Indianas se submetem à escravidão para pagar dote do casamento

Jovens enfrentam jornadas de trabalho intermináveis e condições precárias na indústria têxtil para ganhar entre € 400 e € 800 após 3 anos. De 10% a 20% dessas meninas têm entre 12 e 14 anos quando são contratadas pelas fábricas
REDAÇÃO ÉPOCA, COM AGÊNCIA EFE

O dote no casamento indiano tem levado milhares de jovens indianas a se submeterem a regimes de escravidão em empresas têxteis, aponta um relatório elaborado pelo Centro de Pesquisa de Empresas Multinacionais (Somo, na sigla em holandês) em colaboração com o Comitê da Holanda para a Índia (ICN). A promessa de que, ao término de três anos de trabalho, as jovens receberão o equivalente a cerca de € 500 atrai cada vez mais garotas.

Na Índia, o casamento é uma tradição cultural bastante forte, e o costume do dote diz que é a mulher quem deve pagá-lo ao marido. A maioria das jovens da pesquisa pertence à casta dos dalits, a mais baixa e pobre, e são recrutadas sob um sistema conhecido como “Sumangali” – palavra tâmil para se referir a uma mulher feliz no casamento e que vive com seu marido uma vida abençoada e plena, algo que está relacionado com o pagamento do dote. 

O relatório “Presas pelo algodão” aponta que os fabricantes indianos vêm produzindo artigos têxteis no estado de Tamil Nadu, no sul da Índia, para importantes marcas estrangeiras como Bestseller, Diesel, Gap, Inditex (Zara), El Corte Inglés e Cortefiel. Embora algumas destas companhias tenham tomado “uma atitude no assunto”, um grande número de “práticas abusivas continuam sendo adotadas”, aponta o estudo.

As meninas ‘sumangali’ são recrutadas com a promessa de um salário decente e um alojamento confortável, além do incentivo de receberem uma soma de dinheiro após a finalização do período de trabalho que varia entre € 400 e € 800.

Mais de 120 mil mulheres teriam sido empregadas desta forma nos últimos dez anos, segundo a Somo. Para “evitar que se organizem e queiram lutar por seus direitos”, os postos de trabalho costumam ser temporários, e entre 10% e 20% dessas mulheres têm entre 12 e 14 anos quando são contratadas.

“As mulheres recebem a promessa de que terão boas condições de trabalho e alojamento, algo que não acontece porque trabalham demais e são confinadas durante o tempo restante em um centro de hospedagem”, afirmou a ativista indiana Pallvi Mansingh.

Monika, uma dessas jovens, tinha 13 anos quando começou a trabalhar. “Ninguém vai trabalhar lá porque quer, algumas fazem porque os pais obrigam e outras pelas necessidades familiares”, disse à Somo.

“Nas raras ocasiões em que têm permissão para sair, sempre vão acompanhadas, sem poder falar com ninguém de fora da empresa”, disse Mansingh, que é também diretora do Centro para a Educação e a Comunicação em Nova Délhi. “Seu único contato verbal com o exterior são as visitas, esporádicas, de seus pais”.

Outra jovem, Prithi, de 19 anos, também denunciou as condições deploráveis à organização holandesa. “Completei os três anos e me deram 30 mil rúpias (aproximadamente € 450). Quando terminei, estava muito doente e ao descobrir que tinha uma bola de algodão no estômago – por inalá-lo durante o trabalho – tive que ser operada”, afirmou. “Gastei todo o dinheiro que tinha nas despesas médicas e meus pais tiveram que cancelar meu casamento por não poderem pagar o dote”.

http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI240654-15228,00.html

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