Emenda de deputado mineiro pega carona em medida provisória relativa à Amazônia e tenta reduzir a área do parque criado para proteger nascente do Rio São Francisco
Valquiria Lopes
Uma batalha travada em torno de um santuário ambiental em Minas, rico em flora e fauna, mas também em jazidas minerais. Abrigo de espécies em extinção, berçário de vários cursos d’água, o mais importante deles o Rio São Francisco, e importante área do cerrado, o Parque Nacional da Serra Canastra pode ter limites fixados em 71,5 mil hectares, contra os 200 mil originais, um redução de 64%. O alerta parte de representantes do Instituto Chico Mendes (ICMBio) – autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente – e do Ministério Público Federal (MPF), e se refere à Emenda 14 apresentada à Medida Provisória 542/2011, em tramitação na Câmara dos Deputados. A MP editada pela presidente Dilma Rousseff (PT) trata de alterações em unidades de conservação na Amazônia, para projetos hidrelétricos e de assentamento, mas o deputado Odair Cunha (PT-MG) tenta acrescentar texto que fixa a área do Parque da Canastra em 71,5 mil hectares, sob o argumento de que se trata de proposta para regularizar a situação de produtores rurais que vivem na região.
O parlamentar defende que a emenda não propõe diminuição de áreas de preservação, argumentando que o plano de manejo da unidade, feito em 1974, instituiu a área real do parque em 71,5 mil hectares. “O Decreto 70.355, de 3 de abril de 1972, de criação do parque, estabelece no artigo 1º a área de 200 mil hectares, mas, no artigo 4º, dá ao órgão ambiental da época, o Instituto Brasileiro de Defesa Florestal (IBDF), o poder de definir as áreas com potencial agriculturável. Dois anos mais tarde, em 1974, o plano de manejo foi feito, fixando a área em 71,5 mil hectares”, alega.
Contrariando a defesa do parlamentar, a procuradora da República em Passos, no Sul de Minas, Ludmila Oliveira, afirma que a extensão total do parque é realmente de 200 mil hectares e que os 71,5 mil hectares referem-se apenas à área já desapropriada. Para ela, a emenda é inadequada e põe em risco uma reserva até então preservada. “O caráter emergencial da medida provisória não permite discussão necessária para uma alteração desse porte. Além disso, já há outros projetos de lei na Câmara que tratam do tema. As MPs são para assuntos urgentes e não há urgência para o caso da Canastra”, defende. Ainda de acordo com a procuradora, interesses econômicos podem estar por trás da tentativa de alteração, tendo em vista que a unidade de conservação tem grandes áreas com jazidas de quartzito e diamantes, além da agricultura e pecuária.
“São interesses passíveis de compatibilização com a preservação ambiental. Há projetos que retiram pequenas áreas do parque para essa finalidade. O que é urgente, nesse casos, é a regularização das áreas e não a diminuição dos limites da unidade de conservação”, defende a representante do MP, lembrando ainda que o Brasil é signatário de tratados internacionais nos quais se compromete com a preservação de sistemas de relevância ambiental. Apesar de não ser possível intervir na tramitação da matéria no Legislativo, a procuradora disse que é preciso atuar na sensibilização dos parlamentares para rejeitar a proposta, que tem prazo para ser votada no Congresso até 12 de dezembro. A partir desta semana, a medida provisória já está trancando a pauta na Câmara. Na própria Casa, a bancada do Partido Verde (PV) se manifestou contra a emenda, alegando que o texto foi anexado à medida provisória sem nenhum estudo de viabilidade e sem consulta pública.
IMPENSÁVEL – Ao comentar a iniciativa do parlamentar, o presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Rômulo Mello, disse que “fazer emendas reduzindo a área de parques sem estudos técnicos é impensável, é uma atitude que pode trazer mais problemas à conservação do meio ambiente”. Ele lembrou que as alterações nos limites dos parques nacionais da Amazônia, dos Campos Amazônicos e do Mapinguari, previstas no texto original da medida provisória, foram analisadas cuidadosamente, e que somente depois disso receberam o aval do ICMBio. “Nesse caso, as unidades que perderam partes de sua área ganharam outras”, diz.
Para o chefe do Parque Nacional da Serra da Canastra, Darlan de Pádua, o que o deputado deveria fazer era buscar recursos para completar a indenização referente aos outros 130 mil hectares da unidade de conservação, concluindo, assim, a regularização fundiária do parque, em vez de propor sua redução.
Enviada por José Carlos.