A triste realidade da Saúde Indígena no Brasil, por Paulo Daniel Moraes

Dados divulgados pela coordenadora do Distrito Sanitário Indígena do Leste de Roraima perante mais de 1.200 lideranças indígenas presentes na 44ª Assembleia Geral do CIR: a SESAI conta hoje com um orçamento de mais de Um Bilhão de Reais para assistência à saúde das comunidades indígenas, dos quais 650 Milhões vão para recursos humanos (em grande parte repassados para somente três grandes convênios com Ongs escolhidas sem nenhuma transparência). No mesmo evento foi apresentado o orçamento total disposto pela FUNAI em 2014: 170 Milhões de Reais, para políticas de regularização e gestão das terras indígenas em todo o país, o que demonstra claramente as prioridades e artimanhas utilizadas pelo governo federal no uso do dinheiro público.

Um retrato perfeito de como são gastos os recursos da Saúde Indígena foi revelado nos números da execução do orçamento do DSEI Leste de Roraima. Além dos 44 Milhões (!) disponíveis para pagamento de recursos humanos, existem 22 Milhões disponíveis para custeio, que são quase integralmente utilizados em apenas dois contratos milionários com empresas escolhidas: 11 Milhões por ano para um contrato de aluguel de veículos e 9 Milhões por ano para aquisição de horas de voo. Sobram 2 ou 3 Milhões para todas as demais necessidades do distrito, os quais no ano passado foram em sua maior parte contingenciados pelo governo!

O orçamento anual do DSEI Leste de Roraima desde a sua criação até o ano de 2008, quando boa parte das ações de assistência estiveram a cargo de uma parceria do governo com o Conselho Indígena de Roraima, nunca ultrapassou o total de 14 Milhões de Reais, suficientes para alcançar indicadores de saúde em grande parte superiores aos atuais, além de manter equipes multiprofissionais de saúde, promover a capacitação continuada e a certificação pelo MEC de mais de 400 Agentes Indígenas de Saúde, Agentes Indígenas de Endemias, Saneamento e Saúde Bucal, Microscopistas Indígenas, Conselheiros Indígenas, e o intercâmbio de Parteiras Tradicionais Indígenas e promoção de efetivo controle social em todas as regiões do distrito.

Desde o ano de 2009, nenhum posto de saúde foi construído pela SESAI no distrito, as ações de saneamento básico e abastecimento de água são praticamente inexistentes, os equipamentos como mobiliários, microscópios, radiofonias, gabinetes odontológicos, balanças antropométricas, e até mesmo estetoscópios, aparelhos de pressão e materiais de curativo adquiridos há mais de dez anos se deterioram e não são repostos, por falta de orçamento! Uma das maiores queixas das lideranças é a falta de medicamentos essenciais e materiais médicos nos postos de saúde, além da total paralisação dos programas de formação de profissionais indígenas, os quais nunca haviam sido interrompidos no período de 1994 até 2008!

A coordenadora do distrito pediu de forma categórica ao Senador Telmário Mota, eleito recentemente pelo estado de Roraima e participante da mesma mesa de debates, que se empenhasse para aumentar este orçamento que ela considera insuficiente para as necessidades do distrito. A resposta do senador, atendendo também às críticas contundentes e unânimes feitas pelas lideranças indígenas de todo o estado de Roraima foi, no entanto, o compromisso de se empenhar de todas as formas para que este dinheiro possa finalmente chegar até as comunidades, impedindo que se perca nestes contratos milionários e sem transparência. O senador indígena revelou com indignação que foi ele também procurado por representantes de empresas interessadas em utilizar os recursos milionários da saúde indígena para interesses privados.

Boa Vista, 28 de março de 2015.

Paulo Daniel Moraes é médico sanitarista.

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