A votação da reforma do Código Florestal, marcada para hoje no Senado, testará o poder da bancada do agronegócio. O teste tem como objetivo liberar da exigência de recuperar a vegetação nativa as áreas desmatadas até 2008 e ocupadas por pastos e plantações, sobretudo às margens de rios, nas chamadas Áreas de Preservação Permanente (APPs). A reportagem é de Marta Salomon e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 09-11-2011.
Ontem, os ruralistas ainda detalhavam a estratégia para o confronto de hoje, que se dará mais uma vez nas comissões de Agricultura e Ciência e Tecnologia. O objetivo é retirar do texto básico aprovado ontem nas duas comissões a exigência de recompor a vegetação nativa de 15 metros a cada margem dos rios mais estreitos (até 10 metros de largura).
Essa exigência aparece no artigo 56 do relatório do senador Luiz Henrique da Silveira(PMDB-SC), aprovado ontem. O senador defende um texto que possa ser aprovado pela Câmara e também passar pela sanção da presidente Dilma Rousseff. A presidente já ameaçou vetar a anistia a desmatadores e a ameaça à existência das APPs.
Para tentar conciliar interesses conflitantes, o senador liberou a recomposição de parte das áreas de reserva legal e de preservação permanentes ocupadas pelo agronegócio, mas manteve a exigência de proteção do meio ambiente, como querem ambientalistas.
Cria ainda um programa de incentivos para a recuperação da vegetação nativa nas propriedades, por meio de abatimento no Imposto de Renda.
A reação dos ruralistas à proposta foi encabeçada por um correligionário do relator: o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária. “Queremos o respeito às áreas consolidadas, não vamos aceitar que mudem isso”, disse Colatto, embora a exigência de recuperação de 15 metros de vegetação nativa às margens de rios fosse objeto de acordo na Câmara, no relatório do então deputado Aldo Rebelo.
Dados do Ministério da Agricultura apontam que 430 mil quilômetros quadrados de Áreas de Preservação Permanentes foram desmatados para abrir espaço a atividades agropecuárias. Os ruralistas não querem perder essa área de plantio e pastos.
Colatto adiantou também que os defensores do agronegócio querem autonomia dos Estados para estabelecer regras para os programas de recuperação ambiental. Tampouco aceitam a definição dada à pequena propriedade no texto aprovado ontem por unanimidade (15 votos) na Comissão de Agricultura e 12 votos contra 1, na Comissão de Ciência e Tecnologia. Essa definição é considerada restrita à agricultura familiar.
Depois da votação prevista para a manhã de hoje, a reforma do Código Florestal ainda será analisada pela Comissão de Meio Ambiente, em uma escala para o plenário do Senado. A ideia é concluir a votação do código ainda neste ano.
A nova versão da reforma do Código em debate no Senado traz, entre as principais novidades em relação ao texto aprovado na Câmara, a possibilidade de desconto no Imposto de Renda de gastos com a recomposição de vegetação nativa nas propriedades rurais. A medida é parte de um pacote de incentivos a ser detalhado pelo governo em seis meses, com a intenção de estimular a recuperação de parte dos 870 mil quilômetros quadrados de áreas protegidas já desmatados.
“Com o processo de regularização fundiária remetido aos Estados, pode haver necessidade de recuperação em alguns casos. Aí sim, quando houver indicação técnica, nós aceitamos que sejam impostas obrigações de recuperar”, afirma Assuero Doca Veronez, representante da Confederação Nacional da Agricultura (CNA).
Repercussão
Para Raul Telles do Valle, do Instituto Socioambiental, o texto permite que tudo o que foi desmatado até 2008 entre na anistia. “A anistia vira regra e não exceção.” O consultor de floresta e clima Tasso Azevedo diz que “não se vê uma posição firme do governo de que 2008 não pode ser a data”. E ressalta que tudo “está se costurando de uma maneira que encurrala o senador Jorge Viana”, relator na Comissão de Meio Ambiente. “Ele está numa situação desconfortável. Ficaria constrangedor ele apresentar algo muito diferente e ser derrotado.
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