Posse de terras gerará recursos para quilombo do Cafundó

A posse de 122 hectares, de 218 pertencentes à comunidade de remanescentes de quilombo Cafundó, gerará recursos para a comunidade. A informação foi passada na tarde de 2/2, pelo Superintendente Regional do Incra/SP, José Giacomo Baccarin, durante o ato de imissão da posse da Fazenda Eureka em benefício da Associação Remanescente de Quilombo Kimbundu do Cafundó.

Segundo informações do Incra, a Fazenda Eureka é a primeira de quatro glebas do quilombo do Cafundó a ser desapropriada. Os três imóveis restantes estão em processo de desapropriação e aguardam decisão da Justiça Federal para que também sejam regularizados. A Fazenda Eureka foi avaliada em R$1.248.536,28 e a ação foi ajuizada em 4 de novembro de 2011, na 3ª Vara Federal de Sorocaba, que proferiu a decisão favorável ao Incra em 15 de dezembro.

Segundo Baccarin, a área regularizada abriga hoje atividades de cultivo de eucaliptos e extração mineral. “A partir do momento em que a posse dessas terras passa para a comunidade, ela passa a ter direito de participação sobre a renda dessas atividades”, explicou. “A empresa que realiza atividade de mineração nessa área, por exemplo, tinha um contrato com o antigo proprietário em que ela pagava 15% da renda obtida com a mineração pelo uso da área”, completou.

O Superintendente afirmou que o Incra irá apurar, o mais rápido possível, todos os trâmites legais necessários para que os recursos que passarão a ser transferidos ao órgão pela mineradora sejam, automaticamente, transferidos para a Associação Kimbundu. A expectativa, segundo Baccarin, é de que a comunidade seja beneficiada com cerca de R$20 mil mensais só com os recursos da extração de areia.

O Superintendente destacou o simbolismo do ato de entrega da posse das terras como uma forma de resgate da dívida que o povo brasileiro tem para com a comunidade afrodescendente pelo sofrimento a que foi submetida nos séculos XVIII e XIX. “Sobretudo, o estado de São Paulo, que se tornou o estado mais rico da nação a partir do café e quem produziu, trabalhou o café foram os negros sob o regime de escravidão”, afirmou. “Não paga essa dívida porque houve muitas mortes, muito sofrimento, mas tem um grande simbolismo”, completou.

O deputado estadual Hamilton Pereira (PT), que por ser da região de Sorocaba mantém contato com a comunidade do Cafundó há muitos anos, destacou o mérito dos remanescentes de quilombo pela organização e persistência na luta. “Foi a partir do Governo Lula, em 2004, que o Incra passou a ser responsável pelo processo de reconhecimento, mas aqui não se trata de nenhuma benesse e sim da luta incansável da comunidade e do movimento organizado”, afirmou o deputado.

O processo de reconhecimento foi iniciado com o relatório técnico/antropológico produzido pela Fundação Itesp (Instituto de Terras do Estado de São Paulo) em 1999. Os títulos oriundos dessa regularização são de natureza coletiva e não podem ser vendidos, devendo ser registrados em nome da Associação Kimbundu do Cafundó.

Participaram do ato de imissão os mais velhos representantes da comunidade, Sr. Adauto e Sra Juditi, o coordenador da Associação Marcos Roberto de Almeida e a vereadora de Salto de Pirapora, Magali Cannali (PT). Também estiveram representados o Instituto Luis Gama, o Itesp e a Federação Quilombola do Estado de São Paulo.

Histórico

A pequena comunidade quilombola do Cafundó ficou famosa por ter sobrevivido como um pedaço do passado no coração de São Paulo. Localizado a apenas 125 km da capital, o Cafundó ainda possui falantes de uma língua própria, a cupópia, variante linguística do banto. Apesar do imaginário de ser uma “África no Brasil”, as terras originárias da comunidade foram sendo cercadas, ameaçadas pela especulação imobiliária, tomadas por pastagens e até mesmo por um porto de extração de areia.

As 25 famílias da comunidade só conseguiram permanecer em suas terras por conta de uma ação de usucapião, movida por uma antiga liderança, Otávio Caetano, em 1972. Impedidos de exercer seus modos tradicionais de produção, os cafundoenses se viram relegados a precárias condições de vida, sujeitos à violência dos novos posseiros.

Posse de terras gerará recursos para quilombo do Cafundó.

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