Na Folha
Antes mesmo de alguma informação do inquérito, em início na Polícia Federal, sobre o “vazamento” da acusação a Lula e Dilma Rousseff pelo doleiro Alberto Youssef, não é mais necessário suspeitar de procedimentos, digamos, exóticos nesse fato anexado à eleição para o posto culminante deste país. Pode-se ter certeza.
Na quarta 22, “um dos advogados” de Youssef “pediu para fazer uma retificação” em depoimento prestado na véspera por seu cliente. “No interrogatório, perguntou quem mais sabia (…) das fraudes na Petrobras. Youssef disse, então, que, pela dimensão do caso, não teria como Lula e Dilma não saberem. A partir daí, concluiu-se a retificação.” Ou seja, foi só a acusação.
As aspas em “vazamento”, lá em cima, são porque a palavra, nesse caso, sem aspas será falsa. As outras aspas indicam a origem alheia de frases encontradas a meio de uma pequena notícia, com a magreza incomum de uma só coluna no estilo em tudo grandiloquente de certos jornais, e no mais discreto canto interno inferior da pág. 6 de “O Globo”, de 29/10. Para precisar melhor: abaixo de um sucinto editorial com o título “Transparência”, cobrando-a da Petrobras.
Já no dia seguinte à “retificação”, “Veja” divulgou-a, abrindo o material ao uso que muitos esperaram por parte da TV Globo na mesma noite e logo por Folha, “O Estado de S. Paulo” e “Globo”. Nenhum dos três valeu-se do material. Se o fizessem, aliás, Dilma, Lula e o PT disporiam de tempo e de funcionamento judicial para uma reação em grande escala, inclusive com direito de resposta em horário nobre de TV. O PT apenas entrou com uma ação comum contra “Veja”.
O que foi evitado a dois dias da eleição, foi feito na véspera. A explicação publicada, e idêntica em quase todos os que se associaram ao material da revista, foi de que aguardaram confirmar o depoimento de Youssef. Àquela altura, Lula, Dilma e o PT não tinham mais tempo senão para um desmentido convencional, embora indignado, já estando relaxados pelo fim de semana os possíveis dispositivos para buscarem mais.
“O Globo” não dá o nome de “um dos advogados”. Até agora constava haver um só, que, sem pedir anonimato, foi quem divulgou acusações feitas em audiências judiciais, autorizado a acompanhá-las, que nem incluíam o seu cliente. Seja quem for o requerente, pediu e obteve o que não houve. Retificação é mudança para corrigir. Não houve mudança nem correção. E o pedido do advogado teve propósito explícito: os nomes de quem mais sabia da prática de corrupção na Petrobras. Uma indagação, com o acusado preso e prestando seguidos depoimentos, sem urgência. E sem urgência no processo, insuficiente para justificar uma inquirição especial.
O complemento dessa sequência veio também na véspera da eleição, já para a tarde. Youssef foi levado da cadeia para um hospital em Curitiba. O médico, que se restringiu a essa condição, não escondeu nem enfeitou que encontrara um paciente “consciente, lúcido e orientado”, cujos exames laboratoriais “estão dentro da normalidade”. Mas alguém “vazou” de imediato que Youssef, mesmo socorrido, morrera por assassinato.
O boato da queima de arquivo pela campanha de Dilma ia muito bem, entrando pela noite, quando alguém teve a ideia de telefonar para a enlutada filha da vítima, que disse, no entanto, estar o papai muito bem. O jornalista Sandro Moreyra já tinha inventado, para o seu ficcionado Garrincha, a necessidade de combinação prévia com os russos.
A Polícia Federal suspeita que Youssef foi induzido a fazer as acusações a Dilma e Lula, entre o depoimento dado na terça, 21, e a alegada “retificação” na quinta, 23. Suspeita um pouco mais: que se tratasse de uma operação para influir na eleição presidencial.
A Polícia Federal tem comprovado muita e crescente competência. Mas, nem chega a ser estranho, jamais mostrou resultado consequente, quando chegou a algum, nos vários casos de interferência em eleições. Não se espere por exceção.