Fazendeiros vão ter de deixar terra indígena em Mato Grosso

Justiça decide devolver área, concedida pelo governo militar a projeto agrícola, aos Xavantes. Governo do Estado é contra

Helson França, iG Mato Grosso

Depois de quase 40 anos de disputa com indígenas da etnia Xavante pela posse da terra de Marãiwatsede, fazendeiros terão que deixar a área, por determinação judicial. Para acelerar o processo de desocupação, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação visando à execução, o quanto antes, da sentença judicial proferida pela Justiça Federal. O problema é que os fazendeiros não têm para onde ir e o governo do Estado é contra a retirada.

A terra de Marãiwatsede tem 165 mil hectares (1,5 mil km2) e fica entre os municípios de Alto Boa Vista, Bom Jesus do Araguaia e São Félix do Araguaia, na Amazônia Legal de Mato Grosso. A região .

O MPF quer que a Polícia Federal acompanhe o processo de saída dos fazendeiros, para que possíveis conflitos com indígenas sejam evitados. Além disso, o MPF também solicitou um estudo sobre a área degradada, e que os governos federal e estadual apresentem outros destinos para os fazendeiros.

As terras indígenas estão a aproximadamente 1.060 quilômetros de Cuiabá. Foto: Reprodução Google Maps

O governador de Mato Grosso, Silval Barbosa (PMDB), foi contra a retirada dos fazendeiros, sob alegação de que o Estado não possui outro local para remanejá-los. Barbosa sugeriu ao secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que os Xavantes fossem transferidos para uma outra área de 225 mil hectares, situada entre o rio das Mortes e o Araguaia. A proposta não foi levada adiante.

“O que está em jogo é a nossa tradição e origem. Recuperar Marãiwatsede é uma questão de honra. A terra para nós é sagrada”, afirmou o cacique Damião Paradzan.

Segundo o procurador da Funai em Mato Grosso, César Augusto Lima do Nascimento, ao longo da disputa judicial, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) chegou a disponibilizar lotes para que os posseiros, fazendeiros e grileiros pudessem se mudar e manter as atividades agropecuárias, mas eles se recusaram a desocupar a área.

“Lá não tem ninguém inocente. Essas cerca de três mil pessoas tinham conhecimento de que aquela região pertencia originalmente aos Xavantes, mas mesmo assim insistiram em ocupá-la até o último instante”, contou.

O caso

Em 1966, cerca de 250 indígenas foram transferidos de Marãiwatsede pelo governo militar para dar espaço a um projeto agrícola liderado pelo Grupo Ometto (do setor açucareiro). Dessa forma foi criada a fazenda Suiá-Missu, cuja extensão era superior à área do Distrito Federal.

Os índios foram retirados do local pelos aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) e levados para uma área distante 400 quilômetros de Marãiwatsede, situada no município de Quatro Marcos (340 quilômetros de Cuiabá). Desde então, a comunidade indígena vem lutando para retomar o seu território tradicional.

Anos depois o controle da fazenda Suiá-Missu passou à Liquifarm Agropecuária Suiá-Missu e, em 1980, para a empresa petrolífera italiana Agip.

Há famílias que dependem da terra para viver e que possuem uma vida construída aqui. Muitas pessoas não têm para onde ir”, diz presidente de associação de produtores

Paralelamente, aumentavam as pressões internacionais para que a terra fosse devolvida aos índios. Durante a Conferência ECO92, a Agip propôs ao governo federal um acordo para devolver Marãiwatsede aos Xavantes.

A homologação da área para posse permanente e usufruto exclusivo pelo povo indígena Xavante, e registrada em cartório como de propriedade da União Federal, conforme legislação em vigor se deu apenas em 1998.

Estima-se que atualmente 85% dos 165 mil hectares de Marãiwatsede (que no idioma Xavante significa Mata Densa) estejam desmatados, em virtude da prática agrícola estabelecida há 40 anos.

A decisão judicial que determinou a retomada da área aos Xavantes foi proferida somente no ano passado. Para a Justiça Federal não há dúvida de que a comunidade Xavante “foi despojada da posse de suas terras na década de sessenta, a partir do momento em que o Estado de Mato Grosso passou a emitir título de propriedade a não-índios, impulsionados pelo espírito expansionista de ‘colonização` daquela região brasileira”, como consta na sentença.

Os desembargadores concluíram que os posseiros, fazendeiros e grileiros não têm nenhum direito às terras, por se tratarem de “meros invasores da área, inexistindo possibilidade de ajuizamento de ação indenizatória”.

Atualmente existem 700 fazendas em Marãiwatsede. O presidente da Associação dos Produtores Rurais de Suiá Missú, Renato Teodoro da Silveira Filho, disse que muitos proprietários têm o título da terra. “Há famílias que dependem da terra para viver e que possuem uma vida construída aqui. Muitas pessoas não têm para onde ir”, disse.

http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/mt/fazendeiros+vao+ter+de+deixar+terra+indigena+em+mato+grosso/n1597022533026.html

Comments (1)

  1. ESSES PROBLEMAS CRIADOS POR TIRANIA E IMPOSIÇÃO DEIXAM UM SALDO HUMANO DE CATASTROFE. TUDO O QUE SE FIZER FICA PARECENDO INJUSTO.MAS É IMPORTANTE QUE SE MOSTRE NESTE BRASILSÃO SEM LEI QUE A LEI É IMPORTANTE E QUE ANTES DE AGIR COMO PREDADOR HÁ QUE PENSAR UM POUCO.
    PENA QUE TODAS ESSAS MEDIDAS NÃO SEJAM DIVULGADAS NO HORARIO NOBRE DAS NOVELAS QUE É O UNICO HORARIO QUE A QUASE TOTALIDADE DA SOCIEDADE BRASILEIRA SE INFORMA DE ALGUMA COISA QUE ESTÁ ACONTECENDO NO PAÍS.

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