O império está em crise, e temos que nos preparar para enfrentá-lo, afirma Atilio Boron

No primeiro dia do 6° Congresso da Cloc, o sociólogo argentino Atilio Boron e João Pedro Stedile, do MST, participaram da mesa em que se debateu a conjuntura política e agrária

Da Cloc – Via Campesina / MST

No primeiro dia do 6° Congresso Continental da Cloc, nesta terça-feira (14), o sociólogo argentino Atilio Boron e João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST e membro da Via Campesina, participaram da mesa em que se debateu a conjuntura política e agrária.

Durante sua fala, Boron analisou a atual situação dos Estados Unidos frente ao contexto mundial e suas respostas às mudanças políticas e econômicas pelas quais passam o planeta.

Para o sociólogo, estamos vivendo um lento, gradual e irreversível processo de decadência da maior potência econômica e militar do mundo, que seria caracterizado por um momento histórico de “mudança de época”.

“Os EUA estão sustentando um modelo civilizatório inviável, o que implica que eles se convertam num grande governo mundial fascista para que consigam manter seu padrão de consumo incompatível com a natureza”, acredita.

Segundo Boron, a crise de hegemonia dos EUA é resultado de diversos fatores internos e externos, como sua debilidade econômica que vem produzindo uma série de crises fiscais, responsável por provocar uma dívida pública 100% superior ao seu Produto Interno Bruto (PIB).

“Quando um império entra em crise ele fica muito mais violento, e esse é um império que já está em crise. Portanto, temos que nos preparar para responder a essa debilidade”, aponta.

Para ele, todas as intervenções militares dos EUA no mundo nos últimos 50 anos têm uma divisão comum: o petróleo.

Atualmente, os EUA produzem cerca de 8 a 10 milhões de barris por dia, e consomem cerca de 15 milhões. Em 2025, os dados apresentados pelo sociólogo apontam que produzirá cerca de 11 milhões, mas sua necessidade beirará os 28 milhões de barris diários.

De olho na América Latina

A cada criança estadunidense que nasce, estima-se que são necessários 2,8 milhões de libras de combustível, produtos naturais e metais para manter o padrão de consumo de sua população.

Neste cenário, a América Latina passa a ser um alvo estratégico na política econômica e militar dos EUA.

Como aponta Boron, o continente detêm 50% da biodiversidade mundial, cerca de 45% de toda água doce do mundo, 80% da reserva de lítio e a maior reserva de petróleo do mundo – na Venezuela -, além de grandes reservas de gás e hidroelétricas.

Não à toa, os EUA mantêm 80 bases militares em toda a América Latina e Caribe. Sob este cenário, Boron pergunta o que poderia ser feita. Para dar sua resposta, recorre à Fidel Castro.

“Ainda que nos dissessem que Cuba não duraria 10 anos, o nosso único dever é seguir lutando”.

Mundo homogeneizado

Pela primeira vez na história estamos vivendo num mundo em que um único modo de produção domina todo o planeta.

Por isso, como observou Stedile, é que o capital com suas empresas transnacionais criaram uma nova divisão internacional do trabalho e detêm o poder de decidir o que cada região e país têm que produzir.

“Para nós sobraram os minérios, a energia e as commodities agrícolas. Com isso, eles controlam os preços das mercadorias agrícolas, que já não são mais definidos pela oferta e demanda. E com isso nos induzem a produzir o que eles necessitam, e não o que os nossos povos precisam.”

Este contexto implica, segundo Stedile, num novo momento da luta de classes no campo, que “se voltou para uma verdadeira luta de classes antagônicas. De um lado, os capitalistas, em geral, e do outro os camponeses. Não há mais possibilidade de uma conciliação de classes ou uma convivência, como foi no século 20”.

Com isso, coloca que o que está em jogo é a disputa por dois modelos agrícolas antagônicos, cujo agronegócio se caracterizaria num modelo de apropriação privada dos recursos naturais, “de organização da produção sob o controle do capital. E nesse modelo do agronegócio, não tenham dúvidas, não há nenhum espaço para os campesinos”.

O contraponto a esse modelo seria a produção agroecológica protagonizada pelos camponeses, em que se concilia uma produção de alimentos saudáveis em harmonia com o meio ambiente. “Mas a grande vitória só será possível se nós nos juntarmos com a classe trabalhadora que vive na cidade”, aponta.

Ao finalizar, Stedile lembrou que “apenas ideias não mudam o mundo. O que muda o mundo são as lutas de massa. E precisamos dar um salto da luta de massa e organizar lutas internacionais contra o mesmo inimigo, seja Bayer, Monsanto ou Syngenta”.

Porém, nada seria significativo se não “recuperássemos a prática dos valores socialistas e humanitários, como a solidariedade e a indignação contra qualquer injustiça no mundo. Sem isso, não vamos construir nada de novo, e passaremos como uma geração pela terra que não mudou nada”.

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