Funai rechaça proposta de mudança do povo Xavante

Para o TRF não há dúvida de que a comunidade Marãiwatsédé “foi despojada da posse de suas terras na

 

A proposta do governo de Mato Grosso de transferir os indígenas da Terra Indígena (TI) Marãiwatsédé para outra área da região do Araguaia não encontra respaldo legal. Os Xavante lutam há décadas pelo reconhecimento e plena ocupação do seu território tradicional, com o qual mantêm vínculos históricos, simbólicos e culturais (entenda o caso da retirada dos Xavante de seu território abaixo). A proteção constitucional garantida às terras indígenas veda qualquer possibilidade de transação das áreas reconhecidas como de uso tradicional, visto que são indispensáveis à sobrevivência física e cultural dos povos indígenas, nos termos do art.231 da Constituição Federal.

A TI Marãiwatsédé está homologada desde 1998 para posse permanente e usufruto exclusivo pelo povo indígena Xavante, e registrada em cartório como de propriedade da União Federal, conforme legislação em vigor. O Tribunal Regional Federal da 1ª. Região, em 2010, confirmou a decisão de primeiro grau que reconheceu a legalidade do procedimento administrativo de demarcação da terra indígena e, consequentemente, determinou a retirada dos ocupantes não indígenas e a recuperação das áreas degradadas da TI Marãiwatsédé.

A impossibilidade do exercício da posse plena da área pelos Xavante levou a um quadro de intensa e progressiva degradação ambiental provocado pelos invasores na TI Marãiwatsédé, conforme se verifica na série histórica de imagens de satélite.

Em 2010, a área da TI Marãiwatsédé foi uma das mais devastadas no estado do Mato Grosso (Prodes-Inpe/2010). O Ibama aplicou várias multas e autuações aos invasores em razão dos ilícitos ambientais por eles praticados na terra indígena, principalmente por grandes proprietários rurais. A retirada dos invasores da TI Marãiwatsédé garantirá a posse plena da terra pelos Xavante e assim a significativa contenção da degradação ambiental na região. A União e a Funai garantirão ações de recuperação ambiental da área para que seja ocupada pelos Xavante segundo seus usos, costumes e tradições, como determina a Constituição Federal.

A União, através da Funai e do Incra, apresentará à Justiça Federal um plano de desocupação da TI Marãiwatsédé. O plano garantirá o reassentamento dos ocupantes não indígenas situados na área da terra indígena e que atendam ao perfil de cliente da reforma agrária. A medida visa contribuir para a pacificação e o distencionamento dos conflitos fundiários na região, ao tempo que atende à decisão judicial que reconhece a posse indígena da área.

Entenda o caso – A Terra Indígena Marãiwatsédé está localizada na Amazônia Legal, entre os municípios de Alto Boa Vista, Bom Jesus do Araguaia e São Félix do Araguaia, no Mato Grosso. Antes do primeiro contato com a população regional, por volta de 1957, os Xavante viviam nessa área de terra fértil, onde o cerrado começa a dar vez à Floresta Amazônica.

Na década de 1960, a Agropecuária Suiá-Missú se instalou na região e promoveu a degradação do meio ambiente, o que reduziu drasticamente os meios de subsistência dos indígenas. Os Xavante acabaram confinados em uma pequena área alagadiça, expostos a inúmeras doenças, quando os dirigentes da fazenda Suiá-Missú articularam a transferência de toda a comunidade para a Terra Indígena São Marcos, ao sul do estado.

Sem outra alternativa, eles aceitaram a imposição. Naquele momento, além da perda da terra em que nasceram, uma epidemia de sarampo atingiu o grupo. Aproximadamente 150 pessoas que pertenciam à comunidade de Marãiwatsédé faleceram, por conta das doenças adquiridas durante aquele contato.

Em 1980, a fazenda Suiá-Missu foi vendida para a empresa petrolífera italiana Agip. Durante a Conferência de Meio Ambiente realizada no Rio de Janeiro, chamada Eco 92, a Agip, pressionada por antropólogos brasileiros e italianos, e vendo que a fazenda não lhe dava os lucros devidos, resolveu devolver aos Xavante a terra que lhes pertencia.

A partir daí a Funai iniciou os estudos de delimitação e demarcação da Terra Indígena, mas antes que pudesse ser regularizada, a área sofreu invasões em massa de posseiros, o que dificultou o retorno dos índios após a sua legalização.

Marãiwatsédé foi homologada em 1998, por decreto presidencial, mas enfrentou diversos recursos judiciais de manutenção de posse. Descontentes de estar em outras terras e após o sofrimento com a morte de diversos membros da comunidade, alguns indígenas começaram a retornar ao local de origem. Em 10 de agosto de 2004, entraram numa parte da Terra que representa apenas 10% do que têm direito.

Recursos judiciais, porém, continuavam impedindo que eles recuperassem o restante de suas terras. Os fazendeiros conseguiram liminar da Justiça, garantindo a permanência em terra indígena. Enquanto isso promoviam o desmatamento para a agropecuária. Mesmo na parte que conseguiram ocupar, os índios enfrentam até hoje sérios problemas com fazendeiros, madeireiros e posseiros que, ao longo dos últimos 40 anos, ocupam as terras Xavante. Ameaças e provocações exigem que os indígenas mantenham vigilância constante e, para se protegerem, se concentrem numa única aldeia, o que não faz parte de sua cultura.

Em agosto de 2010, uma decisão unânime da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) de Mato Grosso, com Mandado de Intimação publicado no DOU de 22 de novembro de 2010, decidiu a favor dos índios Xavante, reconhecendo o direito deles à Terra Indígena (TI) Marãiwatsédé. A posse de todos os ocupantes não-índios da TI foi considerada de má-fé, sobre bem imóvel da União.

Para o TRF não há dúvida de que a comunidade Marãiwatsédé “foi despojada da posse de suas terras na década de sessenta, a partir do momento em que o Estado de Mato Grosso passou a emitir título de propriedade a não-índios, impulsionados pelo espírito expansionista de ´colonização` daquela região brasileira”. Os desembargadores concluíram que os posseiros não têm nenhum direito às terras, por se tratarem de “meros invasores da área, inexistindo possibilidade de ajuizamento de ação indenizatória”.

As ações impetradas pelos ocupantes foram consideradas como “propósito meramente protelatório, atitude que deve ser combatida vigorosamente pelo juiz da causa”, e que as provas que apresentam não são válidas. O TRF declara que o título de propriedade da Liquifarm Agropecuária Suiá-Missú é inválido, pois a terra foi incorporada aos bens da União pelo decreto de homologação, assinado pelo Presidente da República, que torna “nulos e extintos os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras identificadas”.

 

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