Homenagens a Milton Santos movimentaram Câmara dos Deputados

Um cientista à frente do seu tempo, que humanizou o estudo da geografia no Brasil e no mundo. Este foi o consenso dos pronunciamentos na manhã de hoje (28), durante sessão solene na Câmara dos Deputados, em homenagem a Milton Santos, geógrafo baiano, que se destacou internacionalmente pela sua postura científica. Proposto pelo deputado federal Luiz Alberto (PT-BA), o ato mobilizou autoridades, acadêmicos e representações da sociedade civil, em reconhecimento à importância do intelectual para a sociedade brasileira, repercutindo no parlamento suas contribuições para o país.

“Se a falta da sua presença física é tão evidente, constatamos a permanência de suas idéias, que podem e devem ser debatidas em todas as instâncias sociais. Mas é na política que elas se fazem mais consequentes”, declarou a neta do homenageado, Nina Fernandes dos Santos, que representou a família na sessão. Durante sua fala, a jovem convidou a plateia a visitar o sitewww.miltonsantos.com.br, que reúne o acervo histórico e biográfico do cientista, com fotos, textos acadêmicos, escritos e livros.

Para o proponente da sessão, “Milton Santos é um farol que aponta o melhor caminho a ser seguido diariamente por aqueles que combatem o racismo no Brasil”. Ao destacar o trabalho do geógrafo, que também atuou como jornalista e professor, o parlamentar disse que Milton Santos mostrou a importância de a nação servir antes de tudo a homens e mulheres do que a interesses de empresas. A fala do deputado correspondeu à declaração do próprio Milton Santos, em vídeo do programa Roda Viva, da TV Cultura, exibido na sessão. Ele disse que a globalização reproduzia uma forma de utilização dos recursos produzidos pela humanidade, mas de forma perversa, deixando de lado os que produziam esses recursos e privilegiando a poucos.

De acordo com a ministra da secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Bairros, que parabenizou a indicação do deputado, a iniciativa se insere em uma das finalidades da SEPPIR, que é a valorização das personalidades negras e de sua contribuição para a formação da sociedade brasileira. Ela disse que um dos grandes legados de Milton Santos foi ele ter se constituído como um intelectual negro, já que, segundo afirmou a ministra, na contextualização do racismo brasileiro isso aparece como uma contradição porque o racismo não associa a pessoa negra à atividade intelectual. “Além disso, Milton Santos teve uma perspectiva fina e afinada com os interesses populares”, complementou.

A solenidade contou ainda com a presença do presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, do secretário de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia, Elias Sampaio, que representando o governador baiano, Jaques Wagner, da senadora Lídice da Mata (PSB-BA), da embaixadora de Guiné Bissau, Eugênia Pereira Araújo, e do prefeito do município onde nasceu Milton Santos, Brotas de Macaúbas, Tercílio de Oliveira Júnior.

Biografia

Extraído do site www.miltonsantos.com.br

Bacharel em Direito, pela Universidade Federal da Bahia, Doutor em Geografia, pela Universidade de Strasbourg, Milton Santos nasceu no município baiano de Brotas de Macaúbas e faleceu há 10 anos.

1948-1964. Um pesquisador implicado na realidade local

Até 1964, ano em que deixa o Brasil em razão do golpe militar,  ele conduz paralelamente uma carreira acadêmica e atividades públicas. Jornalista e redator principal do jornal A Tarde (1954-1964), professor de geografia humana na Universidade Católica de Salvador (1956-1960), professor catedrático de geografia humana na Universidade Federal da Bahia onde cria o Laboratório de Geociências, será diretor da Imprensa Oficial da Bahia (1959-1961), presidente da Fundação Comissão de Planejamento Econômico do Estado da Bahia (1962-1964), e representante da Casa Civil do presidente Jânio Quadros no Estado da Bahia, em 1961. Suas pesquisas e publicações da época focalizam as realidades locais, principalmente a capital – a tese de doutorado é intitulada O Centro da Cidade de Salvador – assim como as cidades e a região do Recôncavo.

1964-1977. Um pesquisador viajante

Em 1964, começa uma carreira internacional imposta pela situação política no Brasil. Primeiro na França, professor convidado nas universidades de Toulouse, Bordeaux e Paris-Sorbonne, e no IEDES (Instituto de Estudos do Desenvolvimento Econômico e Social). De 1971 a 1977, inicia uma carreira verdadeiramente itinerante, ao sabor dos convites: no MIT (Massachusetts Institute of Technology – Boston) como pesquisador; e como professor convidado nas universidades de Toronto (Canadá), Caracas (Venezuela), Dar-es-Salam (Tanzânia), Columbia University (New York). Esse período  abre uma longa caminhada em direção a teorização em geografia, com o intenso aproveitamento das ricas bibliotecas das grandes universidades. Primeiro uma ampliação do foco com o livro Les Villes Du Tiers Monde, 1971, onde já aparece o interesse em estudar as peculiaridades da economia urbana dos países então chamados  subdesenvolvidos, caracterizada pelos seus dois circuitos, superior e inferior, e resultando no livro L’Espace Partagé: les deux circuits de l’économie des pays sous-développés publicado em francês em 1975, em inglês e português em 1979.

1977-2001. Um pesquisador engajado

Em 1977, retorna ao Brasil. Passam-se dois anos antes de conseguir voltar a ensinar na universidade brasileira, primeiro na Universidade Federal do Rio de Janeiro, de 1979 a 1983, ano em que ingressa por concurso na Universidade de São Paulo, professor titular de geografia humana até a aposentadoria compulsória, recebendo o título de Professor Emérito da USP em 1997 e continuando a pesquisar, publicar e orientar estudantes até o final de sua vida.Será reintegrado oficialmente à Universidade Federal da Bahia em 1995, da qual tinha sido demitido por “ausência”. Doze universidades brasileiras e sete universidades estrangeiras lhe outorgaram o titulo de Doutor Honoris Causa.

Em 1994, recebe o Prêmio Internacional de Geografia Vautrin Lud. Nesta última fase de seu percurso, publica Por uma Geografia Nova, da crítica da geografia a uma geografia crítica (1978), contribuição à efervescência e ânsia de renovação dessa ciência no Brasil. O espaço é definido como uma instancia social ativa, a noção de formação sócio-espacial introduzida. As pesquisas, as aulas e as publicações resultantes tencionam um esforço epistemológico para dotar a geografia latino-americana de categorias de análise apropriadas.

O estudo do meio técnico-científico-informacional deve permitir entender a organização do espaço no período histórico atual. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional (1994), Da totalidade ao lugar (1996), Metamorfose do espaço habitado (1997), são algumas dessas publicações que desembocam na sua obra maior (no seu livro maior?): A Natureza do Espaço (1996), que quer ser “uma teoria geral do espaço humano, uma contribuição da geografia `reconstrução da teoria social”. Enfim, em 2000, publica Por uma outra globalização, do pensamento único à consciência universal.

 

 

 

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.