Líder comunitária denuncia intimidação policial na Favela do Moinho, em SP

Foto: Movimento Moinho Vivo
Foto: Movimento Moinho Vivo

Disfarçados de assistentes sociais, policiais militares foram à favela e acusaram, sem provas, ativista social de ter cometido homicídio

André Caramante, Da Ponte.org

Moradores da Favela do Moinho, no centro de São Paulo (SP), acreditam que a dona de casa Alessandra Moja Cunha, 30 anos, uma das lideranças das cerca de 450 famílias (3 mil pessoas) da comunidade, foi alvo de uma operação policial clandestina, na manhã desta segunda-feira (13/10).

A suspeita dos moradores do Moinho é que a operação policial contra Alessandra seja uma tentativa de inibir as articulações de Alessandra por possíveis melhorias para a favela, que fica embaixo do viaduto Engenheiro Orlando Murgel, ligação entre as avenidas Rudge e Rio Branco, no centro da capital.

Há um mês, 100 moradores da Favela do Moinho fizeram um protesto e interditaram o trânsito em algumas vias da região central de São Paulo. Há anos, eles reivindicam a regularização da energia elétrica, água e esgoto na comunidade.

Boletim de ocorrência sobre abuso de autoridade contra líder comunitária da Favela do Moinho, no centro de SP
Boletim de ocorrência sobre abuso de autoridade
contra líder comunitária da Favela do Moinho, no centro de SP

A detenção

Por volta das 11h30 de segunda-feira, três homens foram à Favela do Moinho e, se passando por assistentes sociais, pediram para ser levados até a casa de Alessandra, na comunidade. Assim que ficaram frente à frente com a líder comunitária, os três homens, todos com roupas comuns, passaram a se identificar como policiais civis.

Os três homens disseram para Alessandra ter um mandado de prisão contra a ela, que seria suspeita pela morte de um morador vítima de um dos vários incêndios que atingiram a favela nos últimos anos.

Quando já estava na parte externa da Favela do Moinho, Alessandra foi surpreendida com a chegada de alguns policiais militares, chamados pelos 3 homens que a tiraram de sua casa e a levaram para o 77º Distrito Policial (Santa Cecília).

Somente ao chegar à delegacia, uma policial militar ligada ao grupo que levou Alessandra fez uma pesquisa e constatou não existir nenhuma ordem de prisão contra a líder comunitária.

Diante da inexistência de qualquer acusação contra Alessandra, os policiais militares do 13º Batalhão (localizado a pouco mais de 1 quilômetro da Favela do Moinho) apenas preencheram uma simples ficha com os dados da líder comunitária e disseram para ela ir embora.

Como havia a suspeita de que a ação dos policiais podia ser uma tentativa de intimidação, Alessandra acionou o Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e, somente após a intervenção do defensor público Raul Carvalho Nin Ferreira, o caso foi devidamente registrado pelos policiais civis do 77º DP.

O delegado André Cássio G.A.B. Gonçalves, do 77º DP e responsável pelo boletim de ocorrência sobre a operação contra Alessandra, descreveu os 5 policiais militares que a detiveram como “desconhecidos“. O caso foi registrado como abuso de autoridade.

Procurado na tarde desta terça-feira (14/10) pela reportagem, o secretário da Segurança Pública da gestão de Geraldo Alckmin (PSDB), Fernando Grella Vieira, não se manifestou sobre a denúncia dos moradores da Favela do Moinho de que a líder comunitária do lugar foi alvo de uma operação policial clandestina.

As perguntas não respondidas pelo secretário de Segurança Pública de São Paulo,  Fernando Grella:

1 – O que a Secretaria da Segurança Pública pode esclarecer sobre os fatos registrados no boletim de ocorrência 3750/2014, do 77º DP?

2 – As corregedorias das polícias Civil e Militar foram acionadas para investigar o caso?

3 – Existe alguma investigação na Polícia Civil de SP contra Alessandra Moja Cunha?

4 – Quem são as pessoas descritas no boletim de ocorrência 3750/2014, do 77º DP, responsáveis por levar Alessandra Moja Cunha para a delegacia?

5 – Por qual motivo Alessandra Moja Cunha foi levada ontem (13.out.14) para o 77º DP?

6 – Por qual motivo o delegado André Cássio G.A.B. Gonçalves não registrou no boletim de ocorrência 3750/2014, do 77º DP, a identificação completa das pessoas que conduziram Alessandra Moja Cunha à delegacia?

Por meio de nota oficial enviada por sua assessoria de imprensa, no início da noite desta terça (14/10), Fernando Grella informou:

“A Secretaria da Segurança solicita que a senhora Alessandra Moja Cunha formalize nas Corregedorias das Polícias Civil e Militar as suspeitas de que foi vítima de uma ação policial clandestina e que houve incorreções na elaboração do boletim de ocorrência registrado no 77º Distrito Policial para que os supostos erros e ações policiais possam ser apurados. A SSP reafirma que não se compactua com o desvio de conduta de policiais. Informa, ainda, que foi aberto inquérito policial pelo 77º DP para apurar a denúncia de abuso de autoridade feita pela Defensoria Pública.”

Após o envio da nota do secretário da Segurança Pública, a reportagem fez novas perguntas ao chefe das polícias de SP, igualmente não respondidas:

7 – Se existe um inquérito policial aberto no 77º DP, pelo crime de abuso de autoridade, é a vítima quem precisa ir atrás da corregedoria?

8 – Não cabe ao presidente do inquérito [delegado] provocar as corregedorias?

9 – Quem são os PMs envolvidos no caso, por favor? Parte deles estava na viatura M-13.221.

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