Na ONU, secretário do Cimi Cleber Buzatto denuncia assassinato de indígena Ka’apor no Maranhão

Por Carolina Fasolo, Assessoria de Comunicação Cimi

O secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber César Buzatto, fez um pronunciamento no Fórum Permanente para Questões Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU) na tarde desta quinta-feira (30), em Nova York (EUA), anunciando o assassinato do indígena Eusébio Ka’apor, que morreu por lutar pela preservação da Terra Indígena (TI) Alto Turiaçu, no Maranhão (aqui).

Buzatto ressaltou a ausência e omissão do Estado brasileiro, especialmente do Ministério da Justiça, em relação à exploração ilegal de madeira dentro do território dos Ka’apor, que sofrem constantes ameaças de morte por expulsarem madeireiros da TI, e pediu que o governo brasileiro promova uma “ampla e irrestrita investigação” a fim de que os assassinos de Eusébio sejam responsabilizados pelo crime.

A necessidade de promover, no Brasil, a demarcação e proteção das terras indígenas também foi ressaltada por Cleber Buzatto, que pediu ao Fórum que pressione o governo brasileiro a cumprir suas responsabilidades constitucionais com a questão indígena. “Esperamos que a repercussão da realidade vivida pelos povos indígenas no Brasil, aqui no Fórum Permanente da ONU, ressoe para dentro das instâncias do governo brasileiro, que certamente se sentirá envergonhado e esperamos que com isso tome providências imediatas para mudar a sua posição política de paralisar os procedimentos de demarcação, principalmente aqueles das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste”, disse Buzatto depois do pronunciamento.

Foi solicitado que o Fórum recomende à presidente Dilma Rousseff o veto integral à lei sobre Biodiversidade e Conhecimentos Tradicionais – aprovada nessa terça-feira (28) pelo Congresso Nacional, com uma série de retrocessos aos povos indígenas e comunidades tradicionais -, e também a necessidade de abertura, pelo governo brasileiro, de um processo de ampla consulta “aos povos indígenas e demais sujeitos de direitos, com vistas a construção uma legislação verdadeiramente inclusiva e respeitosa no que diz respeito aos conhecimentos tradicionais e à biodiversidade no Brasil”.

Leia abaixo o pronunciamento de Cleber Buzatto à ONU.

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14º. Período de Sessões do Fórum Permanente da ONU sobre as Questões Indígenas
Tema 8 – Trabalho Futuro do Fórum Permanente

Sra. Presidente / Senhoras e Senhores

Meu nome é Cleber Buzatto, sou Secretário Executivo do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, em nome de quem agradeço o espaço concedido para esta declaração. Apoiando e considerando as declarações das lideranças indígenas do Brasil já realizadas ao longo deste 14º. Período de Sessões do Fórum Permanente, informo, com muita tristeza e indignação, que o líder indígena Eusébio Ka’apor, de 42 anos, da Terra Indígena Alto Turiaçu, no estado do Maranhão, foi assassinado com um tiro nas costas, no domingo, dia 26 de abril.

De acordo com outras lideranças Ka´apor, os responsáveis pelo crime são madeireiros, que mataram Eusébio devido às ações de autofiscalização e vigilância territorial realizadas pelos Ka’apor desde o ano 2013, que culminaram, em março de 2015, no fechamento de todos os ramais de invasão madeireira da Terra Indígena Alto Turiaçu. Eusébio era membro do Conselho de Gestão Ka’apor.

Constata-se, senhora presidente, também nesse caso, a ausência e a omissão do Estado brasileiro, especialmente do Ministério da Justiça, que tem ignorado as reiteradas denúncias dos crimes praticados por invasores dentro do território indígena. O trabalho realizado pelos Ka’apor conseguiu proteger a maior parte da área, freando as ações criminosas da exploração ilegal de madeira, protegendo o meio ambiente e os recursos naturais em sua terra. No entanto, essas ações vêm despertando a ira dos
madeireiros, que ameaçam e intimidam os indígenas. Várias aldeias já foram invadidas em represália às ações de autofiscalização. Mesmo assim, nenhum órgão do Estado brasileiro se manifesta em defesa dos Ka’apor, que continuam suscetíveis a esse tipo de crime.

Senhora presidente, nesta terça-feira, 28 de abril, o Congresso Nacional do Brasil concluiu a votação do Projeto de Lei 7735/14 que trata sobre biodiversidade e conhecimentos tradicionais. O referido Projeto foi construído pelo Poder Executivo ao longo de três anos de negociação com organizações representantes de indústrias farmacêuticas, de cosméticos, dentre outras, sem a participação dos sujeitos de direitos, os povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais, pequenos agricultores. Um flagrante desrespeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. Além disso, o referido Projeto foi apresentado pelo Governo brasileiro para que tramitasse em Regime de Urgência no Congresso Nacional. Isso também inviabilizou a participação, o debate e até mesmo o conhecimento por parte da grande maioria dos povos indígenas do Brasil acerca do seu conteúdo. Para piorar ainda mais a situação, na Câmara dos Deputados, a relatoria do Projeto ficou a cargo de um parlamentar membro da Bancada Ruralista, inimigo declarado dos povos indígenas no Brasil. Com tudo isso, o conteúdo aprovado pelo Congresso Nacional é desastroso para os povos indígenas e segue agora para a sanção da Presidência da República.

Perante as graves questões relatadas, senhora presidente, Recomendamos:

1) Que o Fórum Permanente da ONU sobre as Questões Indígenas cobre do governo brasileiro a realização de uma ampla e irrestrita investigação a fim de que os assassinos do líder Eusébio Ka´apor sejam identificados e devidamente responsabilizados pelo crime que cometeram.

2) Que o Fórum Permanente da ONU sobre as Questões Indígenas inste o governo brasileiro a cumprir a sua responsabilidade constitucional de promover a demarcação e a proteção das terras indígenas no país.

3) Que o Fórum Permanente da ONU sobre as Questões Indígenas recomende à Presidente Dilma Rouseff o veto integral à lei sobre Biodiversidade e Conhecimentos Tradicionais aprovada pelo Congresso brasileiro, nesta terçafeira, 28 de abril.

4) Que o Fórum Permanente da ONU sobre as Questões Indígenas recomende ao governo brasileiro a abertura de um processo de ampla Consulta com os povos indígenas e demais sujeitos de direitos com vistas a construção uma legislação verdadeiramente inclusiva e respeitosa no que diz respeito aos Conhecimentos Tradicionais e à biodiversidade no Brasil.

Cleber César Buzatto
Secretário Executivo do Conselho Indigenista Missionário – Cimi

Nova Yorque, 29 de abril de 2015

Destaque: foto reproduzida do Cimi

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