Quem são os muitos Daniel Bellik? [Carta dos Munduruku]

Via Xingu Vivo

Em dezembro de 2013, o antropólogo Daniel Bellik esteve na etapa intensiva do Projeto Ibaorebu, na aldeia Sai-Cinza. Na época, ele trabalhava na Funai e estava acompanhando uma equipe de consultores, mas não fazia parte do Projeto. O supracitado entrava na sala de aula, mas não explicou a sua participação e o que pretendia fazer ali durante a sua permanência, não explicou que tipo de trabalho ou pesquisa estava querendo realizar. Durante a sua participação, apenas registrava fotos na sala e anotava os comentários dos estudantes. Os cursistas ficaram desconfiados e isso os fez questionar a respeito dele e deixaram claro que ele não tinha autorização para tirar as fotos e nem fazer anotações. 

Em 2014, na aldeia Caroçal do Rio das Tropas, ele se apresentou como professor que participa do projeto Ibaorebu e causou estranhamento aos alunos que cursam esse projeto e moram na Aldeia Caroçal, pois todos sabem que ele nunca fez parte da equipe de professores do Ibaorebu.

Durante assembléia do “Movimento Munduruku” no rio Cururu, em abril de 2014, o mesmo chegou com a FUNAI e para esta estava trabalhando. Fato estranho, pois assim nunca sabemos ao certo quem ele era, se professor, se pesquisador ou funcionário da FUNAI. Assim, ninguém está disposto a contribuir com o mesmo para dar continuidade ao seu trabalho, seja qual for.

No inicio do ano de 2015, Daniel esteve na aldeia Katõ, no rio Cabitutu, de onde também foi expulso, e em consulta aos Munduruku daquela aldeia estes afirmaram que não permitiram ao mesmo fazer pesquisas sobre Munduruku e disseram que não querem pesquisador na aldeia. E pediram que o mesmo se retirasse daquele lugar.

Na etapa do curso Ibaorebu, em novembro de 2014, que foi realizado na aldeia Sai-Cinza, novamente estava presente o Daniel, sem ser convidado, e como é de se ver, não era bem vindo junto com o Pierre, Francês, outro pesquisador. Os alunos do Ibaorebu não deram permissão para ele estar presente naquela ocasião. Foi forçado a se retirar imediatamente. Tentou se explicar em meio ao alvoroço, mas os alunos junto com a comunidade estavam impaciente com a situação e o expulsaram outra vez.

Pelo que sabemos através de parentes que estão nas nossas aldeias, o mesmo afirma ter uma autorização da Coordenação Regional da Funai para entrar na área indígena, mas sabemos que a Funai apenas autoriza a pesquisa se a comunidade concordar. Reafirmamos que são os Munduruku os guardiões do seu território, e a estes se deve o respeito, a estes se deve pedir autorização como em qualquer pesquisa séria e ética.

Por fim, na última assembléia do povo Munduruku, finalmente o Sr. Daniel foi tentar explicar o que estava tentando fazer nas aldeias, momento em que os Munduruku rejeitaram sua proposta e o expulsaram e decidiram que não queriam qualquer pesquisador em seu território. Os Munduruku já deram seu posicionamento que nenhum intitulado “pesquisador” tem autorização para entrar no território Munduruku.

Estão apreensivos por causa dos planos do governo federal de construir o Complexo Tapajós. Sabemos que é grande o interesse das empreiteiras nessa obra. Nesse momento tenso não sabemos quem são as pessoas que chegam aos Munduruku.

Toda e qualquer informação coletada sobre nós, não poderá virar dados de pesquisas que interessam ao empreendimento ou simples carreirismo acadêmico. Alguém usando indevidamente o nosso nome, nossa história, nossa cultura, esse alguém responderá pelos seus próprios atos e será responsabilizado por suas ações.

Alguma providencia deve ser tomada em relação a esta situação por quem tenha a competência pra fazer. A universidade não poderá acobertar pesquisas sem autorização do povo Munduruku. É nossa vida, é a nossa cultura, é a nossa existência como povo que está em jogo, e vamos lutar por isso em todos os espaços inclusive na academia.

Nós estamos em pé de guerra “a luta pela defesa de nosso Direito e Território” não é com arco e flecha. O momento é propicio para a guerra, para conseguirmos cabeças como grandes troféus valiosos, e estes produzirão poderes mágicos para o combate. Sabemos que a batalha é sangrenta quando travada. Pra nós não seria o motivo de triunfo se ganharmos ou se perdermos. Se perdermos lutando será um orgulho pra nós, e mesmo assim nosso memorial estará escrito na historia, sendo contada às outras gerações nossa política da bravura de um povo que defende a natureza de diversas formas de vida existente na terra. Ainda estamos aqui e como sempre existimos! Não havendo mais nada a fazer a esse respeito: à guerra! Ela é o último recurso. Saweee!!!”

MOVIMENTO MUNDURUKU

ASSOCIAÇÃO INDÍGENA PUSURU

ASSOCIAÇÃO INDÍGENA PAHYHY’P

ESTUDANTES INDÍGENAS MUNDURUKU

Direito de resposta concedido a Daniel Belik em 18/05/2015: Carta ao Povo Munduruku

 

Comments (1)

  1. Só o último parágrafo da carta desperta no pesquisador tamanha vontade de conhecer esse ethos guerreiro que parece superar qualquer risco. Evans Pritchard que me desculpe, mas Os Nuer é para os fracos…

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