“… a presente carta pretende também denunciar a ilegitimidade deste “projeto de morte”, promovido pela mineradora SAM – Sul Americana de Metais SA – controlada pela Honbridge Holdings Ltd., de capital chinês, no Norte de Minas Gerais. O processo de licenciamento que está em fase de estudos pelo IBAMA não tem legitimidade, pois não respeitou os marcos legais relacionados aos direitos de Povos e Comunidades Tradicionais, uma vez que não foi promovido, antes da elaboração do projeto, o direito à consulta prévia e informada, conforme está previsto na Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho.”
Projeto de mineroduto da SAM é declaração de guerra dos Chineses contra as Comunidades Tradicionais Geraizeiras e Quilombolas que lutam pela preservação das águas e dos Cerrados
Excelentíssimos(as):
Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, (Ministério Público Federal – 6ª Câmara de Coordenação e Revisão – Populações Indígenas e Tradicionais); Tereza Helena Gabrielli Barreto Campello (Ministra de Estado do Desenvolvimento Social e Combate à Fome); Patrus Ananias de Sousa (Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário); Izabella Mônica Vieira Teixeira (Ministra de Estado do Meio Ambiente); Volney Zanardi Júnior (Presidente do IBAMA).
Os membros, abaixo assinados(as), da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, da Articulação Rosalino de Povos e Comunidades Tradicionais; e do Movimento Geraizeiro vêm, por meio deste, notificar o IBAMA para que suspenda de imediato o processo de licenciamento ambiental do Projeto Vale do Rio Pardo, que prevê a instalação de um projeto de mineração associado com a construção de um mineroduto passando por 21 municípios do Norte de Minas Gerais e Bahia. Além disso, a presente carta pretende também denunciar a ilegitimidade deste “projeto de morte”, promovido pela mineradora SAM – Sul Americana de Metais SA – controlada pela Honbridge Holdings Ltd., de capital chinês, no Norte de Minas Gerais. O processo de licenciamento que está em fase de estudos pelo IBAMA não tem legitimidade, pois não respeitou os marcos legais relacionados aos direitos de Povos e Comunidades Tradicionais, uma vez que não foi promovido, antes da elaboração do projeto, o direito à consulta prévia e informada, conforme está previsto na Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho.
A implantação deste projeto viola o direito de comunidades geraizeiras e quilombolas que vivem centenariamente na região do Vale das Cancelas e também de outras centenas de comunidades tradicionais dos vales dos rios Jequitinhonha, Pardo e das Contas, por onde está previsto passar o mineroduto, afetando inclusive as comunidades ribeirinhas e marinhas. A região de execução do projeto está inserida no semiárido de Minas Gerais, com uma rica biodiversidade associada aos Cerrados da Serra do Espinhaço, já impactados de forma significativa com a implantação das monoculturas de eucalipto nas décadas de 1980 e 1990. Grandes projetos que já provocaram expropriação territorial das comunidades tradicionais, impactos na flora e fauna regionais e, de forma ainda mais grave, impactos sobre os escassos recursos hídricos superficiais e subterrâneos.
As comunidades afetadas por estes projetos contam uma longa história de exclusão e de invisibilidade social apesar de terem como legado agroecossistemas que foram desenvolvidos ao longo do tempo e que viabilizaram o sustento dos mercados locais, regionais e mesmo nacional. Estas comunidades são possuidoras de um conhecimento profundo dos ecossistemas locais e suas estratégias produtivas contribuem para a proteção e mesmo a ampliação da (agro)biodiversidade e recarga dos aquíferos.
O Projeto Vale do Rio Pardo está provocando o aumento da tensão social, as comunidades encontram-se extremamente vulnerabilizadas, e a sua execução vai ampliar a escassez hídrica da região. As características do projeto de mineração a céu aberto, exploração de minério com baixo teor, beneficiamento para concentração do minério, transporte através de mineroduto, para ser executado precisa de uma elevada demanda de água – 6.200 m3/hora, o que significa uma demanda anual de 53.568.000 m3/ano. Demanda excessiva em uma região de extrema escassez hídrica com um projeto que, além disso, vai provocar o secamento de nascentes e córregos da região da bacia do rio Vacaria, onde a população atual encontra-se vivenciando um conjunto significativo de conflitos territoriais e ambientais.
Em Janeiro de 2014, houve uma audiência pública de licenciamento do complexo minerário e mineroduto, puxada pelo IBAMA, quando foram apresentados os resultados do EIA/RIMA da SAM. Nesses estudos, foram olvidadas as comunidades geraizeiras e quilombolas que ocupam tradicionalmente a região de instalação do complexo minerário, notadamente o Vale das Cancelas, bem como todas as comunidades tradicionais do entorno e na rota do mineroduto. Muitas ponderações e denúncias de violação de direitos foram então feitas e protocoladas no processo de licenciamento, sem nenhuma providência por parte do IBAMA.
Aos 5 dias de Fevereiro de 2015, houve nova audiência coordenada pelo IBAMA para formalizar a atualização do EIA/RIMA da SAM. Essa atualização é quase um novo projeto que amplia a a área diretamente afetada e aumenta a exploração do minério em 26 % do total apresentado anteriormente, de 25 milhões de tonelada/ano para 27 milhões de tonelada/ano. Além de novamente não considerar o cerrado e as comunidades tradicionais atingidas, violando sobremaneira direitos humanos e ambientais.
É neste contexto que está sendo processado o licenciamento do Projeto Vale do Rio Pardo e, recentemente, o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB e lideranças geraizeiras denunciaram o modo como o IBAMA vem conduzindo o processo, levantando suspeitas de facilitação de interesses da empresa:
Causa-nos espanto e perplexidade, o modo com que vêm servidores do Alto Escalão do Governo Federal, através do IBAMA, conduzindo o processo de licenciamento, descumprindo normas, o que nos leva a concluir que há suspeitas de prevaricação e facilitação dos interesses da empresa.[1]
Reiteramos assim que o processo de licenciamento do Projeto Vale do Rio Pardo seja imediatamente suspenso.
Montes Claros, 09 de fevereiro de 2015.
Assinam esta carta:
- BRAULINO CAETANO DOS SANTOS – Diretor Geral do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas – CAA/NM e Representante do povo Geraizeiro na CNPCT – Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais;
- VALDIVINO RODRIGUES GOUVEIA – Representante do Movimento Geraizeiro;
- ADERVAL COSTA FILHO – “Programa Mapeamento de Povos e Comunidades Tradicionais em Minas Gerais: Visibilização e Inclusão Sociopolítica”, do GESTA – FAFICH/UFMG e do CIDADE e ALTERIDADE – Faculdade de Direito/MPMG;
- JOAQUIM CORREA DE SOUZA BELO – Representante do Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS;
- CLÁUDIA REGINA SALA DE PINHO – Representante da Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras;
- VALDIVINO RODRIGUES DE SOUZA – Coordenação Estadual de Fundo de Pasto;
- Povo Indígena Xakriabá;
- Vazanteiros em Movimento.
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[1] In: NOTICIA DE SUSPEITAS DE IRREGULARIDADES NO PROCESSO DE LICENCIAMENTO E CONDUTAS ANTIJURÍDICAS DE SERVIDORES DO IBAMA EM CONLUIO COM FUNCIONÁRIOS DA SAM – 30 de janeiro de 2015 – encaminhado pelo MAB à [email protected] e [email protected].
Enviada para Combate Racismo Ambiental por Carlos Dayrell.
Boa Tarde!
Quem tem dinheiro pode tudo isso e normal no Brasil…………………..