Estudantes negros/as, racismo e saúde mental

*Emanuelle Goes – População Negra e Saúde

Tiago Marley, estudante negro do curso de graduação em Filosofia na Unifesp, se suicidou, causa básica da morte foi racismo. O racismo é um fenômeno que atinge frontal e letalmente a população negra em todos os lugares.

Quando li a noticia sobre a morte de Tiago me recordei em seguida, de uma atividade que participei na Escola de Enfermagem da UFBA sobre Desigualdades de Gênero e raça e saúde, na abordagem do assunto poderia ter falado sobre acesso das mulheres negras aos serviços de saúde, no entanto conduzir a minha fala sobre a saúde dos/das estudantes negros/as cotistas. Pois, a luta diária contra a opressão racial e o racismo institucional na Universidade possivelmente causa ou causará os danos à saúde mental desses/as jovens.

A permanência dos/das cotistas na Universidade precisa ser garantida com o suporte emocional, na escuta da vida em muitos diálogos com militantes do movimento negro e de mulheres negras ouvir relatos de humilhação constante, alem de ter que provar o tempo inteiro que é digno daquele lugar de conhecimento. Por conta dessas coisas muitos deles/as adiaram ou desistiram de permanecer neste espaço de negação e higienista/branco.

Para muitos a academia é um momento de encontro com o conhecimento e com a pesquisa, alem da definição de sua profissão para a vida inteira, muitas vezes, mas como um/a estudante negro/a pode vivenciar essa experiência se todos os dias precisam lutar contra o status quo que a sociedade racista impôs a população negra. E a academia em primeira instancia ainda é um espaço de negação da presençanegra nos assentos do conhecimento. Recentemente vimos como o curso de Arquitetura da UFBA recepcionou os calouros na entrada da Faculdade com um grande boneco negro enforcado. Veja-Trote na UFBA gera debate sobre racismo simbólico.

Mesmo na Enfermagem curso do qual sou egressa e hoje professora, que em certa medida tem um numero razoável de estudantes e professoras negras, o pensamento eurocêntrico não permite ultrapassar a barreira das desigualdades raciais e do racismo, mesmo sendo a maioria, seguindo neste sentido a lógica do nosso País. Com isso me recordei de uma fala de Ângela Davis que ela diz “O desafio do século XXI não é reivindicar oportunidades iguais para participar da maquinaria da opressão, e sim identificar e desmantelar aquelas estruturas nas quais o racismo continua a ser firmado” (GELEDÉS).

A permanência dos/as estudantes negros/as cotistas para alem do suporte econômico, precisa ser levado em consideração e com a mesma importância o suporte emocional. Dizem que o suicídio é um ato de fraqueza, dever ser. No entanto é preciso muita força, inclusive coletiva, pois todos os dias estes estudantes entram em um espaço, onde sua presença é negada, o seu existir é negado, então qual o peso disso?

Sou professora e pesquisadora, e no meu caminhar fico com olhos abertos, pelo menos tento, para que possa acolher, dar a mão, o braço e um abraço em tantos jovens parecidos com Thiago.

Este texto vai como um desabafo, em não ter segurado a mão de Tiago e vai para as minhas colegas professoras pesquisadoras negras, que para alem da produção cientifica, vamos ficar atentas e cuidarmos das nossas e dos nossos a caminhar neste lugar tão cheio de espinhos que é a Universidade.

Leia mais: Nota de pesar (sobre Tiago Marley)

**Blogueira, Enfermeira, Odara Instituto da Mulher Negra, Doutoranda em Saúde Pública/UFBA

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