Há um jogo oportunista e míope em torno da crise política, cujo ápice foi a orquestração entre a Folha de S. Paulo, Aécio Neves e colunistas aliados, valendo-se da fragilidade política de Dilma Rousseff para pressionar por mudanças constitucionais que revertam o Estado de bem-estar implementado a partir da Constituição de 1988.
O comentário é de Luis Nassif, jornalista, publicado por Jornal GGN.
Todas as manifestações vieram na direção de desvincular as despesas obrigatórias em educação, saúde e transferências constitucionais como condição para de obter a paz.
Esse tipo de exigência é a comprovação de que a perda de rumo e da sensibilidade política não é prerrogativa de Dilma e do PT, mas também desse conjunto fluido de forças autodenominadas de oposição.
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Momentos pontuais de crise passam a sensação de que o país caminha a reboque da política. Engano!
Há uma linha de evolução política e sociológica que vai muito além desses momentos de crise e à qual terão que se subordinar todos os governos do atual aos futuros.
A inclusão já ocorreu, um vitorioso processo que foi inaugurado com a Constituição de 1988, prossegue com a estabilização econômica e se acelera com as políticas sociais. Abriu-se a caixa de pandora e o gênio da cidadania escapou da garrafa – e não volta mais.
Os pessimistas dirão que a era dos direitos chegou antes da era da competitividade; os que enxergam o país para além das planilhas dirão que as exigências da cidadania é que empurram o país para frente.
A impopularidade do governo Dilma decorre de seus erros, sim, mas especialmente do fato de não ter conseguido proporcionar um horizonte que garantisse a continuidade da ascensão das novas classes.
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Sabia-se desde o início que sua ascensão mudaria radicalmente o cenário, criando uma nova realidade política. Sem o sentido golpista das manifestações subsequentes, as passeatas de junho de 2013 assinalaram o inicio de uma nova era.
Nem Dilma, nem o PT, nem Lula se deram conta da velocidade dessas mudanças, a necessidade de aprofundamento das formas de participação política, a melhoria dos serviços púbicos, a desburocratização.
Se não entenderam, menos ainda a oposição, que se limitou a alianças oportunistas com o rebotalho dos manifestantes, aqueles que exaram preconceitos pelas narinas, e a exercitar diuturnamente o golpismo, jogando fora grandes gestos que, em outros tempos, ajudaram a construir a mística do PSDB, como o partido que não apostava no tanto pior, melhor.
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O que pretendem desmontando o aparato social da Constituinte? Provavelmente conseguirão acelerar o fim do governo Dilma. Mas criarão problemas intransponíveis para qualquer novo governo que se apresente.
Não é por outro motivo que André Lara Rezende, o mais esperto e mais intelectualizado dos economistas do Real, há tempos fixou como prioridade política o atendimento do bem-estar do cidadão. E, como ele, pensa a parte mais preparada do grande empresariado paulista.
O avanço da cidadania é o dado intemporal, em torno do qual as variáveis deverão se acomodar. Em vez de buscar o caos, o momento é de juntar as forças para reverter o aprofundamento da crise.
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PS – O PMDB majoritário, de Michel Temer, não está em vias de pular do barco. Dilma terá que piorar um pouco mais para que pulem do barco.