Convocada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, uma marcha pedindo reformas populares e criticando o discurso ultraconservador partiu do Masp, na avenida Paulista, atravessou o rico bairro dos Jardins e terminou na praça Roosevelt, em São Paulo, na noite desta quinta (13).
Contando com a participação de organizações sociais, sindicatos e partidos políticos de esquerda (do governo e da oposição), o ato mando um recado à Dilma: se diminuir os recursos voltados a programas sociais e priorizar as demandas do mercado financeiro em detrimento à promoção de programas que garantam a dignidade aos trabalhadores, os movimentos sociais vão parar o país. O ato também atacou os pedidos de impeachment de grupos descontentes com o resultado das eleições.
Guilherme Boulos, coordenador do MTST, encerrou a manifestação afirmando que este foi o maior ato em muitos meses em São Paulo, reunindo mais de 20 mil pessoas (policiais presentes falaram, antes do início da caminhada, em 12 mil). E que não haverá “intervenção militar”, apoiada por ultraconservadores, mas “intervenção popular”, para garantir que o governo seja pressionado a fazer as reformas que o país precisa, como as reformas urbana e política.
Antes de chegar à manifestação, um colega jornalista me alertou que ela poderia estar esvaziada por conta da chuva que caiu, na tarde e noite de ontem, em São Paulo – para a alegria do reservatório da Cantareira. Se é verdade que a água e o frio diminuíram os presentes, então a manifestação, que já foi grande, seria ainda maior.
Erra quem lê a manifestação desta quinta como um ato governista. A maioria dos discursos não defendia Dilma, pelo contrário, atacava o que chamavam de “golpismo” institucional ou midiático mas, ao mesmo tempo, pressionavam pesadamente o governo por mudanças. Ou seja, deixaram claro que a presidente terá o apoio popular se fizer um governo mais à esquerda do que seu primeiro mandato, compensando um Congresso Nacional que ficou mais conservador após as eleições, mas não terá trégua caso contrário.
Como já disse aqui, petistas ou pessoas que não são ligadas ao partido, mas defendem bandeiras de esquerda e enxergavam na continuidade do mandato uma possibilidade maior de diálogo para essas pautas, levaram, junto com organizações e movimentos sociais, a campanha eleitoral ao espaço público e às redes sociais. Conquistaram votos como o PT fazia antigamente antes do partido se apegar demais ao poder e se apaixonar pelo reflexo no espelho.
Mas essa militância histórica, que defende a efetivação dos direitos humanos e os próprios movimentos sociais foram, por vezes, ignorados ou nem mesmo atendidos nos últimos quatro anos. E, agora, voltam às ruas para deixar claro que o apoio não foi à Dilma para à possibilidade de um governo que atendesse às pautas populares e que melhorasse a qualidade de vida no campo e na cidade.
O duplo recado desta quinta pode ser simplificado na forma de duas cantorias dos manifestantes durante a marcha, que teve forró, samba e rap como trilha musical. “Ou fazem as reformas ou paramos o Brasil” (voltado ao governo federal) e “Pisa ligeira, pisa ligeiro, quem não aguenta as formigas não atiça o formigueiro” (voltado às movimentações ultraconservadoras, que partem principalmente de setores da elite).
Por fim, é raro uma marcha atravessar a alameda Jaú, uma das principais ruas do nobre bairro dos Jardins. O trajeto foi, claramente, uma cutucada.
Fiquei surpreso com o tamanho da proteção policial ao hotel Renaissance, com viaturas, motocicletas e policiais. Não duvidaria se, para proteger o local, um bairro inteiro tenha ficado descoberto. Os manifestantes atacaram violentamente com Luiz Gonzaga e um forró a céu aberto e sob chuva. Foi duro, mas o hotel deve sobreviver.
Mas relevante mesmo foi o que ouvi, de soslaio, passando sem ser notado, de um policial para outro com um sorriso no canto da boca: “Eu vi minha tia. Ela tá aí junto com o pessoal”.