Povos Indígenas: evite absurdos, Presidente Dilma! [Ótimo!]

Constituição 1988Por Ivo Poletto, em Reflexão Crítica e Cidadania

Só podia dar nisso o processo de queimação da FUNAI: que a EMBRAPA ganhasse chamada e primeira notícia do Jornal Nacional da Rede Globo de Televisão para acusar: duas áreas que a FUNAI quer demarcar não têm índios!!! E que o Ministro da Justiça tentasse justificar a notícia no mesmo horário nobre da Globo como algo positivo, como esforço do governo para evitar que processos judiciais compliquem a demarcação dos territórios indígenas!

Se teimar seguindo por este caminho, Presidente Dilma, seu governo entrará na história como mais um período em que o Brasil confirma o genocídio dos povos indígenas.

Vejamos os motivos da ausência de indígenas em áreas que a FUNAI concluiu que devem ser demarcadas como dos Guarani ou Terena, no Mato Grosso do Sul.

Primeiro: de modo especial durante os vinte anos da última Ditadura, o INCRA vendeu, a preço de compadre, áreas imensas a empresas, e o fez olhando o mapa da região lá em Brasília, sempre a pretexto de que por lá não há ninguém!, e por isso, é preciso que empresas levem para lá o progresso e integrem esses territórios ao Brasil, evitando que sejam tomados por empresas estrangeiras.

Segundo: uma vez portadora da concessão do INCRA, a empresa foi ao CARTÓRIO – esse “serviço público” realizado por empresas familiares! – e registrou a área como propriedade privada, recebendo o Título de Propriedade.

Terceiro: ao tomar posse da área a que, com o Título de Propriedade, passou a ter direito, a empresa “descobre” que indígenas vivem nela há centenas ou milhares de anos, e passa a usar todos os recursos para expulsá-los: diretamente, através de ações violentas de seus “funcionários”, ou indiretamente, através de “mandatos judiciais” e poder policial do Estado.

Quarto: uma vez expulsos de seus territórios, os Guarani ou Terena – ou outros povos, identificados com outros nomes – vivem perambulando, em busca de uma área em que possam viver segundo sua cultura, costumes e religião; são, evidentemente, escorraçados e humilhados em todas as tentativas de se estabelecerem em algum pequeno pedaço de chão.

Quinto: com grandes mobilizações, os povos indígenas sobreviventes no Brasil conseguem, através de propostas populares e muita pressão sobre os congressistas que se autodefiniram como constituintes, que a Constituição Federal de 1988 reconheça os direitos de retornarem aos seus territórios de origem; para isso, estudos antropológicos e de outras áreas complementares devem ser feitos para confirmar ou não este direito de cada povo que reivindica determinada área, e esta é uma das missões da FUNAI.

Sexto: uma vez comprovado por estes estudos que determinada área é, por direito originário, território de um povo, como está ocupada por empresas e pessoas detentoras de Título de Propriedade, os povos indígenas, através da FUNAI, e os que se consideram ameaçados em seu direito apelam ao Judiciário; este, aplicador que é da “lei”, praticamente sempre prefere defender os Títulos de Propriedade e não o Direito ao Território, ambos constitucionais, desconhecendo que este último é “originário” e, portanto, anterior ao concedido pelo Cartório de Registro de Imóveis.

Oitavo: ao não haver como recuar em relação aos estudos que comprovam serem legítimos territórios originários, a pressão dos “aliados” ruralistas e do governo do estado leva o governo federal a deslegitimar os quase únicos trabalhos bem feitos pela FUNAI em favor dos povos indígenas, e o faz promovendo “consulta” a órgãos como a EMBRAPA, que é serviço técnico de apoio agropecuário aos grandes proprietários…

É por isso que estamos no fim da picada, presidente Dilma: seu governo está tentando legalizar, uma vez mais, processos de genocídio de povos indígenas, impedindo que tenham acesso ao seu reconhecido Território Originário, e o faz dando ouvidos a funcionários e técnicos comprometidos com os que os ocupam.

Retomem um pouco a história da ocupação territorial de nosso país, Presidente Dilma, Sr. Ministro da Justiça, senhores técnicos da EMBRAPA e senhores da Rede Globo, e verão que sempre foi assim: com uso de violência direta ou com de violência estatal, os territórios dos povos indígenas foram sendo tomados à força, e muitos povos foram exterminados.

Finalmente, o que o parecer acusador da EMBRAPA sugere aos povos Guarani e Terena? Creio que é isto: “por favor, ocupem seus Territórios Originários, para que não se diga que vocês não têm direito a eles porque não estão lá!!! E não aceitem mais serem chamados de “invasores” quando agirem dessa forma, já que esta é a prática necessária para que seja legítima a conclusão dos estudos da FUNAI em relação ao direito de vocês!”

Diante desta conclusão, os senhores Juízes e senhores governantes devem colocar o Estado na defesa da retomada direta dos povos indígenas aos seus Territórios Originários, uma vez que, agora, isso é necessário para que técnicos em agropecuária reconheçam seus direitos.

Torço, como pessoa e como cidadão brasileiro, que pelo menos o bem senso volte a reinar na República do Brasil. Que os direitos constitucionais dos Povos Indígenas sejam reconhecidos, promovidos e garantidos, e que, para isso, a FUNAI seja melhor aparelhada e apoiada para cumprir sua missão, e que sejam removidos os que ocupam seus territórios – garantindo também seus direitos de indenização, se forem legítimos.
Enviada por Ruben Siqueira para Combate Racismo Ambiental.

Comments (1)

  1. Se o governo da Presidente Dilma tomar a determinação de levar em frente à aplicabilidade destes instrumentos jurídicos que legalizam a usurpação dos direitos indígenas, principalmente o direito sagrado à terra e o território. Estará notoriamente desvirtuando e tirando a credibilidade de seus propósitos ao chamar os povos indígenas, por meio de seus dirigentes e instâncias representativas, a dialogar sobre a promoção e proteção dos direitos indígenas no âmbito de distintos espaços como a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) e o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) que promove a regulamentação dos mecanismos de aplicação do direito de consulta e consentimento livre, prévio e informado, estabelecido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Além de tudo, irá contrariar os princípios da boa fé e do efeito vinculante deste instrumento internacional, incorporado desde 2004 no ordenamento jurídico nacional.

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