Imigrantes convivem com lixo e mau cheiro em abrigo no Acre

Abrigos no Acre estão lotados de imigrantes, a maioria haitianos, mas também há africanos

Fábio Pontes
Da BBC Brasil, em Brasileia (AC)

Não há mais espaço para colocar colchões no galpão que abriga imigrantes haitianos e africanos, sob um calor de 40ºC em Brasileia, no Acre. Tendas estão sendo instaladas do lado de fora, onde os ‘moradores temporários’ costumam fazer suas necessidades –devido à falta de banheiros. A água, os dejetos e o lixo se misturam formando um esgoto a céu aberto.

O aumento do fluxo de imigrantes para o Acre nos últimos 30 dias fez com que um abrigo de 200 vagas virasse moradia para um número de pessoas que varia entre 1.100 e 1.300. O governador Tião Viana declarou estado de emergência.

A maioria dos imigrantes são haitianos, mas também há cerca de 70 senegaleses, 10 dominicanos e alguns cidadãos da Nigéria e de Bangladesh. De acordo com o governo local, 2.700 imigrantes cruzaram a fronteira neste ano. Cerca de 1.600 deles foram encaminhados pelas autoridades para postos de trabalho em outros Estados brasileiros, mas o restante permanece no abrigo.

Colchões e as bagagens se espalham em cada metro quadrado do galpão que já foi sede de um clube de futebol local e hoje funciona como abrigo. “Nós até possuímos mais colchões, mas não há espaço para colocar”, disse à BBC Brasil o secretário de Justiça e Direitos Humanos, Nilson Mourão.

A água potável é colocada numa caixa d’água transformada em bebedouro. Cerca de 500 litros são consumidos diariamente. No amplo terreno são estendidos varais para colocar as roupas. Um pouco mais longe, quase na calçada, os sacos de lixo se acumulam.

Segundo informações da direção do hospital de Brasileia, há quatro casos de Aids confirmado entre os imigrantes e 20 mulheres grávidas.

A população de Brasileia começa a se impacientar com a presença dos estrangeiros e a pedir providências. Eles reclamam que a falta de banheiros leva os imigrantes a fazerem suas necessidades em qualquer lugar.

Em um quiosque de um parque usado para caminhadas e atividades esportivas o mau odor é insuportável. Com medo, a comunidade deixou de usar o parque. Sem opções do que fazer, os estrangeiros passam o dia a perambular pelas ruas e praças das duas cidades. Os moradores agora evitam deixar mulheres e filhas andar sozinhas pela cidade.

O bancário aposentado Eli Freitas mora atrás do abrigo e se queixa da situação. ”Minha família pode estar aqui fora, minha mulher, minhas crianças, que eles usam isso aqui (apontando para um terreno baldio), como se estivessem num banheiro público. Amanhã, quem mora nas imediações, pode adoecer, com certeza”, afirma.

População de Brasileia começa a se impacientar com a presença de estrangeiros e pedir providência

Rota

O governo acreano e a Polícia Federal passam a investigar a atuação de quadrilhas de traficantes de pessoas na região. Acredita-se que tenha sido a atuação dessas quadrilhas de traficantes de seres humanos que incentivou a chegada de imigrantes.

A rota para se chegar ao Brasil é extenuante. O caminho usado pelos imigrantes haitianos tem início ainda na capital do Haiti, Porto Príncipe. De lá, eles voam para o Panamá e então para o Equador, onde completam a jornada por terra, com destino ao Peru ou à Bolívia, de onde partem em direção à fronteira do Acre.

Já a jornada dos imigrantes africanos e asiáticos é ainda mais árdua. Os africanos partem ou do Senegal ou do Marrocos e seguem para a Espanha. De lá rumam para o Equador e completam a jornada realizando um trajeto semelhante ao dos haitianos. Muitos chegam a pagar mais de R$ 3.000 aos chamados coiotes.

Força-tarefa

Nos últimos anos, o Brasil já recebeu cerca de 6.000 haitianos. Por emigrarem por motivos econômicos, o Comitê Nacional para os Refugiados do Ministério da Justiça (Conare) entende que eles não têm direito a receber o status de refugiados. Na maioria dos casos, porém, esses estrangeiros recebem um visto para residir e trabalhar no Brasil por razões humanitárias, o que lhes permite refazer a vida no país.

Alarmado pelos apelos do Acre, na quarta-feira o Ministério da Justiça anunciou a criação de uma força-tarefa para agilizar a concessão de vistos temporários para esses imigrantes e a emissão de carteiras de trabalho.

”O Ministério da Justiça e o Ministério do Trabalho vão fazer um mutirão, tanto da Polícia Federal quanto de agentes do Ministério do Trabalho, para que nós consigamos emitir protocolos que autorizem esses haitianos a terem visto no Brasil e ao mesmo tempo se possa emitir carteira de trabalho, para que eles possam trabalhar”, disse, em entrevista, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

”Nós estamos discutindo medidas que coíbam essa situação de entrada ilegal no Brasil incentivada por coiotes, organizações criminosas que se valem da miséria e do desespero de haitianos pra conseguir colocá-los ilegalmente dentro do país. E a melhor maneira de fazer isto é ampliar a possibilidade de que legalmente haitianos entrem no Brasil”.

Enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.

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