CNV e IML-DF identificam desaparecido político morto há 43 anos: Epaminondas Gomes de Oliveira

Foto de Epaminondas, já idoso, entregue à CNV pela família do desaparecido. Foto: Arquivo da família de Epaminondas Gomes de Oliveira
Foto de Epaminondas, já idoso, entregue à CNV pela família do desaparecido. Foto: Arquivo da família

Primeiro desaparecido identificado pela CNV, Epaminondas Gomes de Oliveira, morto em um hospital do Exército em 1971, estava enterrado em Brasília, mas família nunca teve acesso a seus restos mortais

CNV

Laudo solicitado pela Comissão Nacional da Verdade ao Instituto Médico Legal de Brasília comprovou que os restos mortais exumados do Cemitério Campo da Esperança, em 24 de setembro de 2013, são do sapateiro e líder comunista maranhense Epaminondas Gomes de Oliveira, morto aos 68 anos, sob custódia do Exército, no antigo Hospital de Guarnição de Brasília, atual Hospital Militar de Área de Brasília, em 20 de agosto de 1971.

Epaminondas, que também foi prefeito em sua cidade natal, Pastos Bons (MA), é o primeiro desaparecido político identificado pela CNV.

Epaminondas foi preso em um garimpo paraense, em 7 de agosto de 1971, durante a Operação Mesopotâmia, realizada para prender lideranças políticas da oposição na região do Bico do Papagaio (divisa tríplice entre Pará, Tocantins, então Goiás, e o Maranhão), com o objetivo de tentar detectar focos guerrilheiros na região.

Segundo depoimentos colhidos pela CNV, após ter sido torturado numa área do DNER localizada na estrada entre Porto Franco, cidade onde vivia, e Imperatriz, ambas no MA, Epaminondas foi levado a Brasília, onde permaneceu preso, foi novamente torturado no Pelotão de Investigações Criminais (PIC), e morreu, no dia 20 de agosto de 1971, aos 68 anos, sob a custódia do Exército, no antigo Hospital de Guarnição de Brasília, atual Hospital Militar de Área de Brasília.

Ao todo, a CNV colheu 41 depoimentos sobre o caso Epaminondas e a Operação Mesopotâmia em Brasília, no Maranhão e em Tocantins.

Segundo os testemunhos, os presos pela Operação Mesopotâmia em Porto Franco e Tocantinópolis foram colocados em um caminhão de carroceria aberta, que passou pelas principais ruas da cidade, para que fossem vistos por todos. Depois, oficiais levaram os presos para um acampamento do DNER à beira da estrada entre Porto Franco e Imperatriz. Lá, Epaminondas, tido como o líder do grupo, foi o que mais sofreu, recebendo choques e espancamentos. Os militares, segundo os depoimentos, obrigaram os companheiros de Epaminondas a se perfilarem em corredor polonês e o agredir, com socos e tapas.

No PIC, Epaminondas voltou a ser torturado com choques e socos. O cabo do Exército reformado Anísio Coutinho de Aguiar, nascido em Porto Franco, que teve aulas de reforço de português com Epaminondas, foi ouvido pela CNV em outubro de 2013 e afirmou ter visto Epaminondas preso em Brasília, já debilitado.

Epaminondas era próximo do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e posteriormente do Partido Revolucionário dos Trabalhadores (PRT), uma dissidência da Ação Popular (AP). Não há, contudo, informações que comprovem a participação de Epaminondas e de outros militantes comunistas de Porto Franco (MA) e da vizinha Tocantinópolis (TO) com a guerrilha ou ações armadas isoladas.

O único elo de ligação é que, em virtude de sua militância, Epaminondas e seu grupo teriam intermediado com o Partido Comunista a instalação em Porto Franco do médico João Carlos Haas Sobrinho, desaparecido na Guerrilha do Araguaia, que antes de engajar-se na luta armada viveu 20 meses na cidade, onde atuou como cirurgião.

Leia o relatório preliminar de pesquisa da CNV sobre o caso

Acesse a apresentação da CNV sobre o caso mostrada na audiência

Veja os vídeos apresentados pela CNV durante a audiência

EXUMAÇÃO EM 2013 – Os restos mortais de Epaminondas Gomes de Oliveira foram exumados, a pedido da CNV, em 24 de setembro de 2013, por equipe da Seção de Antropologia do Instituto Médico Legal de Brasília, que possui convênio com a Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP).

A CNV decidiu pedir a exumação após ter tido acesso a uma carta enviada pelo Exército à família, em 1971,indicando que Epaminondas havia morrido em Brasília, mas que seu corpo só poderia ser exumado depois de cinco anos. O documento informava, inclusive, o local de sepultamento e as coordenadas no cemitério Campo da Esperança.

Em diligência realizada no cemitério, consultando os arquivos, a CNV constatou que Epaminondas não teria sido enterrado no lote informado na carta enviada à família. Não se sabe se houve um equívoco ou a intenção de ocultar a informação dos familiares que, temerosos, decidiram não tentar a exumação antes, mas apoiaram desde o início a investigação da CNV e forneceram fotos do sapateiro e outros dados que foram fundamentais para os exames que foram realizados posteriormente.

LAUDO – O laudo, assinado pelos médicos legistas Aluísio Trindade Filho e Malthus Fonseca Galvão, e pela odontolegista Heloísa Maria da Costa, de fevereiro deste ano, conclui que os exames periciais antropológicos, documentais e testemunhais colhidos apontam “que o esqueleto humano exumado em 24 de setembro de 2013, da sepultura 135, da quadra 504 e do setor A do Cemitério Campo da Esperança, representa os restos mortais de Epaminondas Gomes de Oliveira”.

O laudo detalha os cinco principais pontos que permitiram aos legistas do IML concluírem que os restos mortais são de Epaminondas:

– Perfil Biológico: O perfil biológico obtido do esqueleto estudado, composto pelos parâmetros sexo, idade, altura e ancestralidade geográfica demonstrou compatibilidade plena com os dados disponíveis sobre Epaminondas. Os exames apontaram que o esqueleto é de um homem mestiço, medindo entre 1m65,5 e 1m72,5 e de idade superior a 60 anos. O certificado de reservista de Epaminondas, emitido em 1935, obtido pela família e entregue à CNV aponta que Epaminondas tinha 1m72 e era de “cor morena”;

– Sobreposição crânio fotográfica: Os peritos do IML de Brasília reconstituíram boa parte do crânio do esqueleto exumado e compararam imagens do crânio com a fotografia frontal de Epaminondas, já idoso, entregue pela família à CNV, e uma reprodução de fotografia de perfil esquerdo de Epaminondas, já preso pelo Exército, obtida pela CNV. As imagens foram decisivas para que o estudo comparativo demonstrasse “compatibilidade plena com o contorno do crânio observado nas fotografias do Sr. Epaminondas”;

– Restauração dentária: Na exumação de Epaminondas foram encontrados alguns dos dentes da vítima, entre eles o primeiro molar superior direito que apresentou compatibilidade com as informações prestadas por Inês da Costa Oliveira, nora de Epaminondas, durante série de depoimentos colhidos pela CNV e pelo médico legista Aluísio Trindade em diligência realizada na cidade de Porto Franco, no Maranhão, em 21 de outubro de 2013. Ela afirmou que Epaminondas “tinha um dente prateado atrás da presa (canino)”. Além disso, o ex-dentista prático Colemar Rodrigues do Egito, irmão de Rui Rodrigues do Egito, que atendia Epaminondas, confirmou que o material usado na prótese já era disponível nos anos 60 no Maranhão;

– Fitas no corpo: Na exumação foram encontradas fitas compatíveis com esparadrapo envolvendo os tornozelos e os punhos de Epaminondas, além de uma terceira fita, sobre o peito. As fitas confirmam que os restos mortais exumados são de uma pessoa que morreu em hospital e cujo corpo não pode ser preparado pela família, uma vez que não foram encontrados vestígios de que o corpo tenha sido vestido com uma calça para o enterro. O tronco estava vestido por uma camisa de cor amarela;

– Aspecto do esqueleto: os ossos quebradiços e entremeados por raízes demonstram que o enterro é muito antigo, sendo compatível com a data da morte de Epaminondas, ocorrida em 20 de agosto de 1971.

Segundo o laudo, a má qualidade do material ósseo, inclusive, não permitiu a extração de DNA em quantidade suficiente para que amostras pudessem ser comparadas com o DNA extraído de filhos e netos de Epaminondas pela Polícia Federal em Brasília no Maranhão. A ausência de DNA, entretanto, não impediu a identificação da vítima pelos dados antropológicos. Os restos mortais de Epaminondas não apresentavam lesões típicas de tiro ou trauma, o que não permitiu aos peritos ratificar, desmentir ou acrescentar elementos à causa mortis atestada pelo médico do Exército Ancelmo Schwingel: coma anêmico, choque, desnutrição e anemia.

Leia o laudo cadavérico

Leia o relatório de exumação

MARANHÃO – Ontem, no IML-DF, com a presença da família, os restos mortais foram preparados para o traslado e o sepultamento. Amanhã à noite (30), representantes da CNV e familiares de Epaminondas partem de Brasília com destino à Imperatriz com o caixão com os restos mortais do militante desaparecido recém-identificado. De Imperatriz, o caixão será levado por via-terrestre até Porto Franco, cidade onde a vítima viveu a maior parte de sua vida.

No domingo, às 14h, na Loja Maçônica Tiradentes 18 (rua Teixeira de Freitas, 118, Centro, Porto Franco-MA), a CNV apresentará as informações do caso Epaminondas a outros familiares do militante, moradores e autoridades de Porto Franco. Do local do evento, às 17h, sairá o cortejo até o cemitério Jardim da Saudade onde Epaminondas será enterrado ao lado da esposa, Avelina da Rocha, no jazigo da família.

Comissão Nacional da Verdade
Assessoria de Comunicação

Mais informações à imprensa: Marcelo Oliveira
(61) 3313-7324 | [email protected]

Acompanhe a CNV nas redes sociais:
www.facebook.com/comissaonacionaldaverdade
www.twitter.com/CNV_Brasil
www.youtube.com/comissaodaverdade

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.