Impasse com indígenas afeta funcionamento de barragem de José Boiteux, SC

Famílias indígenas perderam casas e ocuparam área da barreira. Elas fizeram um acordo com a Defesa Civil relacionado à região.

G1 SC

A barragem de José Boiteux, no Vale do Itajaí, é a maior barreira já erguida para conter águas em todo o Brasil. Porém, um impasse envolvendo comunidades indígenas afeta o funcionamento dela, como mostrou a série “Desafios do clima” nesta sexta-feira (2).

Apesar de ser a maior barreira, a barragem não segura uma gota sequer desde junho do ano passado. Foi quando a água do Rio Hercílio ultrapassou o paredão e alagou a área em que viviam comunidades indígenas.

Cerca de 35 famílias perderam as casas e ocuparam a barragem. Elas expulsaram o operador de máquinas e mantêm as comportas abertas desde então.

O cacique Setembrino Vomblé Camblé explica que a área foi ocupada porque “essa é uma forma de nós questionarmos o nosso direito. Vimos que no Brasil inteiro é assim. O povo, para requerer seus direitos, é só por manifestações”.

O episódio acendeu antigas discussões dos índios. Uma delas é a posse das terras. “Desde 1914 nós ocupamos essa terra indígena”, diz o cacique.

Em 1926, a União estudou a colonização do Vale do Itajaí e concluiu que os índios teriam direito a 20 mil hectares. Nascia a reserva Duque de Caxias.

Mais tarde, os colonos ganharam um pedaço dessa terra e os índios ficaram com 14 mil hectares. Em 1992, mais uma área da reserva foi usada para a barragem.

Mas a Fundação Nacional do Índio (Funai) alega que os indígenas têm direito a todas essas terras e ainda mais.

“Nós temos um processo de demarcação de terra de 37 mil hectares. Nós andamos nessa área e sabemos que a área não corre risco e é onde nós podemos viver melhor”, afirma o cacique.

O risco de que ele fala é a inundação, outra reivindicação das comunidades. A barragem foi entregue sem um canal que conduz a vazão da água represada e ela acaba correndo para as aldeias.

Atualmente, 2 mil indígenas xokleng, kaingang e guarani vivem em oito aldeias da reserva Duque de Caxias.

“Eu não sou contra a barragem. Eu sou contra essas pessoas que não trazem solução para uma comunidade. Tanto para a comunidade não-indígena quanto para a comunidade indígena”, disse o cacique.

Na sala do controle de máquinas da barragem, ninguém mexe, garante Setembrino. Até um ano atrás, o operador testava as comportas uma vez por semana e, o gerador todo mês. Atualmente, ela está desativada.

Acordo

Na quinta (1º), Defesa Civil estadual e indígenas chegaram a um acordo sobre a barragem. Técnicos do estado vão poder acessar novamente a área para fazer a manutenção e operar a barreira.

Sobre o canal para a vazão da água, o secretário da Defesa Civil catarinense, Milton Hobus, diz que “o estado contratou todo o levantamento para a construção do canal ‘extravasor’ e não foi feito até hoje. Queremos fazer também para delimitar a área de segurança da barragem, para que possa cumprir uma meta da comunidade indígena, que é receber o resto das terras”.

Para o hidrólogo Ademar Cordero, que é um dos pioneiros em estudar o Vale do Itajaí, a barragem de José Boiteux é a mais importante para a região de Blumenau.

“Ela tem uma influência ali de 2 metros até 2,5 metros, dependendo de onde cai a chuva. Em 2011, deu 13 metros aqui. Se não tivesse a barragem, ia dar 15 metros, igual à enchente de 1984”, diz.

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