“Escândalo: o MinC cancela o evento Brasil Indígena”

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Foto: Renato Soares

O MinC cancelou o evento “Brasil Indígena”. Surpresa?

Índio é Nós

No lançamento paulista de Índio é Nós, em abril de 2014, o editor Sérgio Cohn denunciou que foi impedido de publicar cantos ameríndios na revista Poesia Sempre, da Biblioteca Nacional, e que o Ministério da Cultura (MinC) estava bloqueando os projetos em prol dos povos indígenas.

Não nos passou desapercebido que os meios de comunicação, em geral, decidiram ignorar essa denúncia, inclusive um jornal de esquerda que fez uma matéria contra a campanha.

Neste mês de novembro, pediram-nos, do SESC, a divulgação deste amplo evento que aconteceria no SESC/SP, “Brasil Indígena – Histórias, Saberes e Ações”; vejam a impressionante programação, em que os  índios seriam os principais sujeitos.

Surpreendeu-nos e alegrou-nos que o MinC resolvesse apoiar um evento que incluía oficinas organizadas pelos índios, rodas de histórias, intervenções culturais, mostra de vídeo, feira de arte indígenas e a cerimônia de lançamento do Catálogo da 4ª Edição do Prêmio Culturas Indígenas, com a  presença de diversas etnias.

No entanto, o SESC informou-nos que o evento foi cancelado, pois o governo federal, subitamente, dele desistiu. A comunicação deu-se por telefonema da secretária de cidadania e diversidade cultural, Márcia Rollemberg (mensagens para ela).

No portal do SESC, ainda se pode ler programação, com o aviso de cancelamento. Vejam a elegante carta dos índios:

À SRA MÁRCIA ROLLEMBERG, SECRETÁRIA DA CIDADANIA E DA DIVERSIDADE CULTURAL/SCDC

O Colegiado Setorial de Cultura  dos Povos Indígenas, desde a sua renovação ocorrida em julho de 2013, tem procurado realizar algumas das metas do Plano Setorial de Cultura para os Povos Indígenas.  Entretanto a agenda construída pelo Colegiado em 2013, em parceria com a SCDC,  e apresentada sob a forma de Carta à então ministra Marta Suplicy, praticamente não saiu do papel. Nenhuma das propostas definidas e apresentadas ao Minc se transformaram em realidade.

Entre as várias propostas apresentadas e não realizadas neste período de um ano e meio de vigência do mandato do Colegiado destacamos:

a) A não realização do Edital dos Pontos de Cultura Indígenas pela Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural/SCDC, sendo que para este edital estava reservado o valor de R$ 3.000.000,00. Esta proposta, se realizada teria possibilitado nos aproximarmos da meta de implantar mais 300 pontos de cultura indígenas.

b) A não realização do Encontro Nacional dos Pontos de Cultura Indígenas, proposta aprovada  com o endosso da secretária Márcia Rollemberg durante a Teia Nacional da Diversidade, em maio de 2014, e em seguida cancelada pela SCDC.

c) A não criação de  editais específicos para povos indígenas no IPHAN, FUNARTE, IBRAM E SAV, todos órgãos setoriais do MinC. Estas propostas não avançaram porque não houve compromisso e mobilização  da SCDC para negocia-las com os referidos órgãos setoriais mesmo com o endosso da ministra Marta Suplicy.

d) A não realização de cinco cursos de formação continuada de gestores indígenas para a gestão de projetos culturais.  Não houve nenhuma mobilização da SCDC para realizar estes cursos.

Na última reunião do Colegiado Setorial de Cultura dos Povos Indígenas, ocorrida nos dias 26 e 27 de Agosto de 2014, aprovamos diversas moções objetivando propor encaminhamentos de algumas ações que propiciassem, sobretudo, a nossa preparação e articulação com as lideranças das organizações indígenas brasileiras para defendermos nosso ponto de vista e propostas face a nova direção do MinC que em breve será definida.

Neste contexto aprovamos e apoiamos a realização do evento de lançamento do Catálogo do Prêmio Culturas indígenas 4a Edição. Este evento que está sendo denominado Brasil Indígena: História, Saberes e Ações inclui a realização do nosso II Seminário Nacional de Culturas Indígenas e previsto para acontecer entre os dias 15 a 19 de Dezembro de 2014, em São Paulo.  A proposta aprovada previu a presença dos membros titulares e suplentes do Colegiado Setorial de Cultura dos Povos Indígenas, os 100 premiados do Premio Culturas Indígenas 4a Edição, lideranças das organizações regionais da APIB e lideranças históricas do movimento indígena.

Este evento está sendo articulado em parceria com o SESC-SP que bancou a produção do Catálogo da 4a Edição do Prêmio e uma parte significativa do próprio evento cuja programação inclui, além das rodas de conversa do II Seminário Nacional das Culturas Indígenas, a realização de intervenções culturais de grupos de canto e dança das cinco regiões brasileiras, oficinas culturais, rodas de história, apresentações de vídeos indígenas, uma Feira de Artes Indígenas e a cerimônia de lançamento do Catálogo, ocasião em que pretendemos apresentar uma Carta direcionada ao governo federal e, especialmente, ao Ministério da Cultura, contendo as nossas demandas e propostas para os próximos quatro anos desta nova gestão. Especificamente pretendemos discutir e propor as metas do Plano Setorial de Cultura para os Povos Indígenas.

Durante a reunião do Colegiado Setorial a SCDC, na pessoa de Márcia Rollemberg, comprometeu-se em empenhar os recursos necessários para realizar o evento, aproveitando parte do  recurso já citado de R$ 3.000.000,00 que não foi executado para realizar o Edital de Pontos de Cultura Indígena. Na parceria coube ao MinC, entre outros papéis, a função de garantir o traslado ida e volta de seu local de origem a São Paulo, a hospedagem e alimentação dos indígenas convidados.

O Colegiado formalizou sua posição de apoio a este evento através de moção que segue anexa a este documento.

Entretanto, mais uma vez, como das outras vezes já citadas neste documento,  a SCDC não está realizando a mobilização necessária para garantir a realização deste evento revelando claramente o seu  descompromisso, na prática,  com a realização da agenda do Colegiado Setorial de Cultura dos Povos Indígenas. Ou seja, apesar do compromisso retórico, sempre que chega a hora das ações ou atividades acontecerem, a SCDC não se compromete, protela, prioriza outras ações e, finalmente,  cancela as atividades acordadas com o Colegiado. Isto tem sido a tônica de nossa relação desde Julho de 2013.

Diante desta possibilidade, nós, membros do GT do Colegiado Setorial de Cultura dos Povos Indígenas, coerentes com as decisões tomadas na última reunião do Colegiado, e certos de que expressamos a posição de todos os membros do Colegiado a quem estamos encaminhando este documento, reivindicamos:

1. Que seja garantida, na data de 15 a 19 de Dezembro de 2014, em a realização do evento Brasil Indígena: História, Saberes e Ações que inclui a realização do II Seminário Nacional das Culturas Indígenas e do conjunto de atividades culturais que culminará no lançamento do Catálogo do Prêmio Culturas Indígenas 4a Edição.

2. Que o recurso reservado para a realização do edital dos pontos de cultura indígena e cancelado pela SCDC, à revelia da vontade do Colegiado Setorial de Cultura dos Povos Indígenas, seja realmente utilizado para garantir a realização do evento, conforme pactuado na última reunião do Colegiado Setorial das Culturas Indígenas.

3. Que seja garantida a participação de representantes das comunidades e organizações indígenas premiadas, das lideranças das organizações regionais da APIB, das lideranças históricas do movimento indígena e dos membros titulares e suplentes do Colegiado Setorial de Cultura do Povos Indígenas.

Entendemos que o eventual cancelamento ou esvaziamento do evento será mais uma comprovação prática  do descompromisso da atual gestão da SCDC-MINC com a agenda firmada entre o Colegiado Setorial de Cultura para os Povos Indígenas e esta Secretaria.

Esperamos que isto não aconteça e que o compromisso retórico da SCDC transforme-se desta vez em um compromisso real e efetivo com a agenda das Culturas Indígenas.

GRUPO DE TRABALHO DO COLEGIADO SETORIAL DE CULTURA DOS POVOS INDÍGENAS.

No entanto, a agenda foi descumprida mesmo, e canceladas a cidadania e a diversidade cultural. O que não é de espantar: para os índios, deve-se lembrar que a Constituição e o estado de direito também foram cancelados. É a denúncia do filme de Nayana Fernandez, “Índios Munduruku: Tecendo a Resistência“, que documenta a luta dos Mundurukus para sobreviver, apesar dos projetos desenvolvimentistas do governo.  Texto recente de Eliane Brum documenta a subordinação dos direitos originários desse povo aos interesses das grandes empreiteiras: “Como rasgar a Constituição e massacrar índios, segundo o governo Dilma Rousseff“.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Naya Porã.

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