O Bairro Amarelo e o Patrimônio Cultural Indígena

Colaboração: Eleonora de Paula – Funai

O Bairro Amarelo, um grande conjunto habitacional localizado em Hellesdorf, Alemanha mudou seu aspecto melancólico com o grafismo das mulheres indígenas Kadiwéu na grande reforma urbana, após a derrubada do Muro de Berlim. A transformação do bairro foi uma reivindicação dos próprios moradores que queriam a alegria da América Latina como nova identidade para a moradia.

Várias propostas foram apresentadas e o escritório de São Paulo, Brasil Arquitetura foi o vencedor com um projeto onde incluía os desenhos de seis mulheres Kadiwéu transformados em azulejos, que alegram até hoje as fachadas dos prédios do bairro.

A remodelação do Bairro Amarelo de certa forma está implícita na proposta de difusão e revitalização da cultura material dos indígenas Kadiwéu, Terena e Kinikinawa da Coordenação Regional da FUNAI de Campo Grande, ao realizar o projeto de Capacitação em Cerâmica e Cestaria voltado para a geração de renda e sustentabilidade nas Aldeias Barro Preto, Porto Murtinho, São João, Cachoeirinha, Miranda e Lalima.

O projeto surgiu a partir dos diagnósticos realizados durante a pesquisa para o Relatório da Cultura Material Terena (2012) e o Panorama Atual da Cerâmica Kadiwéu (2013), ambos aprovados pelo Museu do Índio do Rio de Janeiro. A informante do Catálogo da Cerâmica Kadiwéu foi Saturnina da Silva, uma das ceramistas do projeto de transformação do Bairro Amarelo.

Dona Saturnina relembra da viagem com alegria e diz que foi proveitosa e tanto os moradores do bairro como os alemães em geral receberam muito bem o grupo de ceramistas. Nessa viagem tiveram a oportunidade de visitar o museu (Museum fur Volkerkunde, Staatliche Museum zu Berlim), onde conheceram a coleção de cerâmicas Kadiwéu coletadas por Guido Boggiani, em 1892. Disse ainda que alguns padrões decorativos vistos nessa cerâmica antiga foram depois aplicados nas peças modernas por algumas das ceramistas.

As atividades do projeto promoveram a transversalidade das questões de gênero e geracionail, a iniciativa conforme o técnico Romulo Cabral de Sá, um dos responsáveis pela execução do projeto, tem tudo para se firmar pela receptividade, atraindo mulheres de todas as faixas etárias e acima de tudo, por toda matéria prima ser encontrada na região com a comercialização receptiva na cidade de Bonito/MS e lojas de artesanato ao longo da BR – 262, rota de turismo para o Pantanal.

A Cerâmica Kinikinawa

O projeto possibilitou conhecer mais sobre o povo Kinikinau, que se declarava Terena por imposição do extinto Serviço de Proteção ao Índio – SPI, quando eram oriundos, originalmente do Chaco Paraguaio, sendo registrados como extintos pelos antropólogos Darcy Ribeiro e Roberto Cardoso de Oliveira. Atualmente são reconhecidos Kinikinawa e sua cultura material se assemelha à Terena, no entanto a cerâmica que praticam apresenta características mais próximas dos Kadiwéu.

A oficina com os Kinikinawa foi realizada na Aldeia São João da Terra Indígena Kadiwéu de Porto Murtinho com a participação de jovens que se preparam para mutirões de produção e aperfeiçoamento de estoques para a venda.

O acervo do conhecimento Terena

A partir da pesquisa para o “Relatório da Cultura Material Terena em Miranda/MS” se teve conhecimento de que nas aldeias da Terra Indígena Cachoeirinha estão as artesãs e artesãos responsáveis pela cultura material Terena em seus aspectos mais tradicionais, especialmente, a confecção da cerâmica e da arte da confecção de tecidos em algodão em tear vertical. Foi possível registrar cerca de 30 ceramistas atuantes e a necessidade de estimular as novas gerações para dar continuidade à arte que é transmitida em linha direta pelo lado feminino entre as famílias indígenas.

A Terra Indígena Lalima abriga as artesãs e artesãos especialistas por alguns itens fundamentais da cultura Terena como a cestaria em taboa e pindó, os ornamentos e os trajes especiais das danças tradicionais. As oficinas de ornamentos e cestarias foram realizadas nas Aldeias Lalina e Passarinho com a participação significativa de jovens. Vale ressaltar a redução de falantes da língua Terena, apesar do esforço dos professores indígenas, com a realização dessas oficinas, se espera, segundo Rômulo, a geração de renda, o empreendedorismo e ainda o ressurgimento da língua materna.

Os técnicos da Coordenação Regional de Campo Grande lamentam a perda do servidor Eduardo Inagaki em 2014, um dos idealizadores do projeto, que infelizmente não pode compartilhar com a equipe da receptividade do trabalho com os indígenas.

Foto: Patrik Adam Alves Pinto/Funai

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Ana Beatriz Lisboa.

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