Internacional para Migrações (OIM).
Números
Dados da Acnur revelam que em torno de 60 milhões de pessoas estão deslocadas forçadamente no Mundo, por meio de embarcações precárias que atravessam o Mar Mediterrâneo. A atual crise já soma mais de 440 mil refugiados e migrantes (a maioria sírios), quase 3 mil mortes e em torno de 4 mil pessoas chegando às ilhas gregas diariamente. Os principais países de origem das pessoas que arriscam suas vidas no Mediterrâneo são: Síria, Afeganistão, Iraque, Somália e Eritreia.
Em 2014, a Síria já era o país com o maior número tanto de deslocados internos (7,6 milhões de pessoas) quanto de refugiados (3,88 milhões). Em seguida, o Afeganistão (2,59 milhões de refugiados) e a Somália (1,1 milhão de refugiados).
Um das tragédias recentes, que, por vezes resulta desses traslados perigosos, ocorreu no último dia 15 de setembro, quando 22 pessoas, entre elas quatro crianças, afogaram-se no naufrágio de um barco durante travessia no mar Egeu, da Turquia para a ilha grega de Kos. Outras 211 foram resgatadas.
Legislação
Para as organizações de direitos humanos, burocratizar e restringir a regularização migratória não evita o deslocamento, ao contrário, degrada as condições de vida dos migrantes, que passam a temer as autoridades. As primeiras políticas migratórias foram firmadas com a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados, na Suíça (Genebra), em 1951, que estabeleceu os direitos e obrigações dos países para refugiados europeus, após a Segunda Guerra Mundial, sendo adotada por 147 países.
Com o Protocolo de 1967, o texto se ampliou para os demais deslocamentos que já ocorriam em todo o mundo. Inspirados nesses documentos, surgiram a Convenção sobre os Refugiados na África da OUA (Organização para a Unidade Africana), de 1969, e a Declaração de Cartagena, de 1984, na América Latina.
No Brasil, está em análise a proposta de uma nova Lei de Migrações, o Projeto de Lei do Senado288/2013, que substitui o atual Estatuto do Estrangeiro, foi aprovado no último dia 02 de julho pela Comissão de Relações Exteriores e está em tramitação na Câmara dos Deputados. De autoria do senador Aloysio Nunes Ferreira (Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB – São Paulo), o referido PL cria garantias para o tratamento igualitário dos migrantes que entram no Brasil. “Entende-se por ‘imigrante’ todo estrangeiro que transite, trabalhe ou resida e se estabeleça transitória, temporária ou definitivamente no país”.
Segundo o Acnur, refugiado é uma pessoa que se encontra fora de seu país de nacionalidade ou de residência habitual devido ao temor de perseguição por raça, religião, nacionalidade, pertencente a um determinado grupo social ou de opiniões políticas, que não pode ou não quer recorrer à proteção de seu país ou regressar a ele pelo temor de perseguição. Para estas pessoas, a negação de asilo pode ter consequências mortais.
Diferente dos refugiados, o Acnur conceitua o migrante como aquele que “escolhe” trasladar-se, não por conta de ameaças diretas ou risco de morte, mas pela busca de melhores condições de vida, como outras opções de trabalho ou educação. Para os governos, esta é uma distinção que orientaria a aplicação da legislação e das obrigações pertinentes.
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Foto: De acordo com o Acnur, a atual crise já soma mais de 440 mil refugiados e migrantes