Lei protege terreno de quilombolas na Lagoa

Um morador com o filho na comunidade da Sacopã, que agora se tornou área de especial interesse cultural Domingos Peixoto / O Globo

Vereadores derrubam veto de Eduardo Paes, e o lugar se torna área de especial interesse cultural

Antônio Werneck

RIO – A comunidade quilombola da Sacopã — que ocupa um terreno de seis mil metros quadrados no alto da Fonte da Saudade, na Lagoa — acaba de se tornar uma área de especial interesse cultural com a aprovação de um projeto de lei na Câmara dos Vereadores. A iniciativa, que chegou a ser vetada pelo prefeito Eduardo Paes há três meses, acabou aprovada depois que o Legislativo derrubou o veto de Paes. A nova lei abre caminho para a legalização fundiária da área pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), como querem seus moradores, e também para o retorno de uma tradicional roda de samba que acontecia há mais de quatro décadas no local. Oito famílias de descendentes de escravos vivem naquela área.

Feijoada atraía artistas

A comunidade da Sacopã ficou conhecida na Zona Sul a partir dos anos 60, quando seus moradores, liderados por Manoel Pinto (já falecido), passaram a reunir bambas do samba carioca numa tradicional feijoada familiar. A roda ganhou fama e virou atração turística, levando ao lugar vários artistas. Andaram por ali João Nogueira, Zeca Pagodinho, Beth Carvalho, Dona Ivone Lara e Arlindo Cruz. Hans Donner, o papa do design da TV Globo, era assíduo frequentador.

O projeto de lei foi aprovado há três meses. Apenas dois vereadores, dos 51 da Câmara do Rio, votaram contra. Encaminhado para sanção do prefeito, o projeto foi vetado e voltou à Casa. Esta semana, depois de intenso debate, o veto de Eduardo Paes foi derrubado por 28 votos contra cinco. Grande conhecedor da história do samba carioca, o jornalista e escritor Sérgio Cabral, pai do governador do Rio, defende a comunidade quilombola:

— Sei que muita gente do samba frequentou o lugar. Eu mesmo fui nas décadas de 70 e 80, mas não lembro agora de muita história para contar. Torço por ela (pela lei). A tradição precisa ser mantida ali — afirmou o jornalista e escritor.

A decisão de quinta-feira foi comemorada pelos moradores da comunidade quilombola.

— Procuramos o prefeito para explicar a necessidade de a lei ser sancionada, mas não adiantou. A decisão da Câmara agora é uma vitória. Queremos paz e tranquilidade. Não queremos conflito com os vizinhos — disse o músico Luiz Pinto, conhecido como Luiz Sacopã.

Ele lidera os moradores da comunidade e é filho de Manoel Pinto, que foi morar ali com a mulher e os filhos na década de 20. A área ocupada é o centro de um conflito. Representantes de condomínios vizinhos movem uma ação contra os moradores do lugar e conseguiram há seis meses uma liminar na Justiça proibindo a realização das rodas de samba. O antropólogo Fábio Reis Mota, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e estudioso do assunto, confirma que a família Pinto se estabeleceu na Lagoa nos anos 20. Manoel Pinto chegou ao bairro com o propósito de trabalhar nas obras de abertura da Rua Sacopã.

— Quando ele chegou, era o início da expansão da cidade para essa área, que era quase desabitada e veio a se tornar um dos bairros com o metro quadrado mais caro do Brasil — disse Fábio Mota.

No ano passado, depois de ser levada por um amigo para conhecer a comunidade quilombola da Sacopã, a atriz e apresentadora da TV Globo Regina Casé resolveu comemorar o aniversário com sua família e amigos no local.

— Fico feliz com esse reconhecimento. Muito da história do Rio foi escrito nesses quilombos. Comemorei meu aniversário lá no ano passado. Levei Zeca (Pagodinho), Arlindo (Cruz), Caetano (Veloso) e todos ficaram encantados. Acho que vai ser um grande ganho para a vida cultural da cidade. Viva! — festejou Regina Casé.

http://oglobo.globo.com/rio/lei-protege-terreno-de-quilombolas-na-lagoa-5814837#ixzz23mCCss00

Enviada por Leticia Osorio para a lista adin-quilombolas.

Comments (1)

  1. A comunidade quilombola do Sacopã, esta de parabéns. Os valores que a sociedade comtenporanea tem praticado,é a discriminação e o preconceito contra minorias que historicamente,contribuiram para a construção e o enriquecimento desta nação.Tive a oportunidade de conhecer o local em meados dos anos 80, e saborear a feijoada acompanhada de caipirinha e muito samba. Considero o reconhecimento desta comunidade de especial interesse para a cultura e tradição do Rio de Janeiro.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.