A conjuntura política e os movimentos sociais. Uma análise de João Pedro Stédile

A candidatura Serra agrega latifundiários e o agronegócio, a classe média conservadora de São Paulo, setores industriais e financeiros. No mesmo sentido, a candidatura de Dilma Rousseff agrega setores da burguesia financeira e industrial, mas dentro dela também está presente a ampla maioria da classe trabalhadora, do campo e da cidade, se vê representada. “Não é um projeto da classe trabalhadora, mas têm dentro de si representados interesses da classe trabalhadora”, afirmou João Pedro Stédile na 9ª Jornada de Agroecologia que terminou nesse sábado em Francisco Beltrão, sudoeste do Paraná.

O dirigente do MST avalia ainda que o movimento social encontra-se num período de resistência e construção. A reportagem é de Pedro Carrano e publicada pelo sítio da Terra de Direitos, 22-05-2010.

João Pedro Stédile analisa que a esquerda e os movimentos sociais estão em um período de resistência. Para o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), os tempos de recuo das lutas sociais, depois da derrota do projeto da esquerda, em 1989, começam a ficar para trás. Mas ele ressalta que as organizações não retomaram a ofensiva e ainda não conseguem impor à burguesia seu próprio projeto: “Paramos de descer, mas ainda não começamos a ofensiva contra o Capital”, expôs no terceiro dia da nona Jornada de Agroecologia, realizada em Francisco Beltrão, sudoeste do Paraná.

O atual período, no Brasil e na América Latina, é caracterizado pelo dirigente sem-terra como de derrotas e crise do projeto neoliberal da burguesia. Iniciado na Venezuela, este processo estimulou lutas no continente. Atualmente, a burguesia carece de um projeto que dê conta de solucionar as carências das populações trabalhadoras.

Noutros períodos históricos, foi diferente. Após o final da Segunda Guerra, na curva histórica entre os anos de 1945 e 1973, houve uma garantia de pleno emprego e concessões por parte da classe dominante. “A burguesia não resolveu os problemas fundamentais do povo brasileiro. Estão latentes. Entre 1945 e 1973, a classe aumentou muito o salário. Todos tinham casa e escola. Não é o que acontece hoje no Brasil e no mundo”, narra.

Para exemplificar a atual situação, Stédile cita dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Se, na década de 1960, sessenta milhões passavam fome, hoje este número se elevou para um bilhão de pessoas – o que reforça as condições objetivas para um aumento das reivindicações e revolta. Embora as condições subjetivas e de ânimo da classe trabalhadora para a luta não estejam colocadas no atual momento.

Táticas combinadas

A burguesia busca controlar o Estado brasileiro, a principal fonte de acúmulo de riquezas, a partir da chamada mais-valia-social, que o Estado concentra anonimamente, por meio de impostos, explica Stédile. O dirigente critica a concepção das organizações que apostam todas as fichas no processo eleitoral e institucional. Criticou também as correntes “idealistas”, que colocam o problema do socialismo como um ato de vontade, num horizonte próximo. “Não conseguimos forças nem para tirar o presidente do Banco Central”, ironiza. Segundo ele, o acúmulo dos movimentos em torno da Via Campesina aponta para as duas táticas combinadas, entre as lutas social e institucional.

Sobre o momento das eleições, Stédile analisa que a candidatura Serra agrega latifundiários e o agronegócio, a classe média conservadora de São Paulo, setores industriais e financeiros. No mesmo sentido, a candidatura de Dilma Rousseff agrega setores da burguesia financeira e industrial, mas dentro dela também está presente a ampla maioria da classe trabalhadora, do campo e da cidade, se vê representada. “Não é um projeto da classe trabalhadora, mas têm dentro de si representados interesses da classe trabalhadora”, coloca. “Voto depende de uma posição de classe. É necessário derrotar a candidatura Serra, para impedir que a candidatura Serra coloque o seu projeto no Brasil. Temos que ganhar fôlego para seguir avançando a luta”, explica.

Enfrentamento no campo

Na agricultura, dois projetos estão visivelmente em disputa. “Na agricultura, nunca na História do Brasil houve o enfrentamento tão claro de classe”, provoca Stédile, contextualizando que, em outros períodos do Brasil, por vezes os projetos se confundiam, devido ao interesse da burguesia industrial pela reforma agrária, para a criação de mercado interno, uma situação inexistente nos dias de hoje. “No modelo do agronegócio não há espaço para o camponês. Não precisamos existir para o agronegócio ganhar seu dinheiro”, comenta.

O tema dos agrotóxicos deixa o modelo do agronegócio e transnacionais de calças curtas. O aumento do consumo é diretamente proporcional ao adoecimento da população. Stédile cita dados dos EUA, país onde 50% da população desenvolve câncer devido aos alimentos contaminados. Para os camponeses, neste sentido, lutas locais são necessárias, para garantir, por exemplo, que 30% das merendas sejam compostas pela agricultura familiar.

O intercâmbio entre os saberes populares é uma forma de elevar o nível de consciência do povo. Acúmulo de forças e tática de resistência são as palavras para o período: “Este é um período de plantar árvores, ao contrário da alface e do feijão, a árvore não pára de produzir frutos e não morre cedo. Temos que plantar para o futuro”, afirmou.

http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=32697

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