Censo revela a diversidade das 305 etnias indígenas brasileiras

Maurício Thuswohl

A rica e complexa diversidade étnica, cultural e linguística dos povos indígenas que habitam o Brasil sempre atraiu a curiosidade de cientistas e estudiosos no país e no exterior, inclusive na Suíça. No entanto, apesar dos estudos que vêm sendo publicados em vários idiomas desde o Século XIX, jamais houve uma planificação estatística concreta e organizada sobre os índios brasileiros. Essa realidade mudou desde que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou, no início de agosto, os resultados do Censo da População Indígena realizado em todo o país ao longo do ano de 2010.

Segundo a pesquisa inédita, vivem hoje no Brasil 896,9 mil índios, divididos em 305 etnias que falam 274 línguas. O número supera o que até aqui vinha sendo comumente trabalhado pela literatura acadêmica nas universidades (em torno de 220 etnias e 180 línguas) e já coloca aos antropólogos e cientistas em geral o desafio de interpretar as informações colhidas pelo censo.

No recenseamento feito há dois anos, o IBGE avaliou os quesitos raça, cor, etnia, tradições, línguas faladas no domicílio e localização geográfica. Graças à metodologia adotada, a pesquisa é considerada a mais completa e abrangente já feita sobre a população indígena brasileira, pois, nos dois recenseamentos anteriores, realizados em 1991 e 2000, foram avaliados somente os quesitos raça e cor.

No censo mais recente, 817,9 mil pessoas se identificaram ou foram identificadas como indígenas pelos quesitos raça ou cor, enquanto 78,9 mil pessoas se identificaram ou foram identificadas como tal pelos outros quesitos. No segundo grupo, a grande maioria se identificou ou foi identificada como indígena por residir em Terras Indígenas (TI) oficialmente demarcadas. Desse total, 63,8% vive em área rural e 36,2% em área urbana.

Realizado em parceria com a Fundação Nacional do Índio (Funai), o censo revela ainda a existência de 505 TIs no Brasil. Elas ocupam uma área total de 106,7 milhões de hectares, o equivalente a 12,5% do território brasileiro. Nas TIs, segundo o IBGE, vivem 517,4 mil índios (o que representa 57,7% do universo total de pessoas identificadas pela pesquisa).

Entre os indígenas com mais de cinco anos de idade, 37,4% afirmaram falar pelo menos uma língua indígena. Essa parcela sobe para 57,3% se forem considerados apenas os índios que habitam as TIs. Não falam a língua portuguesa 23,1% dos indígenas que vivem no Brasil.

A mais numerosa etnia indígena brasileira, segundo o Censo da População Indígena 2010, é a Tikuna, que vive na Amazônia, às margens do Rio Solimões. Mesmo com o elevado número de indivíduos mortos nas últimas décadas _ sobretudo em decorrência de conflitos com posseiros e seringueiros _ os Tikuna ainda somam 46.045 índios que vivem nas florestas ou em grandes cidades do Estado do Amazonas, como a capital Manaus ou Tabatinga, entre outras.

Entre os que habitam exclusivamente dentro de Terras Indígenas, a maior população indígena brasileira registrada pelo trabalho dos pesquisadores é a ianomâmi, que vive espalhada pelas florestas do Amazonas e de Roraima. Os ianomâmis, segundo o IBGE, somam hoje 25,7 mil pessoas.

Ianomâmis e Suíça

Os ianomâmis também são hoje o maior símbolo da relação entre a sociedade civil suíça e os povos indígenas brasileiros. Do coração da Amazônia, onde vive, essa etnia mantém uma “ligação direta” com a Suíça que passa por uma casa na pacata comuna de Onex (cantão de Genebra), onde fica a sede da associação Appui aux Indiens Yanomami d’Amazonie (AYA, na sigla em francês).

Há cinco anos, a organização não-governamental suíça trabalha com uma parceira brasileira, a Secoya (Serviço de Cooperação com o Povo Yanomami), no desenvolvimento de projetos nas áreas de saúde e educação: “Com fundos próprios, a AYA subvencionou numerosas atividades de sua parceira”, afirma o suíço Bernard Comoli. Ele é responsável pela edição do Boletim AYA, fruto do compromisso da organização suíça com a difusão de notícias concernentes aos ianomâmis e demais povos da Amazônia brasileira.

Projetos

Nesses cinco anos, com o apoio da comuna de Onex, a AYA ajudou a Secoya a construir dois centros de saúde dentro da TI ianomâmi. Em 2010, a comuna de Meyrin (também em Genebra) ajudou as parceiras suíça e brasileira a realizarem um programa de “formação e consolidação das competências e do processo organizacional dos líderes indígenas”.

No projeto mais recente, realizado desde o ano passado, o governo da cidade de Genebra (Ville de Genève) apóia um projeto de formação de lideranças e de agentes de saúde indígenas para atuarem na região do Rio Marauiá: “A formação é um elemento necessário para permitir que essas comunidades indígenas tenham mais poder sobre o seu próprio destino”, diz Comoli.

Em seu último boletim (número 74), publicado em 25 de agosto, a AYA aborda temas como a divulgação do relatório elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) sobre a violência contra povos indígenas em 2011 e a decisão da Justiça brasileira de suspender as obras de construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, que afetará dezenas de tribos que vivem às margens do Rio Xingu.

Editor do boletim, Comoli, que mantém um blog no sítio do jornal La Tribune de Genève, traz aos leitores suíços informações como a íntegra da decisão do Tribunal Regional Federal que determina a suspensão das obras de Belo Monte e também o recurso contrário a essa decisão apresentado pela Advocacia Geral da União (AGU), em nome do governo brasileiro: “Divulgar na Suíça o que acontece com os povos indígenas brasileiros é uma das missões da AYA”, diz o ativista suíço.

http://correiodobrasil.com.br/censo-revela-a-diversidade-das-305-etnias-indigenas-brasileiras/509251/#.UEDLH9ZlSQx

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