PNGATI: Durante aula de campo, cursistas imergem na história e nos rituais dos Potiguara

Da esquerda para a direita: Sr. Joseci, cacique geral Sandro e Capitão Potiguara. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI
Da esquerda para a direita: Sr. Joseci, cacique geral Sandro e Capitão Potiguara. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

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A aula de campo, realizada no dia 20/08, iniciou com caminhada em direção ao terreiro sagrado dos Potiguara, localizado na aldeia São Francisco ou “aldeia Mãe”. O terreiro é formado por furnas (pequenas cavernas) que de acordo com os Potiguara, são os locais de morada dos encantados. No local, líderes, anciões e pajés compartilharam histórias sobre a luta pelo reconhecimento territorial e cultural.

Iniciando a roda de conversas, o cacique geral Sandro Barbosa falou da importância do fortalecimento da cultura e a identidade Potiguara, que fez com que o povo se mantivesse firme para reivindicar seus direitos. “Para ter saúde, felicidade, precisamos da nossa terra e da nossa cultura,  muita gente não sabe o significado de usar um colar de sementes, um cocar e maracá, mas nós sabemos”, disse. O cacique citou ainda que o esforço em manter a cultura viva, vem frente a diversas situações onde os Potiguara são expostos à cultura e a influencia não indígena. Um exemplo é o fato da área estar localizada muito próximo às grandes cidades, em épocas como o carnaval, a presença de turistas é muito intensa. 

Relataram também, os desafios de lidar com os canaviais de produção de açúcar e álcool, herança da época dos coronéis. Sr. Joseci, vice cacique da aldeia Três Rios, relembrou dos tempos difíceis, onde os latifundiários usurparam as terras tradicionais Potiguara. “O latifundiário colocava na cabeça do nosso parente, que trabalhar na cana era vantagem, mas era só para explorar a mão de obra, usurpar e destruir as nossas terras. A cana nos deixa doente, quando colocam fogo, a fumaça e a cinza é intensa, os animais fogem até para dentro de casa” contou. O monocultivo da cana traz consigo, segundo Sr. Joseci, além de conflitos sociais, o desmatamento, o assoreamento e a poluição dos rios. “Muitos Potiguara já não trabalham mais nos canaviais, hoje as famílias trocaram a cana pelo cultivo e coleta da mandioca, do feijão e de frutas como a jaca, caju, manga, mangaba e outros”, completou Sr. Joseci.

Os movimentos de autodemarcação e de retomada das terras Potiguara iniciaram a partir da década de 1980. De acordo com os presentes, eles mesmos abriram as picadas delimitando o seu território. “Nós não invadimos, nós retomamos as terras que sempre foram nossas, há mais de 500 anos”, disse a liderança Capitão Potiguara. Somente a partir de 1983 que de fato as terras Potiguara passaram a ser demarcadas pelo governo brasileiro. Hoje o território é composto pelas TI Potiguara, TI Jacaré de São Domingos e TI Potiguara de Monte-Mor.  “Esses 34 mil ha de terras custou muito sangue, tudo foi com muita luta”, afirmou Capitão.

Sr. Chico Potiguara. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI
Sr. Chico Potiguara. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

Sr. Chico, liderança e pajé, disse que o seu povo sempre lutou pela sobrevivência e reconhecimento, apesar de todas adversidades. “Naquela época tivemos muitos parentes torturados, presos, expulsos das suas casas, mas ficamos firmes, pedimos proteção para nossos ancestrais, pois o índio dá a vida, dá o seu sangue pelo que é dele. Nós somos como sementes, que seguem sendo plantadas e assim vamos permanecer até quando nosso deus Tupã permitir.”, afirmou.  A liderança compartilhou a sua indignação em relação ao preconceito contra os povos indígenas. “O índio não pediu para nascer índio. O índio já nasce com suas origens e tradições. E mesmo assim permanece a discriminação ainda hoje, fico muito chocado com isso. É uma vergonha que os nossos governantes brasileiros permitem que isso aconteça conosco”, protestou.

A roda de conversa foi finalizando com uma preocupação demonstrada por todos, sobre qual o futuro dos povos indígenas no Brasil. “Estamos preocupados com o nosso futuro, não sabemos o que virá pela frente, estão querendo mudar as leis que nos defendem, estão querendo acabar com nossos povos, mas mesmo assim vamos continuar lutando”, afirmou Sr. Chico.

Ritual dentro das furnas do terreiro sagrado. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI
Ritual dentro das furnas do terreiro sagrado. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

Ritual nas furnas e as danças

Logo após ouvirem o emocionado depoimento dos líderes e anfitriões Potiguara, os cursistas presenciaram um ritual que iniciou dentro das furnas do terreiro sagrado. O pajé Sr. Chico Potiguara fez os benzimentos nos convidados que entraram nas furnas enquanto os outros líderes puxavam o toré. Em seguida o ritual passou a ser conduzido no terreiro, já com a presença dos cursistas.

Cacique Nathan Galdino apresentando as matas de tabuleiro. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI
Cacique Nathan Galdino apresentando as matas de tabuleiro. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

Visita às áreas de sustentabilidade e belezas naturais da área Potiguara

Continuando a visita de campo, cacique Nathan Galdino levou a todos para conhecer uma vasta área de cobertura florestal chamada de mata de tabuleiro, mantida e preservada pelos Potiguara há muitos anos. Esses locais também são chamados de “futaínha”, possuem solo úmido por haver minas de água. Nessas áreas são endêmicas diversas espécies de plantas medicinais, como o alecrim do mato e ainda espécies frutíferas como a mangaba, caju, araçá, bati e outros.

O outro ponto visitado foi o Rio do Gozo, um riacho de águas cristalina protegido dentro de uma densa mata. De acordo com cacique Nathan, existe uma grande preocupação dos povos Potiguara em manter o riacho preservado por se tratar de uma das nascentes que forma o Sinimbú, rio que de grande importância para o ecossistema e os povos da região.

As belezas do Rio do Gozo, na TI Potiguara. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI
As belezas do Rio do Gozo, na TI Potiguara. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

O campo foi finalizado com a visita à Igreja São Miguel, de aproximadamente 200 anos, que hoje se encontra em ruínas, mas ainda representa um símbolo na religiosidade das comunidades Potiguara.

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